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A Expansão Portuguesa

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Mensagem por Lusitano89 19th março 2011, 01:19

Com este tópico pretendo dar a conhecer com mais profundidade os feitos, as politicas e os contributos da nossa Nação para delinear e completar o Mapa do Mundo, durante este processo por vezes repentino e por vezes calmo iniciamos o processo hoje em dia muito em voga que chamamos de Globalização, com todos os seus aspectos positivos e negativos ...


Antecedentes


Com a Reconquista concluída, D.Dinis interessou-se pelo comércio externo, organizando a exportação para países europeus. Em 10 de Maio de 1293, instituiu um fundo de seguro marítimo para os comerciantes portugueses que viviam no Condado da Flandres, que pagavam determinadas quantias em função da tonelagem, que revertiam em seu benefício se necessário. Vinho e frutos secos do Algarve eram vendidos na Flandres e na Inglaterra, sal das regiões de Lisboa, Setúbal e Aveiro eram exportações rentáveis para o Norte da Europa, além de couro e Kermes, um corante escarlate. Os portugueses importavam armaduras e munições, roupas finas e diversos produtos fabricados da Flandres e da Itália.

Em 1317 D. Dinis fez um acordo com o navegador e mercador genovês Manuel Pessanha (Emanuele Pessagno), nomeando-o primeiro almirante da frota real com privilégios comerciais com seu país, em troca de vinte navios e suas tripulações, com o objetivo de defender as costas do país contra ataques de pirataria (muçulmana), lançando as bases da Marinha Portuguesa e para o estabelecimento de uma comunidade mercante genovesa em Portugal. Obrigados a reduzir suas atividades no Mar Negro, os mercadores da República de Génova tinham-se voltado para o comércio norte Africano de trigo, azeite (também fonte de energia) e ouro - navegando até aos portos de Bruges (Flandres) e Inglaterra. Genoveses e florentinos estabeleceram-se então em Portugal, que lucrou com a iniciativa e experiência financeira destes rivais da República de Veneza.

O Infante D. Henrique, o Navegador, personifica a gesta dos descobrimentos. Na segunda metade do século XIV, surtos de peste bubónica levaram a um grave despovoamento: a economia era extremamente localizada em poucas cidades e a migração do campo levou ao abandono da agricultura e ao aumento do desemprego nas povoações. Só o mar oferecia alternativas, com a maioria da população fixada nas zonas costeiras de pesca e comércio.

Entre 1325 e 1357 D. Afonso IV de Portugal concedeu o financiamento público para levantar uma frota comercial e ordenou as primeiras explorações marítimas, com apoio de genoveses, sob o comando de Manuel Pessanha. Em 1341 as ilhas Canárias, já conhecidas dos genoveses, foram oficialmente descobertas sob o patrocínio do rei Português. A sua exploração foi concedida em 1338 a mercadores estrangeiros, mas em 1344 Castela disputou-as, concedendo-as ao castelhano D. Luís de la Cerda. No ano seguinte, Afonso IV enviou uma carta ao Papa Clemente VI referindo-se às viagens do portugueses às Canárias e protestando contra essa concessão. Nas reivindicações de posse, sucessivamente renovadas pelos dois povos, prevaleceu, no final, a vontade do rei de Castela sobre estas ilhas.

Em 1353 é assinado um tratado comercial com a Inglaterra para que os pescadores portugueses pudessem pescar nas costas inglesas, abrindo assim caminho para o futuro Tratado de Windsor em 1386. Em 1370 é criada a Bolsa de Seguros Marítimos e em 1387 há notícia do estabelecimento de mercadores do Algarve em Bruges. Em 1395, D. João I emite uma lei para regular o comércio dos mercadores estrangeiros.

Há unanimidade dos historiadores em considerar a conquista de Ceuta como o início da expansão portuguesa, tipicamente referida como os Descobrimentos. Foi uma praça conquistada com relativa facilidade, por uma expedição organizada por D. João I, em 1415. A aventura ultramarina ganharia grande impulso através da acção do Infante D. Henrique reconhecido internacionalmente como o seu grande impulsionador.

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Mensagem por Lusitano89 19th março 2011, 01:25

O Inicio de uma nova Era

A Expansão Portuguesa Ceuta

O primeiro grande marco que assinala o início da expansão portuguesa teve lugar em Marrocos. Trata-se, como é bem sabido, da conquista de Ceuta, que ocorreu em 1415. No entanto, o interesse português, ou europeu na generalidade, pelo Norte de África é bem anterior. É preciso compreender que, na mentalidade europeia do século XV, se considerava Marrocos como o prolongamento natural da Península Ibérica, estando ambas as regiões ligadas por antigas e fortes raízes geográficas, culturais e económicas. No entanto, havia uma separação, uma inimizade radical: a Europa era cristã, e Marrocos muçulmano. Mas aqui sabia-se que o Norte de África havia, muito tempo atrás, sido cristão. No século XV, já não restava território muçulmano em Portugal; a chamada “Reconquista” havia terminado há mais de cem anos, mas entendia-se que o esforço de recuperar o antigo território para a Cristandade bem podia estender-se para lá do Estreito de Gibraltar. Havia ainda um reino muçulmano na Península, o reino de Granada, mas os castelhanos não aceitariam uma interferência portuguesa no que consideravam ser território seu a conquistar a curto prazo. Só o fariam, no entanto, em 1492.

Em Portugal haviam assim uma predisposição latente para continuar o avanço para Sul. O momento para tal só surgiu, porém, em 1415. Quais os motivos que levaram os portugueses a tal acto, e porquê só nesta data? As razões são múltiplas. Em primeiro lugar, Portugal havia saído de uma longa guerra com Castela, onde assegurou a sua independência, com uma nova dinastia, a do Mestre de Avis, agora D. João I, e uma nova classe dirigente e aguerrida. Após a assinatura da paz com os castelhanos, em 1411, sentia-se a necessidade de agir no sentido de valorizar Portugal aos olhos de toda a Cristandade, e igualmente impôr algum respeito aos nossos vizinhos. Para tal, nada melhor do que tomar uma cidade muçulmana, o que era, aliás, abençoado pelo Papa e celebrado por toda a Europa. Uma vez que Castela vedava o acesso a Granada, Marrocos era a melhor escolha.

Por esta altura, havia uma concordância quase total em conquistar Ceuta, desde ao rei aos infantes, da nobreza á burguesia de Lisboa. Sendo Ceuta uma rica cidade, onde afluíam diversas mercadorias de todo o Mundo Muçulmano, era uma boa oportunidade para obter uma rica presa e tentar lucrar futuramente com tal conquista. Aliás, o domínio da cidade seria uma posição estratégica importante no Estreito de Gibraltar, que dominava a entrada do Mediterrâneo, permitindo combater a pirataria moura na região e abrir o acesso a uma região rica em recursos, desde as pescas ao comércio do ouro, do açúcar e dos cereais do Sul de Marrocos.

Após a conquista da cidade, os portugueses cedo se aperceberam que uma coisa era tomar Ceuta, outra bem mais difícil era mantê-la em mãos portuguesas. A cidade passou a estar periodicamente cercada, obrigando ao envio permanente de tropas e mantimentos. Esta inesperada resistência e hostilidade aos portugueses impedia o que se julgava bem mais fácil, isto é, o prosseguimento da conquista de Marrocos que muitos advogavam. Assim, uma boa parte da classe dirigente portuguesa passou a preferir um outro vector de expansão, mais pacífico e menos dispendioso: o das viagens de descobrimento da costa e de comércio pacífico, assim como o da colonização da Madeira e dos Açores, entretanto descobertos. Esta via de expansão teve um importante defensor na pessoa do Infante D. Pedro, sobretudo após o fracasso da segunda tentativa de avanço em Marrocos, o malogrado ataque a Tânger, onde ficou refém o seu irmão D. Fernando. No entanto, é preciso entender que, aos olhos da mentalidade da época, as viagens de descobrimento e de comércio pacífico na costa africana não tinham o prestígio e o valor das conquistas guerreiras e da guerra aos muçulmanos, e os portugueses, a começar pelo Infante D. Henrique, para aqui se voltaram apenas porque o prosseguimento da conquista marroquina surgia como inviável.

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Mensagem por Lusitano89 19th março 2011, 01:33

O Infante D. Henrique e a Exploração do Litoral Africano


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O início do processo dos Descobrimentos Portugueses ficou a dever-se, como é sobejamente conhecido, á acção verdadeiramente ímpar de um homem: o Infante D. Henrique. De facto, foi sob as suas ordens e o seu impulso que se iniciaram as primeiras viagens de exploração da costa africana, no caminho que mais tarde levaria os portugueses á Índia e ao Brasil. Mas convém não esquecer os homens que, agindo sob as suas ordens, as souberam levar a bom termo. Por outro lado, parece certo que o avanço do descobrimento da costa de África não obedeceu a um plano pré-estabelecido pelo Infante, mas antes resultou de uma série de factores, como as condições políticas do Reino, os proveitos obtidos pelas viagens, o insucesso da política militar marroquina, a resolução gradual dos problemas de navegação que surgiam passo a passo e, evidentemente, a teimosia do Infante em prosseguir mais além. É certo que os seus objectivos no início das viagens não são os mesmos á data da sua morte, quando os portugueses já chegaram a zonas longínquas de África, os conhecimentos náuticos adquiridos são já importantes, os proveitos económicos das viagens já visíveis.

O sucesso da conquista de Ceuta, em 1415, abriu portas á presença portuguesa além-fronteiras. É o Infante D. Henrique que toma a seu cargo a empresa africana, de prosseguimento da conquista de Marrocos, facilitada, pensava-se, pelo controlo do estreito de Gibraltar permitido pela conquista de Ceuta. Em 1419, data provável, os seus homens chegam á ilha da Madeira, alguns anos depois tentam, pela primeira vez e sem efeito, a conquista das Canárias, e chegam aos Açores talvez ainda na década de 1420.

A partir de 1422, o Infante pressiona os seus homens a passar o Cabo Bojador com o objectivo provável de contornar Marrocos pelo Sul. De qualquer modo, os objectivos de conquista do Norte de África sobrepõem-se ainda a quaisquer outros. Conta o cronista Gomes Eanes de Zurara como durante vários anos tentaram os homens do Infante passar o dito Cabo, sem sucesso. São bem conhecidos os motivos que o Infante teria para tal feito, segundo o cronista: vontade de conhecer a amplitude do poderio muçulmano, procura de aliados cristãos para uma aliança, motivações económicas, simples curiosidade. Finalmente, em 1433, enviou um seu escudeiro, Gil Eanes, numa barca, a fazer uma vez mais a tentativa. Mas devido ao temor existente de tal empreendimento, o mesmo regressou sem o conseguir. E Zurara continua:

“Mas logo no ano seguinte o Infante fez armar outra vez a dita barca. E chamando Gil Eanes de parte, o encarregou muito que, todavia, se trabalhasse de passar aquele cabo. (…) O Infante era homem de mui grande autoridade, pela qual suas admoestações, por brandas que fossem, eram para os sisudos de muito grande encargo, como se mostrou por este, que depois destas palavras determinou, em sua vontade, de não tornar ante a presença de seu senhor sem certo recado de aquilo por que o enviava. Como de facto fez, pois, aquela viagem, menosprezando todo perigo, dobrou o cabo [para] além, onde achou as coisas muito pelo contrário do que ele e os outros até ali presumiram.”

Em 1435 parte novamente na expedição de Afonso Gonçalves Baldaia, avançando cerca de 50 léguas para além do Bojador mas sem outro resultado. A suspensão das viagens de exploração, no ano seguinte, deveu-se a duas causas distintas: em primeiro lugar, ao esforço de guerra em preparação para a conquista de Tânger, que era na época muito mais importante do que as viagens de descobrimento; depois, um problema náutico: os navios utilizados até então, barcas ou barinéis, de pano redondo, só conseguiam navegar com ventos favoráveis. Mas a sul do Cabo Branco os portugueses deparam com ventos permanentes de nordeste, e com correntes marítimas desfavoráveis, o que tornava muito difícil, senão impossível, o regresso ao reino.

Só alguns anos mais tarde a situação seria desbloqueada: A regência de D. Pedro incentivava os descobrimentos em desfavor das expedições militares em Marrocos, e o surgimento de um novo tipo de navio, a caravela, que tinha capacidade de navegar com ventos desfavoráveis, permitiu um rápido avanço para Sul. De facto, devido á aridez da costa saariana, os portugueses, resolvido que estava o grande problema náutico que era o regresso ao reino, passam a aventurar-se cada vez para mais longe.

Em 1441, Antão Gonçalves contacta com os primeiros azenegues e regressa com alguns produtos, mas é a expedição de Nuno Tristão, em 1443, a mais importante: chega a Arguim, onde os portugueses criarão uma feitoria, e traz os primeiros escravos. Pela primeira vez, os descobrimentos criam possibilidades de real rentabilidade económica, e o Infante D. Henrique recebe os primeiro dividendos: no mesmo ano, o regente entrega-lhe os quintos das presas e dos resgates, ou seja, um quinto de tudo o que fosse capturado ou traficado cabia-lhe de pleno direito. No ano seguinte executa-se a primeira grande expedição comercial: Antão Gonçalves, Diogo Afonso e Gomes Pires estabelecem as bases do comércio pacífico na região do Rio do Ouro. Resgatam uma grande quantidade de escravos, que serão vendidos em Lagos. São estabelecidos os primeiros contactos com os reis da região, de forma a permitir a continuidade do comércio.

No entanto, o fim da regência de D. Pedro, após a batalha de Alfarrobeira, em 1449, provoca novo abrandamento das viagens de descobrimento. O rei D. Afonso V ressuscita as expedições militares a Marrocos como prioridade da Coroa, com a conquista de Alcácer-Ceguer e Arzila. Por outro lado, os lucros do comércio atenuam a necessidade de avanço para sul, e novos problemas náuticos surgem. Surge também hostilidade por parte de algumas populações, como as dos Rios da Guiné, onde é morto Nuno Tristão. Zurara descreve assim o episódio:

“(…)Começando assim de seguir pelo rio avante, a maré crescia; com a qual foram assim entrando, seguindo contra umas casas que viam á mão direita. E sucedeu que, antes de saírem em terra, saíram da outra parte 12 barcos, nos quais estariam uns 70 ou 80 guinéus, todos negros, e com arcos nas mãos. E porque a água crescia, passou-se a além um barco dos guinéus, e pôs os que levava em terra, de onde começaram a assetar aos que iam nos batéis. (…) Ali foi morto aquele nobre cavaleiro Nuno Tristão, muito desejoso desta vida, porque não houvera lugar de comprar sua morte como valente homem (…)”.

No entanto, o ritmo de exploração abranda mas não cessa. O desenvolvimento do comércio atinge uma nova fase com o estabelecimento permanente em Arguim, enquanto se atinge um triunfo diplomático importante: a bula papal “Romanus Pontifex”, em 1455, que atribui a Portugal o exclusivo do comércio africano.

Em 1460, á data da morte do Infante D. Henrique, os portugueses haviam já atingido a Serra Leoa, no Golfo da Guiné. Os Descobrimentos, embora ainda sejam um empreendimento secundário, constituem já um vector importante na política nacional. De facto, só com D. João II os Descobrimentos se tornarão uma verdadeira empresa de Estado, com um objectivo bem definido: a Índia. Mas sem o impulso decisivo do Infante D. Henrique, cuja personalidade excepcional permitiu vencer os obstáculos existentes e prosseguir uma empresa aparentemente ingrata, o papel primordial de Portugal no processo do Descobrimento do Mundo teria sido certamente bem diferente.

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Mensagem por Lusitano89 19th março 2011, 16:52

A Acção Missionária do Infante D. Henrique

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Quando se fala dos Descobrimentos Portugueses do século XV, nomeadamente a sua fase inicial a que esteve associado o Infante D. Henrique, apontam-se diversas motivações que teriam estado na origem do arranque das viagens e da Expansão Portuguesa em geral. Uma merece a nossa atenção no programa de hoje: a motivação religiosa. Na verdade, é para nós hoje um pouco difícil compreender a mentalidade dos homens do século XV. Vivendo num mundo em que o dinheiro e os valores materiais e económicos são dominantes, sentimos por vezes dificuldades em entender as motivações dos homens daquela época. Porém, é certo que os Descobrimentos estão associados numa primeira fase ás campanhas militares de conquista de Marrocos, e estas tinham como uma das principais motivações o espírito de cruzada, ou seja, a guerra santa aos muçulmanos. Assim, nesta primeira fase, iniciada com a conquista de Ceuta em 1415, o projecto de conquista de Marrocos aos infiéis desempenhava o papel mais importante. Considerava-se na época que guerrear os muçulmanos era, mais do que um meio de obter glória militar ou proveitos materiais, a obrigação fundamental de todo o guerreiro cristão, contribuir para o alargamento da Cristandade e, assim, a forma mais nobre de servir a Deus; é o que se designa na época por Serviço de Deus.

O Infante D. Henrique sentia de um modo profundo esta motivação. Imbuído de um íntimo apelo religioso, encarava como fundamental este serviço. Assim se entende que tenha sido o principal promotor da tentativa de conquista de Tânger e da continuação da conquista marroquina. Porém, o avanço português em Marrocos deparava com enormes dificuldades, pelo que outro projecto germinava gradualmente na mente de D. Henrique, e que foi um dos motores dos Descobrimentos: explorar as costas do continente africano, avançando para Sul e procurando contornar deste modo as potências muçulmanas do Norte de África em busca de aliados cristãos que, segundo algumas informações, existiriam a Oriente. Estava neste caso o lendário reino cristão do Preste João, que era na realidade a Etiópia, e que poderia ser um valioso aliado contra os mouros. A isto juntava uma vontade profunda e genuína de alargar a Cristandade e de expandir a Fé Cristã. Estas duas motivações, entre outras, foram expressas pelo cronista Gomes Eanes de Zurara. Sobre as cinco razões que levaram o Infante a promover os Descobrimentos, diz:

“A quarta razão foi porque, de 31 anos que guerreava os Mouros (…), queria saber se se achariam naquelas partes alguns príncipes cristãos em que a caridade e amor de Cristo fosse tão esforçada que o quisessem ajudar contra aqueles inimigos da Fé.

A quinta razão foi o grande desejo que havia de acrescentar a santa fé de Nosso Senhor Jesus Cristo e trazer a ela todas as almas que se quisessem salvar (…)”

É evidente que a motivação religiosa não era a única; curiosidade de conhecer as terras que ficavam a sul do Cabo Bojador, assim como interesse em obter lucros com o comércio com essas terras era motivos igualmente válidos. Mas na época não havia contradição entre o interesse material e o serviço de Deus. A empresa dos Descobrimentos podia perfeitamente servir ambos, como veio de facto a acontecer. Na verdade, á medida que se exploravam as costas de África e que se aperfeiçoavam os conhecimentos técnicos de navegação, foram-se desenvolvendo os contactos com as populações locais, e o comércio começou a dar proveitos consideráveis. Comércio e Fé andavam assim a par, sem nenhuma contradição, como se pode constatar em diversos episódios.

Em 1441 Antão Gonçalves traz, no regresso a Portugal, três homens cativos que capturou na costa africana. Com estas acções pretendia-se obter informações sobre a região em causa e, através da cristianização destes homens, cumprir igualmente o objectivo missionário. Mas um deles era um homem de uma família real na sua terra, e portanto diz que os seus dariam vários escravos, pelo menos 10, em troca da sua liberdade. O Infante concorda, e devolve-o á sua terra. Diz o cronista que assim se salvavam dez almas, em vez de três. Aqui se vê como o objectivo económico (neste caso a obtenção de escravos) aliava-se á motivação puramente religiosa, sem que nenhuma contradição fosse achada nisso. Quando os portugueses atingem a costa a sul do Sara, o interesse missionário aumenta subitamente. Constatam que as populações já não são muçulmanas, portanto já não inimigas, e que poderiam mais facilmente ser convertidas ao Cristianismo. O factor religioso mantém, assim, a sua validade.

A captura de escravos, se hoje fere a nossa sensibilidade actual, era na época vista sob outro prisma. Na verdade, considerava-se que a cristianização compensava largamente o infortúnio da captura e da redução á escravatura. Assim, a 8 de Agosto de 1445 realizava-se em Lagos a primeira venda de escravos africanos. O cronista Zurara, porém, não deixa de ser sensível á tristeza destes homens arrancados á sua terra, sobretudo á separação de famílias, descrevendo o panorama do seguinte modo:

“(…) uns tinham as caras baixas e os rostos lavados com lágrimas, olhando uns contra os outros; outros estavam gemendo mui dolorosamente, esguardando a altura dos céus (…) outros feriam seu rosto com suas palmas, lançando-se estendidos em meio do chão; outros faziam suas lamentações em maneira de canto, segundo o costume de sua terra (…)”.

No entanto, tudo isto era largamente compensado, pensava-se na época, pela possibilidade de se baptizar e cristianizar esta gente, com que o Infante se congratulava:

“O Infante era ali, em cima de um poderoso cavalo (…); toda a sua principal riqueza estava em sua vontade, considerando com grande prazer na salvação daquelas almas que antes estavam perdidas. E certamente que seu pensamento não era vão, pois logo que tinham conhecimento da língua, com pequeno movimento se tornavam cristãos.”

Os Descobrimentos do século XV têm, deste modo, uma forte motivação religiosa que convém não esquecer. É preciso ainda relembrar que o Infante D. Henrique era também o administrador da Ordem de Cristo, sob cuja égide se faziam as viagens, se explorava o litoral africano, se colonizava a Madeira e os Açores. Em 1460, á data da sua morte, os portugueses haviam já avançado até á Serra Leoa. Os Descobrimentos prosseguiriam a bom ritmo, primeiro sob o arrendamento a particulares e mais tarde sob a orientação firme do rei D. João II. Mas a motivação religiosa nunca esmoreceu; pelo contrário, ampliou-se consideravelmente, primeiro em África e depois no Brasil e no Oriente. Os interesses materiais e os espirituais continuaram a pesar igualmente na epopeia dos Descobrimentos. Basta lembrar a célebre resposta de um marinheiro português da armada de Vasco da Gama, quando interrogado na Índia sobre os objectivos dos portugueses: “vimos em busca de cristãos e especiaria”.

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Mensagem por Lusitano89 19th março 2011, 21:35

A Política Castelhana de D. AFonso V e o Tratado de Alcáçovas


Os Descobrimentos Portugueses, iniciados nas primeiras décadas do século XV pelo Infante D. Henrique, não deixaram de suscitar cobiça por parte de outros reinos peninsulares, sobretudo a partir do momento em que a exploração da costa africana começou a dar grandes lucros. Assim, o ritmo do avanço dos portugueses para Sul está ligado ao relacionamento com os países vizinhos, sobretudo Castela, e ao modo como conseguiram os monarcas portugueses salvaguardar para si a exclusividade da navegação e comércio no Atlântico. Um período particularmente difícil neste processo, em que a interferência de D. Afonso V nos assuntos internos do reino de Castela colocou em perigo a primazia portuguesa nos Descobrimentos.

É bem conhecida a inclinação do rei D. Afonso V para a expansão em Marrocos e o seu desinteresse pelos problemas do descobrimento e avanço na costa africana. Desde 1460, data da morte do Infante D. Henrique, que as viagens de exploração estavam arrendadas a particulares, uma vez que não havia interesse visível do rei em chamar a si a condução das viagens. Por outro lado, esta nova fase dos Descobrimentos é marcada pelo comércio cada vez mais rendoso que os portugueses conseguiam obter nas costas africanas, uma vez que se havia já alcançado regiões onde o rico tráfico do ouro era possível. Finalmente, resta lembrar que em 1474 entrara em cena uma nova personagem, o príncipe D. João, futuro D. João II, que desde logo se interessa por este processo, vindo gradualmente a acompanhar e conduzir a empresa africana. Nesta época, Portugal havia conseguido obter do Papa importantes garantias do seu direito á exclusividade de navegação e comércio naquelas paragens, medida indispensável para tentar afastar a cobiça castelhana. No entanto, entre 1475 e 1479 o rei português promove uma política intervencionista nos assuntos internos de Castela, o que provocou a guerra aberta entre os dois países e constituíu um excelente pretexto para os reis espanhóis promoverem a navegação nas costas africanas, entrando em concorrência directa com Portugal e não respeitando a exclusividade portuguesa naquelas regiões.

Este incidente foi provocado pela morte, em Dezembro de 1474, do rei de Castela Henrique IV. A corte Castelhana estava dividida em duas facções: os que apoiavam a irmã do rei, Isabel, casada com o rei de Aragão, e os apoiantes da princesa D. Joana, sobrinha de D. Afonso V. Esta detinha a teoricamente a legitimidade, como filha do falecido rei, mas na prática a sua pretensão ao trono era posta em causa por vários sectores da corte castelhana, tanto mais que se murmurava nos bastidores que ela não era filha do rei, mas de um nobre castelhano pelo qual a rainha se havia apaixonado no passado. Ficou, aliás, para a História com o nome de Joana, a Beltraneja, cognome retirado do tal nobre castelhano, chamado Beltrán de la Cueva.

De qualquer modo, o rei português D. Afonso V empreende imediatamente uma arriscada política de intervenção em Castela, ao promover o seu casamento com a sua sobrinha e coroar-se rei de Castela e Leão, recolhendo apoio de parte da nobreza espanhola. Abriu-se, assim, um período de guerra entre os dois países, pois os reis Católicos, Isabel de Castela e Fernando de Aragão, imediatamente reagiram a esta pretensão do rei português, atacando várias praças fronteiriças portuguesas e enviando várias esquadras para as costas da Guiné.

Portugal estava, deste modo, de novo em guerra com Castela, arriscando-se agora a perder os seus direitos adquiridos no que toca á exploração do Atlântico e das costas da Guiné, o que a longo prazo poria em risco o futuro do processo dos Descobrimentos. O país arruinava-se devido ás despesas militares decorrentes da guerra. No plano militar, a situação não era melhor. A batalha do Toro, ocorrida a 2 de Março de 1476, anunciara o arrastar das hostilidades por tempo indeterminado. Porém, o cansaço provocado pela guerra, assim como os riscos que o seu arrastamento poderiam provocar para a soberania nacional, cedo obrigaram a uma rápida solução. O próprio príncipe D. João, certamente mais interessado em dedicar-se ás viagens de Descobrimento do que a dar cobertura á ambição política de seu pai, manifestara-se contra o prosseguimento da guerra. As Cortes do Reino, reunidas em Montemor-o-Novo e depois em Santarém no ano seguinte, demonstraram as dificuldades financeiras em prosseguir o conflito e assinalaram o descontentamento popular face á situação do país na época. Cresceram assim as pressões para que o problema fosse resolvido pela via diplomática. Foram então iniciadas as conversações para a obtenção da paz. As negociações foram longas e difíceis, devido á complexidade e gavidade dos problemas a resolver. Os Reis Católicos, embora numa posição mais favorável, acusaram igualmente um grande desgaste interno e uma igual vontade em resolver o conflito. A paz viria então a ocorrer algum tempo depois, em 1479, com a assinatura do Tratado das Alcáçovas, que resolveu de uma vez por todas os diversos conflitos que opunham Portugal a Castela.

O Tratado de Alcáçovas garantiu a Portugal a salvaguarda dos seus direitos sobre a navegação e comércio das costas africanas, permitindo assegurar a cantinuidade dos Descobrimentos e afastar de vez a interferência castelhana na região. Ficou estipulado que todo o espaço a sul do paralelo das Canárias e do Cabo Bojador, assim como todas as terras descobertas e a descobrir, incluindo os arquipélagos atlânticos, ficariam sob jurisdição portuguesa, obtendo ainda o direito á conquista do reino marroquino de Fez. Em troca, o rei de Portugal foi obrigado a desistir de todas as pretensões sobre o trono de Castela, assim como a sua sobrinha D. Joana. Do mesmo modo, foi obrigado a reconhecer a soberania castelhana sobre as Canárias, que desde há muito eram um foco de tensão entre os dois estados, e reconhecer a Castela o direito de conquista de Granada. Estamos, assim, perante o primeiro Tratado de partilha do Mundo, que garantia a Portugal, sob a direcção do príncipe D. João, o caminho livre para prosseguir o descobrimento da costa africana a caminho da Índia e do Oriente. Foi sob os seus auspícios que se avançou rapidamente para Sul e se contornou o Cabo da Boa Esperança, até que a viagem de Cristóvão Colombo, em 1492, ao serviço dos reis espanhóis, veio a provocar novo conflito diplomático e a assinatura de um novo Tratado, em Tordesilhas

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Mensagem por Lusitano89 20th março 2011, 14:02

A Política Africana de D. João II


D.João II foi, certamente, um dos mais importantes monarcas da História de Portugal, quer pela política de centralização do poder que executou no reino, quer sobretudo pela acção decisiva que desempenhou no processo dos Descobrimentos, salvaguardando a empresa iniciada nos primeira décadas do século XV pelo Infante Henrique e imprimindo-lhe um novo fôlego e um novo vigor. Os resultados são de todos bem conhecidos: salvaguarda do Atlântico, vantagem sobre os principais rivais de Portugal neste processo, descobrimento do Cabo da Boa Esperança e abertura do caminho marítimo para a Índia, que viria a ser inaugurado já pelo rei seguinte, D. Manuel I. Vamos hoje relembrar uma faceta importante da política ultramarina de D. João II, por vezes um pouco esquecida em vista dos grandes sucessos do seu reinado, como o Tratado de Tordesilhas ou a viagem de Bartolomeu Dias, mas igualmente importante na época: os contactos e a política de alianças com os reinos africanos.

Os contactos com as civilizações africanas a sul do Saará despertaram desde muito cedo o interesse dos navegadores portugueses; as diferenças de clima, de fauna e da flora, mas também os contrastes culturais entre os diversos reinos africanos e os padrões europeus foram um motivo de curiosidade e interesse permanente. Desde o momento em que se estabeleceram os contactos e o comércio pacífico e foram proibidas as presas, ou seja, a tomada de bens ou pessoas pela força, o que aconteceu na década de 1440, estavam reunidas as condições para o aprofundamento das relações entre Portugal e diversos reinos africanos, sobretudo os que revelavam maior interesse em promover o comércio com os portugueses e em se converter ao Cristianismo.

No reinado de D. João II, este vector sofreu um notável incremento. O monarca desenvolve uma política coerente de aproximação e de promoção de alianças com diversos reinos africanos, o que se revelava essencial para o seu plano de expansão ultramarina, sob diversos pontos de vista: permitia uma melhor exploração económica, com o estabelecimento de acordos de comércio vantajosos para ambas as partes; fortalecia a presença portuguesa face a uma eventual concorrência castelhana na região da Guiné; facilitava a transmissão de conhecimentos sobre vários objectivos a atingir, nomeadamente a existência de reinos cristãos a Oriente e a passagem para o Oceano Índico, que se procurava a todo o momento alcançar.

A política levada a cabo por D. João II obteve bons resultados junto de diversos reinos africanos. O primeiro foi o dos Jalofos, na região do Senegal, que os portugueses haviam entrado em contacto já há várias décadas. Tal aproximação culminou com a conversão do rei africano, em 1488, data em que se fez baptizar em Lisboa com o nome de D. João Bemoim, após ter sido recebido com todas as honrarias por D. João II, como assinala o cronista Rui de Pina:

Chegou Bemoim a Lisboa, e com ele alguns negros de seu sangue real (..). Como el-rei foi de sua vinda avisado, mandou que se viessem aposentar a Palmela, onde mandou logo prover aos seus mui abastadamente, e servir a ele com prata, e oficiais, e todos os outros cumprimentos que têm semelhança de Estado. E a todos mandou dar de vestir de panos finos e ricos, e como a qualidade e merecimento das pessoas o requeria. (…) E aos 3 dias do mês de Novembro o dito Bemoim, e seis dos príncipes que com ele vieram, foram feitos cristãos ás duas horas da noite, na câmara da rainha (…); foram seus padrinhos el-rei, a rainha, o príncipe e o duque, e um comissário do Papa que na Corte andava, e o bispo de Tânger.”

Também na região da Mina, onde D. João II mandou erguer um fortaleza em 1482, tentaram os portugueses obter alianças políticas e fomentar a evangelização, embora com resultados menos satisfatórios. Um pouco mais a Sul, na região do Benim, os contactos foram pelo contrário mais profundos. A importância deste poderoso reino do interior era tal que D. João II ali enviou por duas vezes (em 1486 e 1487) uma embaixada chefiada por João Afonso de Aveiro. Tinha como objectivos a fundação de uma feitoria, a promoção da amizade com Portugal e a preparação para uma futura evangelização naquela região, no que foi bem-sucedido. No entanto, a melhor recepção aos marinheiros portugueses estava reservada para uma outra região, completamente isolada até então da civilização europeia: o reino do Congo.

O Congo foi contactado pela primeira vez por Diogo Cão, que ali foi muito bem recebido logo na sua primeira viagem. Posteriormente, constatando a boa-vontade local, este mesmo capitão transportou para Lisboa uma embaixada deste reino de africano, que presenteou D. João II com peças de marfim e panos de palma. O rei respondeu com o envio de uma embaixada portuguesa em 1491 (chefiada por Rui de Sousa), após uma fase de intensos contactos onde se destacava a excelente predisposição local a receber a presença portuguesa, promover o comércio e até mesmo a aceitar a missionação cristã. A embaixada foi recebida em triunfo na capital do Congo, ao que se seguiu o baptismo do rei e das principais figuras da sua corte.

Desta forma, D. João II conseguia obter um conjunto de alianças políticas que lhe permitiam fomentar a presença portuguesa junto de uma série de poderosos reinos africanos cristianizados ou em vias de o ser. No seio do projecto global acalentado pelo monarca, tal perspectiva estava articulada com a procura do mítico reino cristão do Prestes João e com o descobrimento do caminho marítimo para a Índia. D. Manuel viria a dar continuidade a este plano, incrementando a política de alianças e de evangelização de diversos reinos de África, que só viria a abrandar a atenuar-se mais tarde, já com D. João III.

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Mensagem por Lusitano89 20th março 2011, 23:30

Diogo de Azambuja e a construção da Fortaleza de S. Jorge da Mina


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É bem conhecida de todos a importância da figura do rei D. João II, o Príncipe Perfeito, no processo dos Descobrimentos. É, de facto, durante o seu reinado que se consolida a Expansão Portuguesa e se assegura a descoberta da passagem marítima para o Oceano Índico, abrindo caminho á instalação dos portugueses no Oriente. Os Descobrimentos recebem, assim, um impulso decisivo para o seu bom sucesso, definindo este rei uma série de objectivos claros a atingir. Embora a grande etapa fosse a descoberta do caminho marítimo para a Índia, D. João II pretendia também assegurar a presença portuguesa em África, garantindo a segurança das rotas marítimas e promovendo a exploração económica, nomeadamente através do comércio. Neste sentido, uma das acções mais importantes desencadeadas no seu reinado é precisamente a construção de uma fortaleza na costa africana, que se viria a chamar São Jorge da Mina.

Quando D. João II sobe ao trono, em 1481, os portugueses tinham já uma longa experiência acumulada de navegação, exploração e contacto com África. D. João II, como é sabido, tinha um projecto de centralização do seu poder, através da contenção dos privilégios da grande nobreza, que aplicou nas Cortes em que foi jurado rei, em Évora. Do mesmo modo, possuía igualmente um projecto bem definido de expansão ultramarina, assente na exploração da costa africana e na descoberta da passagem para Oriente contornando o continente africano. O monarca decide avançar imediatamente com um plano global de descobrimento da costa, que levaria pouco deposi á viagem de Bartolomeu Dias e ao descobrimento da passagem para o Índico. Para já, duas medidas foram imediatamente tomadas: a primeira foi a de prosseguir o reconhecimento da costa, e para tal foi enviado Diogo Cão, que chegaria ao reino do Congo. A segunda foi a de construir, na chamada Costa do Ouro, uma fortaleza que servisse de entreposto do tráfico daquele metal, de ponto de apoio à nevegação portuguesa e de sinal inequívoco, dirigido sobretudo aos castelhanos, da exclusividade de navegação portuguesa nas águas da Guiné.

Assim, o rei prepara em 1481 uma expedição composta por nove caravelas e duas grandes naus. Levava esta armada cerca de 600 soldados e 100 pedreiros e carpinteiros, e carregava a pedra necessária para a construção da fortaleza. Após alguma hesitação, D. João II acaba por entregar o comando desta expedição a um Diogo de Azambuja, homem já dos seus cinquenta anos. Quem era esta personagem, a quem o rei confiou o sucesso de tão importante missão?

Diogo de Azambuja, não sendo propriamente um navegador, era no entanto um homem inteligente e hábil, um excelente militar e estratega, da confiança, evidentemente, do rei, e capaz de erguer no espaço de tempo mais curto possível uma fortaleza numa região ainda em grande parte desconhecida. Era cavaleiro da Casa de el-rei, tendo prestado serviço em Alcácer-Ceguer e em Aragão. Participou nas guerras com Castela, recebendo em 1480 o privilégio de fidalgo. Vemos, assim, que D. João II entrega a responsabilidade da construção da fortaleza não a um navegador, mas a um militar experiente, capaz de conduzir tal tarefa arriscada e difícil. A armada parte em Dezembro de 1481, rumando para Sul. A expedição segue até ao Golfo da Guiné, na Costa mais tarde designada Da Mina, procedendo Diogo de Azambuja ao reconhecimento da costa, de forma a encontrar o local mais favorável para a construção da fortaleza. Escolhe uma baía para desembarcar, o que faz a 19 de Janeiro de 1482, e de imediato se iniciam os trabalhos de construção. Ao cabo de 20 dias, já estava a fortaleza bem encaminhada, concluindo-se a sua construção pouco depois. Á data encontrava-se no local um navio português, que procedia ao comércio com as populações locais, mas o seu bom senso, o tacto de Diogo de Azambuja e, sobretudo, a boa recepção do rei local permitiram evitar conflitos e foram o factor decisivo para o êxito da missão.

Acabada a fortaleza, estabelecidos os contactos amigáveis com as populações locais e accionadas as trocas comerciais, Diogo de Azambuja considerou terminada a tarefa, pelo que mandou regressar a armada a Lisboa com notícia do sucesso da missão, ficando ele próprio como capitão da fortaleza com sessenta soldados. Exerceu o cargo até 1484, data em que regressou a Lisboa. A fortaleza ficou conhecida como S. Jorge da Mina, devido á devoção que o rei tinha a este santo. Assim ficou assegurada a presença portuguesa na região, sendo a fortaleza a sede de um rico tráfico de ouro, que se manteve durante algumas décadas. Eis o que disse a esse respeito um dos homens de D. João II, Duarte Pacheco Pereira:

Temos sabido que em toda a Etiópia de Guiné, depois de ser dada Criação ao Mundo, este foi o primeiro edifício que se naquela região fez, na qual casa nosso senhor acrescentou tão grandemente o comércio, que em cada um ano se tira dali por resgate, que vêm para estes reinos de Portugal, 170 mil dobras de bom ouro fino, e muito mais em alguns anos se resgatam e compram aos negros que de longas terras este ouro ali trazem, os quais são mercadores de diversas nações (…); e estes levam desta casa muitas mercadorias, assim como lambéis, que é a principal delas (…), e pano vermelho e azul, e manilhas de latão, e lenços e corais, e umas conchas vermelhas que entre eles são muito estimadas, assim como nós cá estimamos as pedras preciosas. Isso mesmo vale aqui muito o vinho branco e umas contas azuis, a que eles chamam ‘coris’, e outras muitas coisas de desvairados modos. Esta gente até agora foram gentios, e já alguns deles são feitos cristãos. (…)

Quanto a Diogo de Azambuja, não terminaram aqui os seus feitos como homem de armas. Recompensado pelo rei com o cargo de alcaide de Monsaraz, para além de outras recompensas como a nomeação para o Conselho Real, Diogo de Azambuja manteve-se porém ligado á Corte e ao serviço do rei, embora a sua idade e uma deficiência física aconselhassem já a sua retirada. E é já com mais de setenta anos que aceita uma missão que o rei D. Manuel o encarrega, em 1506: construir uma fortaleza na região de Safim, no sul de Marrocos, de forma a aí permitir a fixação portuguesa. Diogo de Azambuja não só cumpriu tal missão com êxito, como tomou a própria cidade de Safim, permanecendo como capitão da cidade até 1509, com a idade de cerca de 77 anos. Nesta data regressou a Portugal, vindo a falecer em 1518.

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Mensagem por Lusitano89 21st março 2011, 22:58

Dois Reis dos Descobrimentos: D. João II e D. Manuel I


D. João II (1455-1495) e D. Manuel (1469-1521) são duas figuras que assumem os destinos do reino numa época áurea, em que Portugal lidera o movimento expansionista europeu, intitulando-se reis "da Guiné, da Conquista, da Navegação e do Comércio". Além dessa renovação dos horizontes do Mundo conhecido, representam igualmente o fim do Estado português medieval, estratificado em ordens, e a tentativa de implantação de uma nação de características modernas, centrada na figura do rei e no poder que detém (génese do absolutismo).

No que se refere à política dos Descobrimentos, a acção deste dois reis será complementar, acabando e consolidando D. Manuel aquilo que havia sido empreendido por D. João II. Este último esteve encarregue da política ultramarina desde muito jovem, ainda em vida de seu pai, D. Afonso V, um rei mais voltado para as conquistas militares. Foi como príncipe que impulsionou a doutrina do mare clausum (mar fechado, exclusivo), plasmada no Tratado de Toledo (1480), que dividia o mundo entre Portugal e Castela pelo paralelo das Canárias. Já como rei, estimula a expansão, continuando o reconhecimento da costa africana. Neste sentido apoiou as viagens de Diogo Cão e de Bartolomeu Dias, que atinge o Sul do continente africano (em 1488). Paralelamente, incentivou e apoiou a viagem de Pêro da Covilhã e de Afonso Paiva, pelo Mediterrâneo, que alcançam o Egipto e a Etiópia.
Estas empresas foram, porém, fortemente ab
aladas pela morte do seu único herdeiro legítimo, o príncipe D. Afonso (1475-1491), e pelo sucesso da viagem de Cristóvão Colombo (1492). D. João II passa então a centrar-se mais na parte ocidental do Atlântico. Reivindicando para si as terras então descobertas, inicia uma luta pela partilha do Globo, fixada num meridiano a 370 léguas a oeste da ilha de Santiago (ilhas de Cabo Verde), no Tratado de Tordesilhas (7 de Junho de1494). Com este texto, ficava definitivamente instituída a doutrina de mare clausum, o que permitiu a Portugal governar os mares e as trocas a Oriente (daquele meridiano) durante o século XVI. Ao mesmo tempo ficava salvaguardado o território brasileiro, por pura intuição ou por conhecimento efectivo. Neste aspecto é importante ter em consideração que D. João II havia enviado a frota de D. Francisco de Almeida (1493) para tomar posse das terras descobertas por Colombo, que dizia serem portuguesas, e também que os sábios portugueses tinham uma noção da dimensão do globo terrestre muito próxima da real, o que podia apontar para o conhecimento das terras brasileiras.

O seu cunhado e legítimo sucessor, segundo disposição testamentária, D. Manuel, irá dar continuidade a esta política, começando pela viagem para a Índia, ao que se sabe já preparada em vida de D. João II. É assim que a armada de Vasco da Gama parte em Julho de 1497, chegando a Calecute em Maio do ano imediato. Em 1500, segue-se a armada de Pedro Álvares Cabral, que atinge a costa brasileira antes de chegar a Calecute, onde estava incumbida de estabelecer uma feitoria. Esta seria uma tarefa difícil, dadas as intrigas feitas pelos muçulmanos, que dominavam até então o comércio com o Oriente. Apoiados nos reis de Cochim e Cananor, os portugueses instalam-se comercialmente ainda que num clima de grande instabilidade. Para fortalecer os laços com as autoridades locais e ao mesmo tempo representar o rei no Oriente, é nomeado o primeiro vice-rei, D. Francisco de Almeida, ao qual se segue D. Afonso de Albuquerque, conhecido pela sua política de conquistas. As restantes iniciativas dos Descobrimentos prosseguiram na costa africana, com particular destaque para a região marroquina. O território de Vera Cruz, nome com o qual foi primeiramente baptizado o Brasil, não foi logo alvo de grandes atenções, procedendo-se unicamente a algumas operações de reconhecimento da costa. A glória deste tempo seria a descoberta do caminho marítimo para a Índia (1498) e o comércio por lá estabelecido.

Em termos de política interna, estes dois reinados representam a tentativa de implantação do Estado moderno em Portugal, que se inicia com a acção centralizadora de D. João II. A estrutura tripartida da sociedade medieval colocava o rei em pé de igualdade com a nobreza e o clero, também eles senhores dentro das suas terras, muitas vezes doadas pelo próprio rei. Ao subir ao poder, D. João II sente-se "rei das estradas de Portugal", não tendo efectivamente poder sobre grande parte do seu território, doado ao desbarato por seu pai, muito comprometido com a nobreza. Como forma de alterar esta situação, o novo rei exige que lhe seja jurada fidelidade, impondo ainda a entrada dos seus corregedores em todos os senhorios. A tentativa de oposição à mudança irá levar à perseguição da casa ducal de Bragança e também dos duques de Viseu, com a condenação de D. Fernando (1483) e a morte de D. Diogo (1484), revertendo os seus bens em favor da coroa e de muitos outros nobres que tiveram que partir para o exílio.

Outras medidas apontam para a centralização em direcção a uma mentalidade moderna e absolutista. Ainda no tempo de D. Afonso V, o jovem príncipe D. João parecia estar por trás do levantamento dos habitantes do reino (1475), feito numa perspectiva que ultrapassava os objectivos militares e fiscais usuais, impondo -se quase como um meio de controlo social. Foi igualmente um rei pouco "democrático", no sentido em que convocou cortes com pouca frequência, tornando-as igualmente mais fixas numa cidade e não correndo as cidades do país. Quanto ao conselho representativo das camadas superiores das forças populares, socorreu-se dele para atingir os seus objectivos centralistas, apoiado no aparelho administrativo, agora em fase de reformas. Nota-se, deste modo, uma clara evolução da instituição régia, com o rei agora a apresentar-se acima de todos os outros detentores de títulos e de poderes, decaindo, assim, a unidade trinitária medieval. Ao mesmo tempo, sente-se uma mudança na forma de exteriorizar o poder social. Aos testamentos medievais rígidos, em que cada um possui a sua função, segue-se uma sociedade em que o nobre também tem acesso ao comércio, residindo o seu poder e a sua honra nos modos e na educação. D. João II aboliu identicamente a política restritiva de mobilidade socioprofissional, ideia de modernidade, mas que também servia os seus interesses demográficos. Igualmente moderna, mas importante para as finanças do reino, foi a revisão e reforma dos forais, decorrente do seu conflito com os senhores locais, depois concluída por D. Manuel.

Na verdade, D. Manuel irá consolidar politicamente todas as vontades expressas pelo seu antecessor com vista à instauração de um país unificado, que responderia perante um único poder. Os forais são de facto uma forma de sujeitar todo o território a uma mesma lei. Obedecendo a esta mesma lógica, o rei Venturoso procedeu a uma reforma monetária, criando o escudo de prata ou português, inspirado nos marcelos venezianos, o que facilitava as trocas a nível comercial e tornava a nova moeda num meio de troca capaz de concorrer nas rotas orientais. Por outro lado, a actualização dos forais exigia novas formas de pagamento, uma vez que algumas das antigas moedas haviam já desaparecido de circulação. Os forais perdem assim o seu carácter marcadamente político e convertem-se em diplomas de gestão fiscal. Nesta última área, D. Manuel procede à elaboração de um novo regimento das sisas (imposto que ainda hoje vigora no nosso país), dos contadores das comarcas e dos da Fazenda, procurando unificar a moeda. Ainda neste afã unificador, e portanto centralizador, promove a reforma dos pesos e medidas (1502) e a reforma das Ordenações Afonsinas, estando o novo texto, conhecido por Ordenações Manuelinas, pronto em 1521.

Estava-se perante um Estado progressivamente mercantilista e burocrático. Nasciam assim, as bases do Estado moderno, no qual o rei tomava as rédeas do poder, a todos os níveis. Este estava acima de tudo e de todos, sendo de notar a regulamentação por D. Manuel dos cerimoniais ligados à realeza, mais simbólicos e próprios de um rei poderoso.

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Mensagem por Lusitano89 22nd março 2011, 22:17

Chegada à Índia e consolidação do Império Oriental

A Expansão Portuguesa Assinaturadevasco
Assinatura de Vasco da Gama

Com a morte de D. João II, D. Manuel I chegou ao trono português em 1495, um ano depois da assinatura do Tratado de Tordesilhas segundo o qual os impérios ibéricos dividiram o domínio dos mares. O novo monarca respeitou e deu prosseguimento à política voltada para a expansão perfilhada pelo Príncipe Perfeito, e seguiu de perto a preparação da viagem de Vasco da Gama.
Um dos objectivos primordiais desta viagem era a fixação de um entreposto comercial em Calecute, o principal fornecedor de especiarias, no centro das rotas comerciais que passavam pelo mar Vermelho, pelo Golfo Pérsico, por Bengala e Malaca.
O capitão-mor estava incumbido de negociar com o Samorim ("Senhor dos Mares") ou rei de Calecute, um acordo político e comercial que resultasse na fixação de uma feitoria neste ponto do globo. Contudo, esta acção aparentemente simples iria chocar com os interesses dos comerciantes muçulmanos que detinham o monopólio deste comércio.

Para atingir estes territórios longínquos era preciso, em primeiro lugar, ultrapassar as vicissitudes de uma longa e perigosa viagem até Calecute. A 8 de Julho de 1497, a armada portuguesa partiu do Tejo e a 27 desse mês, estava a fazer escala na ilha de Santiago, no Arquipélago de Cabo Verde, de onde zarparam a 3 de Agosto. Passados nove dias estava já na baía de Santa Helena, no sudoeste de África. Aí os barcos foram reparados e reabastecidos, para que a armada retomasse a viagem e se preparasse para ultrapassar o Cabo da Boa Esperança, o que aconteceu a 22 de Novembro. No dia 25, a armada chegava à angra de São Brás, onde fez aguada. Passados treze dias, estava pronta para seguir viagem e ultrapassar os limites atingidos pelo navegador Bartolomeu Dias.

Entretanto, os navegadores avistaram a terra do Natal na actual África do Sul (assim baptizada porque quando aí chegaram era 25 de Dezembro). Seguidamente, pararam no Rio do Cobre e no rio dos Bons Sinais, atingindo a ilha de Moçambique a 2 de Março do novo ano. Depois de terem sentido uma forte hostilidade por parte do sultão que governava a ilha, quando este descobriu que eram cristãos, deixaram Moçambique a 29 desse mês na companhia de um piloto de origem muçulmana, que conseguiram a custo. No dia 7 de Abril, os descobridores avistaram Mombaça onde tiveram problemas, e no dia de Páscoa passaram em Melinde, onde o navegador português foi bem recebido pelo sultão, conseguindo um piloto que o conduzisse ao seu destino final, de seu nome Ahmed ben Madjid.

Pouco depois partiram rumo a Calecute, cidade onde desembarcaram a 22 de Maio de 1498, quase um ano após a sua partida.
A recepção dos portugueses foi bastante calorosa, mas este clima de bom relacionamento cedo se transformou num clima de desconfiança e até de alguma hostilidade, devido à tensão provocada pelos mercadores muçulmanos que se sentiam ameaçados com a concorrência dos portugueses. Registe-se também que para esta situação contribuiu o fracasso representado pelos presentes trazidos de Portugal para o rei de Calecute, considerados indignos para um povo habituado a ser agraciado com outro tipo de dádivas mais faustosas.

Este impasse foi ultrapassado sendo então possível fazer uma troca de produtos: os tecidos, as mantilhas e o estanho foram cambiados por uma porção de pedras preciosas e por algumas especiarias. De qualquer modo, não se concretizou a grande missão desta viagem, que era o estabelecimento de uma feitoria.

Os portugueses voltaram à sua terra natal a 29 de Agosto de 1498, depois de passarem alguns meses de grande tensão. O regresso foi bastante agitado, pois as calmarias equatoriais e o escorbuto entraram em acção com graves consequências. O elevado número de mortes levou mesmo ao abandono da nau São Rafael.

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Nau São Gabriel (Nau Capitânia de Vasco da Gama em 1497) pintura de Björn Landström (1961)

O primeiro barco a regressar a Portugal foi o de Nicolau Coelho. Vasco da Gama chegou um pouco mais tarde, em Setembro de 1499, pois fizera escala na Ilha Terceira por motivos do falecimento do seu irmão Paulo da Gama.
Com o regresso de Vasco da Gama, D. Manuel repensou a estratégia traçada para a Índia. Desta, resultou uma nova viagem para a qual preparou uma armada composta por treze navios e 1500 homens, comandada por Pedro Álvares Cabral, que a 9 de Março de 1500 partiu da capital para voltar a Calecute e desta vez afirmar o poder do monarca português.
Durante a sua viagem, a armada vislumbrou terra a 22 de Abril de 1500, a qual viria a receber o nome de Vera Cruz. Para esta notícia chegar até D. Manuel, um barco voltou a Portugal para transmitir a boa nova (ou confirmar uma suposição antiga...). Tinha-se descoberto o Brasil.

No segundo dia do mês seguinte, a armada retomou a sua viagem, chegando ao seu destino a 13 de Setembro, com apenas seis dos iniciais treze barcos. Mais uma vez, o rei de Calecute não se vergou perante os portugueses. Pedro Álvares Cabral chegou mesmo a bombardear a cidade por dois dias enquanto os navios atracavam no porto indiano para carregar as mercadorias.
O rei D. Manuel não ficou muito satisfeito com o resultado desta viagem, pois embora se tenham importado produtos de luxo, se tenham estabelecido relações comerciais com os reis de Cananor e de Cochim e se tenha descoberto a Terra de Vera Cruz, os objectivos "indianos" continuavam a não ser plenamente atingidos.

Assim, D. Manuel mandou preparar uma nova viagem. Vasco da Gama foi mais uma vez chamado a comandar uma armada, mais poderosa do que as anteriores e apetrechada com vinte navios, cinco dos quais eram chefiados pelo seu tio, Vicente Sodré, que permaneceriam na Índia para apoiar as feitorias de Cochim e Cananor e para afastar os muçulmanos do mar Vermelho. Tinha intuitos punitivos para com o Samorim de Calecute, devido ao massacre dos portugueses que lá ficaram.

A opção pela força era, agora, bem clara. Um dos grandes propósitos desta viagem era a vingança ou castigo de todos aqueles que foram anteriormente hostis para com os portugueses. A primeira intervenção foi direccionada para a costa oriental africana. Em Julho de 1502, Vasco da Gama ordenou o bombardeamento do porto de Quíloa, na África Oriental, num passado recente hostil para com Pedro Álvares Cabral e os seus homens, impondo um tributo de 500 maravedis ao sultão. Face a esta ofensiva, o monarca africano não teve outro remédio senão pagar um pesado tributo em ouro aos portugueses. Contudo, o principal objectivo era o samorim de Calecute. Para com ele e as suas forças, Vasco da Gama foi implacável. A cidade foi bombardeada e os seus navios tomados e destruídos. Em resultado destas acções, a autoridade portuguesa foi finalmente imposta. Mas o custo era elevado. A desconfiança para com os súbditos do rei de Portugal nunca foi ultrapassada.

Nos primeiros anos do século XVI, os portugueses tentaram aplicar nesta região a estratégia utilizada na costa ocidental africana, através da qual se estabeleciam conversações com as autoridades locais para a fundação de feitorias, que de facto vieram a ser fixadas em Cochim, em Cananor, em Coulão e em São Tomé de Meliapor.

A política governativa aqui implementada teve, no entanto, que ser alterada para responder a alguns problemas específicos. Assim, D. Manuel criou o cargo de vice-rei da Índia, atribuído pela primeira vez a D. Francisco de Almeida em 1505. No governo de D. Francisco de Almeida (1505-1509), foram seguidas as directrizes da política imperial manuelina. O vice-rei mandou erigir as fortalezas de Sofala, Moçambique, Quíloa, Socotorá e Cananor e entrou na batalha naval de Diu, um episódio decisivo para o desenvolvimento do império português no Oriente.

D. Afonso de Albuquerque tomou o governo da Índia em 1509 e conseguiu, a partir daí, trazer para a coroa portuguesa o monopólio do comércio das especiarias através da defesa do Índico com armadas e a ocupação de determinados pontos chave como, por exemplo, a tomada de Ormuz, Goa e Malaca.

Os vice-reis subsequentes tentaram seguir o seu projecto inicial e, para tal, fundaram feitorias e missões ao longo do território português oriental. O comércio era organizado através dessa rede de feitorias a partir das quais os produtos eram exportados para o Ocidente, pela Rota do Cabo, até chegarem à Casa da Índia e daí, à feitoria da Flandres (Antuérpia), ligação especial deste tráfico à Europa. Esta feitoria distribuía as mercadorias orientais e permitia a compra de metais preciosos essenciais para a realização deste comércio.

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Mensagem por Lusitano89 24th março 2011, 11:30

Batalha Naval de Cananor - 31 de Dezembro de 1501 a 2 de Janeiro de 1502


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Imagem de João da Nova

Convencido de que Pedro Álvares Cabral teria conseguido assentar o trato das especiarias com os reis da costa do Malabar, D. Manuel, no ano de 1501, limitou-se a enviar à Índia uma armada de quatro naus, das quais três eram de particulares. Levava essa armada cerca de trezentos e cinquenta homens, dos quais apenas oitenta eram homens de armas, já que ia para comerciar e não para combater. Para seu capitão-mor foi escolhido João da Nova, fidalgo de origem galega que ocupava o cargo de «alcaide-pequeno» da cidade de Lisboa. De notar que, nesta altura, ainda prevalecia na Corte portuguesa a ideia de que era possível estabelecer relações comerciais pacíficas com os indianos.

Chegada a armada à enseada de São Brás, próximo do cabo da Boa Esperança, foi encontrada, dentro de um sapato pendurado numa árvore, uma carta em que um dos capitães da frota de Cabral dava conta da situação em que ficara a Índia. Por ela concluiu João da Nova, com alguma apreensão, que afinal as coisas não estavam tão risonhas como se supunha quando partira de Lisboa. E resolveu levar as quatro naus consigo em vez de deixar uma em Sofala, conforme estipulava o seu regimento.

Depois de ter feito escala em Quíloa, Melinde, Angediva e Cananor, chegou a Cochim, onde constatou que o feitor, devido à obstrução dos mercadores «mouros» não tinha conseguido arranjar a pimenta suficiente para carregar completamente as suas naus. Por isso, depois de ter embarcado a pimenta que havia na nossa feitoria, resolveu voltar a Cananor. Aí chegado, foi muito bem recebido pelo rei, que o autorizou a instalar uma feitoria e providenciou para que lhe fossem fornecidas as quantidades de pimenta e gengibre de que necessitava para completar a carga dos seus navios.

Estando esta praticamente concluída, preparava-se João da Nova para iniciar a torna-viagem quando, a 30 de Dezembro, apareceu à vista de Cananor uma armada que o Samorim de Calecut organizara com o propósito de destruir os portugueses, composta por cerca de quarenta naus e cerca de cento e oitenta paraus e zambucos (embarcações de remo e vela mais pequenas que as fustas) em que iam embarcados para cima de sete mil homens.

Vendo João da Nova com tão poucos navios e tão pouca gente face à imensa armada do Samorim, o rei de Cananor aconselhou-o a abandonar as naus e a fortificar-se em terra, onde, com a sua ajuda, se poderia defender melhor. Como seria de esperar, João da Nova não aceitou o alvitre e, depois de se ter reunido em conselho com os capitães das outras naus, resolveu sair para o mar, onde melhor poderia tirar partido da superioridade da sua artilharia e da melhor qualidade dos seus navios. Mas não o pôde fazer nesse dia por já ter começado a soprar a viração (brisa do mar).

Ao amanhecer do dia 31 de Dezembro, apareceu a baía de Cananor completamente bloqueada pela armada de Calecut. Aproveitando o terral (brisa da terra), a armada portuguesa suspendeu e foi ao encontro do inimigo, disposta a libertar-se do anel de naus e paraus em que se encontrava encerrada. Travou-se então uma furiosa peleja em que os navios de Calicut lançavam sobre os nossos nuvens de flechas, ao mesmo tempo que os procuravam abordar. Mas, como eram muitos e, por isso, tinham de andar muito juntos, não só se embaraçavam uns nos outros, como constituíam um alvo fácil para os nossos bombardeiros (artilheiros), espingardeiros e besteiros, que não perdiam um tiro! Rota e ultrapassada a linha de bloqueio inimiga, João da Nova, provavelmente, terá continuado a navegar para o largo, com os navios formados em coluna, a fim de não perder barlavento em relação a Cananor, onde tinha que voltar antes de poder iniciar a torna-viagem.

Será oportuno referir que a partir do momento em que os Portugueses passaram a armar as suas naus com canhões de grosso calibre, disparando para BB ou para EB, passaram naturalmente a combater no mar com os navios formados em coluna, ou seja, uns a seguir aos outros, a curta distância, única formatura compatível com peças a disparar para os bordos. Nas instruções dadas a Pedro Álvares Cabral era claramente recomendado que, no caso de ter de travar um combate no mar, o fizesse utilizando a artilharia e com os navios formados em coluna. Será, por isso de admitir que nesta primeira batalha naval que os Portugueses travaram na Índia os nosso navios tenham inaugurado a era da formatura em coluna que haveria de durar até à 2ª Guerra Mundial.

Por volta do meio-dia, caindo o vento e ficando as naus imobilizadas é natural que os paraus e zambucos tenham intensificado os seus ataques, que continuaram a ser repelidos pelo fogo da nossa artilharia. Vinda a viração, é de supor que João da Nova., pela razão já referida, tenha posto a proa a nordeste, continuando a batalha a desenrolar-se nos moldes anteriores: arremessos de flechas e tentativas de abordagem, por parte dos navios de Calecut; descargas cerradas da artilharia, por parte dos portugueses. Ao pôr do Sol, tornando a cair o vento, as duas armadas fundearam perto da costa. Nos combates desse dia haviam sido afundados dois paraus de Calecut e avariados muitos outros. Durante a noite, em que os portugueses tiveram de estar sempre de armas na mão, os malabares tentaram por diversas vezes pegar fogo às nossas naus, levando para junto delas almadias (espécie de pirogas) carregadas com materiais inflamáveis. Mas, de todas as vezes, foram pressentidos e escorraçados.

O dia 1 de Janeiro foi, praticamente, uma repetição do dia anterior. De manhã, com o terral, João da Nova deverá ter feito um bordo para o mar e, à tarde, com a viração, deverá ter feito um bordo para a terra, acabando por fundear, ao pôr do Sol, nas proximidades do Monte Deli, que fica cerca de quinze milhas a norte de Cananor. Durante todo esse dia continuou a ser perseguido pelas naus, paraus e zambucos de Calecut, tendo conseguido afundar três das primeiras e mais sete dos segundos e terceiros.
Ao outro dia de manhã, a 2 de Janeiro, estando a armada portuguesa francamente a barlavento de Cananor e tendo os portugueses perdido todo e qualquer receio do inimigo, que, afinal, se revelara um «tigre de papel», é natural que João da Nova tenha decidido voltar para trás e começar a perseguir aqueles que até então o tinham estado a perseguir. Nesta fase da batalha foram afundadas mais duas naus e três paraus ou zambucos de Calecut.

É possível que tenha sido nesta altura que o inimigo tentou pôr cobro à chacina de que estava sendo alvo, mostrando por diversas vezes uma bandeira branca, conforme refere Castanheda. O que não oferece dúvidas é que a armada de Calecut, com muitos navios avariados e cheios de mortos e feridos, completamente desbaratada, já não pensava senão em escapar-se. Com as suas guarnições exaustas por três dias de combates e duas noites de constantes sobressaltos, João da Nova abandonou a perseguição e dirigiu-se, de novo, a Cananor.

Nesta batalha, em que ficou claramente demonstrada a superioridade da artilharia e dos navios portugueses sobre os seus congéneres indianos, sofreram os inimigos mais de quatrocentos mortos, além dos feridos, que devem ter sido em número muito elevado. Dos nossos, apenas uma dezena sofreram ferimentos ligeiros. De regresso a Cananor, a nossa armada capturou ainda uma «nau de Meca», a que, depois de saqueada, João da Nova mandou lançar fogo com todos os tripulantes dentro. Já de regresso a Portugal, por alturas de Monte Deli, caiu-lhe nas mãos uma segunda «nau de Meca», que teve o mesmo destino da primeira.

A armada de João da Nova, que chegou sem novidade a Lisboa em Setembro de 1502, foi uma das poucas armadas da Índia que conseguiu ir e voltar com os navios todos juntos e sem perder nenhum. Para terminar, diremos também que foi esta armada que, na torna-viagem, descobriu a ilha de Santa Helena, no Atlântico Sul, que, mais tarde, se haveria de transformar num ponto de escala fundamental para a viagem de regresso da Índia.


Saturnino Monteiro
em «Batalhas e Combates da Marinha Portuguesa» (Vol.I)

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Mensagem por Lusitano89 25th março 2011, 20:35

Batalha do Passo de Cambalão - Abril de 1504


Durante a primeira guerra de Cochim, em 1503, tinham-se passado para o Samorim de Calicut dois italianos, idos à Índia nas naus portuguesas a mandado de Veneza, com o propósito de ensinarem os Malabares a fabricar artilharia e a servirem-se dela contra nós. Por outro lado, os Turcos tinham fornecido ao Samorim grande quantidade de canhões e espingardas. Por tudo isso, quando ele, em 1504, voltou a invadir o reino de Cochim, após a partida para Portugal de Francisco e Afonso de Albuquerque, dispunha de um exército e de uma armada muito melhor equipados que os do ano anterior.

Incluindo as tropas de quatro reis seus vassalos, o exército do Samorirn ascendia a mais de oitenta e quatro mil homens. A sua armada era composta por cerca de cem paraus, cada um deles armado com duas bombardas e cinco espingardas, cerca de cem tones com uma bombarda cada um e grande número de catures (navios ligeiros).
A concentração destas forças foi efectuada em Cranganor, donde partiram nos primeiros dias de Abril em direcção a Cochim, indo a armada pelos rios e esteiros que ligam as duas cidades, não só por ser já difícil, naquele mês, a viagem por mar, mas também por causa da fortaleza e da nau que defendiam a barra de Cochim.

Para enfrentar o enorme potencial bélico do Samorim, dispunha Duarte Pacheco Pereira somente de uma nau, em que deixou o mestre por capitão com mais vinte e quatro homens, duas caravelas com vinte e cinco homens cada uma e dois batéis artilhados, um dos quais capitaneado por ele próprio, guarnecidos cada um com vinte soldados. Na feitoria, estava o feitor, fazendo também as vezes de alcaide, com mais trinta e oito homens! A inferioridade das forças portuguesas em relação às do Samorim era de um para quinhentos em homens e de um para sessenta em navios!

Quando a invasão de Cochim se tornou iminente, Duarte Pacheco mandou construir uma forte paliçada diante do vau que na maré baixa dava passagem para a quase ilha em que estava construída a cidade. Além disso, mandou reforçar a protecção das caravelas e dos batéis com paveses feitos de tábuas da grossura de dois dedos e com arrombadas constituídas por sacos cheios com algodão, pendurados fora da borda, destinados a amortecer o impacto dos pelouros inimigos. Mandou também armar cada batel com quatro berços.

Apesar de todos estes preparativos, a população de Cochim e o próprio rei andavam muito descoroçoados por ver que as nossas forças eram insignificantes comparadas com as do Samorim. Para os animar, Duarte Pacheco efectuou vários assaltos de surpresa contra as terras de Cochim que se haviam passado para o lado do invasor, queimando-lhes muitas aldeias e matando-lhes muitos naires.

Sabendo então que o exército e armada do Samorim se estavam dirigindo para o passo de Cambalão (que hoje é muito difícil de saber exactamente onde ficava situado), resolveu ir esperá-los aí, levando consigo apenas uma caravela e os dois batéis, já que a nau, devido ao seu calado, não podia navegar nos rios e esteiros e a outra caravela ainda não tinha concluído a reparação das avarias que sofrera na guerra do ano anterior. Chegado ao local, onde o rio teria cerca de cem metros de largura, fundeou os seus três navios com fortes amarras de ferro, para que o inimigo as não pudesse cortar facilmente, e mandou passar rejeiras de uns para os outros para, alando por elas, poderem orientar à vontade a direcção dos seus canhões.

Ao amanhecer do dia 16 de Abril apareceu a margem norte coberta de soldados que atroavam os ares com os seus gritos e o toque de inúmeros instrumentos bélicos. À borda de água tinha sido montada durante a noite, sob a direcção dos dois italianos, uma bateria de cinco canhões que começou logo a bombardear a caravela. Respondeu esta acto continuo e fê-lo tão eficazmente que a guarnição da bateria se pôs em fuga. Nessa altura começou a despontar, detrás de uma curva do rio, a imensa armada de Calicut. À sua vista, alguns paraus de Cochim que tinham ido em companhia de Duarte Pacheco fugiram para aquela cidade, onde espalharam a notícia de que os portugueses estavam perdidos!

A verdade é que, sob o ponto de vista táctico, a escolha do local fora excelente. Devido à pouca largura do rio naquele ponto, os paraus inimigos só podiam avançar numa frente estreita. Por isso, os nossos navios só tinham que combater de cada vez com pouco mais de uma dezena. Por outro lado, devido à falta de espaço para manobrar, os que eram obrigados a retirar, destroçados e cheios de mortos e feridos, embaraçavam e desmoralizavam os que vinham atrás. Não obstante, parecia milagre como três navios minúsculos iam conseguindo deter aquela mole imensa que avançava contra eles e que parecia submergi-los.

Primeiro, vieram vinte paraus, amarrados uns aos outros, disparando continuamente as suas quarenta bombardas e as suas cem espingardas, acompanhadas do arremesso de milhares de flechas. Mas os paveses e as arrombadas dos nossos navios funcionaram às mil maravilhas, aguentando bem o impacto dos pelouros, das balas e das flechas, enquanto os bombardeiros e espingardeiros portugueses chacinavam as guarnições dos paraus inimigos que não dispunham de qualquer espécie de protecção.
Ao fim de pouco tempo, dos vinte paraus que tinham iniciado o ataque, quatro já estavam meio alagados, cheios de mortos e feridos e incapazes de manobrar; os restantes, também com avarias diversas, mortos e feridos, viram-se obrigados a retirar. Mas foram logo substituídos por outro grupo de cerca de uma dezena de unidades que não teve melhor sorte. E, depois, veio outro grupo, e outro, e outro... Mas o resultado era sempre o mesmo: após algum tempo de duelo de artilharia com a nossa caravela e os nossos batéis, os paraus do Samorim eram obrigados a bater em retirada com muitas avarias e cheios de mortos e feridos.
Pelo meio-dia, estando já a água do rio tinta de sangue, a armada de Calicut cessou os seus ataques e bateu em retirada. Ao mesmo tempo, as tropas de terra que durante a batalha não tinham parado de lançar flechas sobre os nossos navios, afastaram-se também para fora do alcance da sua artilharia.

Nesta primeira batalha, conforme veio a saber-se mais tarde, teve a armada de Calecut para cima de mil e trezentos mortos. Dos portugueses não morreu nem ficou ferido nenhum! Abençoados paveses e arrombadas!
Poucos dias depois desta primeira batalha, veio juntar-se à flotilha de Duarte Pacheco a caravela que ficara em Cochim a acabar as reparações.

Vexado com a derrota sofrida, o Samorim resolveu fazer segunda tentativa no domingo seguinte, que era Domingo de Páscoa, começando por enviar sessenta paraus, por outro rio, contra a nau que estava em Cochim na esperança de que Duarte Pacheco fosse imediatamente em seu auxílio, deixando livre o passo de Cambalão.

Daí resultou que, cerca das nove horas, chegou uma embarcação com com um recado do rei de Cochim para Duarte Pacheco pedindo-lhe que fosse ajudar a sua nau que estava em apuros. Mas este não se deixou impressionar. No entanto, como a maré estava a vazar, resolveu ir com uma caravela e um batel em socorro da nau, pensando que poderia regressar, logo que a maré começasse a encher, a tempo de apoiar a outra caravela e o outro batel que ficavam defendendo o passo.
E assim aconteceu!

Logo que Duarte Pacheco chegou perto da nau, os paraus que a estavam a atacar, temendo ficar metidos entre dois fogos, puseram-se em fuga e ele, aproveitando a enchente, tal como previra, voltou rapidamente para o passo de Cambalão, onde a outra caravela e o outro batel estavam aguentando sozinhos todo o peso da armada de Calecut.

E repetiram-se as cenas da semana anterior. Os paraus do Samorim, durante mais de três horas, lançaram repetidos ataques sobre os navios portugueses, em tentativas desesperadas para os abordar, sendo de todas as vezes rechaçados com muitas avarias e um número elevado de mortos e feridos. Depois de terem perdido dezanove paraus, incendiados ou afundados e terem tido cerca de duzentos mortos, não tiveram outra alternativa senão retirar.

No dia seguinte, em vez de aproveitarem para repousar das fadigas da véspera, os portugueses foram atacar de surpresa uma povoação da ilha de Cambalão, tendo no caminho combatido com catorze paraus, que desbarataram!
E no dia imediato a esse teve lugar a terceira batalha que, tal como a primeira começou com um bombardeamento cerrado dos nossos navios por parte da bateria de terra. Mas o tiro desta era pouco certeiro e Duarte Pacheco deu ordem aos seus homens para não responder, a fim de dar confiança à armada inimiga para se aproximar. O estratagema resultou. Quando os navios que constituam a sua vanguarda se aperceberam que os portugueses já não respondiam ao fogo de terra, convenceram-se que teriam sofrido graves perdas e lançaram-se sobre eles atabalhoadamente, certos de que desta vez os iriam finalmente abordar. Só que no momento em que estavam prestes a chegar junto deles foram recebidos por uma salva disparada à queima-roupa de todos os canhões e todas as espingardas das caravelas e dos batéis que lhes mataram muita gente e meteram no fundo, de uma assentada, oito paraus!

O primeiro ímpeto do inimigo fora quebrado. Mas continuaram a vir mais e mais paraus que, uns após outros, ou eram afundados ou obrigados a retirar cheios de mortos e feridos. Por volta do meio dia, quando a batalha estava já a esmorecer, um dos nossos batéis começou a arder. Reanimaram-se os malabares e todos os paraus que o puderam fazer concentraram sobre ele o seu fogo e os arremessos de flechas, na esperança de o tomarem. Mas, mais uma vez, as suas expectativas foram goradas. A guarnição do batel conseguiu dominar o incêndio e continuou a combater com a mesma eficácia de antes. Só restava ao inimigo retirar. Foi o que fez, tendo perdido nesta terceira batalha mais vinte e dois paraus e sofrido mais de seiscentos mortos.

Logo que a armada de Calecut iniciou a retirada, Duarte Pacheco, apesar de ter os seus homens exaustos, foi em sua perseguição com os dois infatigáveis batéis e, saltando em terra, matou muitos naires do senhor de Cambalão e queimou-lhe mais duas povoações, sem perder um único soldado!

E com tudo isto andavam os Malabares e os «Mouros» assombrados e diziam que o Deus dos Portugueses estava combatendo por eles, pois que de outro modo não se podia explicar como é que, sendo tão poucos, alcançavam sempre a vitória, tanto em terra como no mar, contra inimigos tão numerosos!


Saturnino Monteiro
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Mensagem por Lusitano89 27th março 2011, 03:21

Batalha naval de Ormuz - 27 de Setembro de 1507

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Ao raiar do dia 25 de Setembro do ano de 1507 começou a aproximar-se do fundeadouro principal da cidade de Ormuz uma estranha esquadra de seis naus, coberta de bandeiras e pendões que nunca haviam sido vistos por aqueles mares.
Tratava-se de uma esquadra portuguesa que partira de Lisboa no fim do Inverno de 1506, integrada na armada de Tristão da Cunha. O seu capitão-mor chamava-se Afonso de Albuquerque!

Pelo meio-dia, os navios portugueses alcançaram o porto e fundearam, em ar de desafio, junto das maiores naus que ali se encontravam, ao mesmo tempo que salvavam à terra com toda a sua artilharia e as suas guarnições atroavam os ares com enorme algazarra.

Ormuz era então a cidade mais importante do golfo Pérsico e chave do comércio marítimo entre a Arábia, a Pérsia e a Índia. Os seus palácios e casas de habitação em nada ficavam a dever aos da Europa. As suas ruas eram numerosas e nelas proliferavam as lojas e os mercados, onde se podiam encontrar todos os produtos do Oriente, desde os mais modestos, como as tâmaras e os limões, até aos mais sumptuosos, como as pérolas de Barém, os cavalos e as tapeçarias da Pérsia ou as sedas e as porcelanas da China.
Pois fora precisamente esta cidade, rica e poderosa entre todas, que o rei D. Manuel de Portugal decidira subjugar, erguendo nela uma fortaleza, e era a isso que vinha a esquadra de Afonso de Albuquerque.
Ormuz era nessa época um reino praticamente independente, embora vagamente vassalo do xá da Pérsia. Quem o governava não era o rei, que tinha apenas quinze anos, mas sim um grão-vizir todo poderoso chamado Cogeatar.

A chegada dos portugueses, com todo o seu aparato bélico, constituiu um choque mas não propriamente uma surpresa para este. Na verdade, durante as últimas cinco semanas não tinham cessado de chegar a Ormuz notícias alarmantes, mesmo aterradoras, acerca de uma esquadra de frangues (cristãos) e de um terrível capitão que estava pondo a ferro e fogo a costa de Omã. Sabia-se que Calaiate, Curiate, Mascate, Soar e Corfação se haviam tornado vassalas do rei de Portugal; que aquelas que tinham resistido tinham sido tomadas à viva força e saqueadas; que aos prisioneiros de guerra tinham sido cortados os narizes e as orelhas. Dizia-se mesmo que os Portugueses comiam gente! Por tudo isto Cogeatar se sentia apreensivo e tratara de tomar as suas precauções. Proibira a saída de qualquer das cerca de sessenta naus que estavam fundeadas em Ormuz e guarnecera-as com muita gente de armas, ao mesmo tempo que mandava chamar a sua armada, constituída por cerca de cem terradas (navios parecidos com fustas) que se encontravam na costa da Pérsia.

O que ele felizmente não sabia é que a esquadra de Afonso de Albuquerque, apesar da fama de que vinha precedida, era muito menos forte do que aparentava. Essa esquadra tinha passado um longo inverno na costa oriental da África. Integrada na armada de Tristão da Cunha, colaborara nos assaltos a Hoja e Brava e na conquista de Socotorá. Tendo perdido muita gente por doença, restavam-lhe apenas quatrocentos e sessenta homens, metade dos quais doentes ou debilitados. Todos os navios estavam a precisar de grandes reparações, tanto no casco como no aparelho. Pior que tudo, havia grandes dissensões entre Albuquerque e os seus capitães.

Mas Afonso de Albuquerque era um actor consumado e um mestre na arte da guerra psicológica. Apesar de ter os navios e as guarnições a cair aos bocados e de os seus capitães estarem à beira da rebelião, comportou-se como se dispusesse da maior e mais bem equipada armada do mundo e acabou por convencer disso os seus adversários, criando neles um complexo de inferioridade e de receio. Uma hora depois de ter fundeado, como não tivesse aparecido ninguém a cumprimentos, Albuquerque mandou recado à maior nau que estava no porto, junto da qual tinha largado ferro, para que o seu capitão viesse imediatamente a bordo, caso contrário a meteria no fundo!

Tratava-se de uma nau enorme, pertencente ao rei de Cambaia, que tinha a bordo perto de mil homens entre marinheiros e soldados. Pois o que aconteceu é que, perante o ultímatum de Afonso de Albuquerque, o seu capitão acobardou-se e foi-se apresentar imediatamente no navio daquele. Para o receber, Albuquerque montou uma encenação grandiosa, aparecendo ricamente vestido, rodeado de fidalgos e homens de armas cobertos com armaduras reluzentes e empunhando lanças e espadas, no meio de bandeiras, colgaduras e almofadas de seda, à mistura com pelouros, bestas e machados de abordagem.
Aproveitando o efeito produzido por todo este aparato, explicou amavelmente ao capitão da nau de Cambaia que ele, capitão-mor daquela esquadra, tinha vindo por mandado de el-rei D. Manuel de Portugal apenas para tomar Ormuz sob a sua protecção e autorizar todos os navios que navegavam por aqueles mares que o continuassem a fazer livremente desde que, evidentemente, o reconhecessem por soberano e senhor. Pediu-lhe que levasse o recado a Cogeatar e que lhe dissesse mais o seguinte: que, no caso de estar disposto a aceitar tão generosa oferta, se devia apresentar no dia seguinte naquela mesma nau para assentar pormenores; caso contrário, que teria muita pena, mas que se veria obrigado a queimar todas as naus que estavam no porto e a tomar Ormuz pela força das armas como havia feito com as cidades da costa de Omã que lhe tinham resistido. E acrescentou, à laia de confidência, que a si tanto lhe fazia, mas até que preferia que Cogeatar recusasse porque ele próprio, assim como os fidalgos e soldados que ali via, já estavam com saudades de um bom combate!

Ao receber a mensagem de Albuquerque, Cogeatar pensou que ele devia ser doido para se atrever a desafiá-lo, apenas com seis pequenas naus metidas no meio de sessenta muito maiores e bem guarnecidas de gente de armas. Mas o capitão da grande nau do rei de Cambaia aconselhou-o a que tivesse cautela. O capitão português o os fidalgos e soldados que estavam com ele pareciam gente muito perigosa. Que se lembrasse do que tinha acontecido às cidades da costa de Omã!
Cogeatar era um político hábil e prudente. Por isso não se precipitou. Foi consumindo todo o dia 26 com respostas evasivas e dilatórias, procurando ganhar tempo, para que a sua armada de terradas pudesse chegar a Ormuz, o que veio a acontecer nessa mesma noite.

Notando que a coberto da escuridão as naus que estavam mais perto dos navios portugueses mudavam de posição e ouvindo o rumor provocado pelo intenso movimento dos batéis que traziam reforços de armas e soldados, Afonso de Albuquerque compreendeu que Cogeatar não se assustara suficientemente e decidira combater.

Ao amanhecer do dia 27, os portugueses puderam constatar que as naus inimigas tinham ido fundear mais junto à praia, muito próximas umas das outras, tendo a maior parte delas os costados protegidos com arrombadas feitas com sacos de algodão. Em algumas, já as guarnições estavam tocando trombetas, fazendo grande alarido e agitando as armas. Detrás das naus, saiam em grupos compactos as terradas de Ormuz que vinham tomar posição pelo outro bordo dos nossos navios, de modo a cercá-los completamente. Ao longo da praia viam-se muitos esquadrões formados e alguns baluartes com artilharia.
Afonso de Albuquerque não perdeu tempo. Como o vento era muito fraco, ordenou aos batéis que tomassem as suas naus a reboque e foi fundear a curta distância da grande nau do rei de Cambaia e das outras naus que lhe pareceu serem as principais da armada inimiga. E, sem mais detença, abriu fogo! O inimigo respondeude imediato, travando-se um furioso duelo de artilharia, acompanhado por contínuas descargas das espingardas e arremessos de flechas, tudo isso no meio de um barulho ensurdecedor e de uma densa fumarada que o vento, por ser muito fraco, não conseguia dissipar.

Aproveitando o empenhamento dos portugueses no combate com as naus e as nuvens de fumo que, em parte, cobriam os seus movimentos, as terradas de Ormuz atacaram várias vezes pelo bordo contrário. Começaram então as nossas naus a experimentar algumas dificuldades, pois tinham pouca gente e viam-se obrigadas a sustentar o combate de artilharia com as naus adversas por um bordo e, ao mesmo tempo, repelir os ataques das terradas pelo outro. Porém, como estas, devido ao seu número, eram forçadas a avançar em massas compactas, ofereciam um alvo ideal aos nossos bombardeiros, que não perdiam um tiro. Depois de algumas delas terem sido afundadas e outras terem sofrido avarias graves e terem tido muitos mortos e feridos, desistiram dos seus ataques e regressaram à praia.

Andava ali Cogeatar, num batel, providenciando o envio de reforços para as naus que estavam sofrendo mais baixas. Ao ver aparecer as terradas, recompletou as suas guarnições e tornou-as a mandar ao ataque das naus portuguesas. Elas assim o fizeram mas, de novo, sem qualquer êxito. Nos dois ataques perderam as terradas de Ormuz quinze a vinte unidades afundadas e muitas mais gravemente avariadas.

Entretanto, prosseguia o combate de artilharia com nítida vantagem para os portugueses, cujos canhões de bronze eram muito mais potentes que os canhões de ferro dos adversários. Das naus que estavam sendo alvejadas pelos nossos navios, duas já tinham sido afundadas e as restantes, tinham o convés juncado de mortos e feridos. Vendo a sorte que as naus mais poderosas tinham tido, muitas outras começaram a aproximar-se ainda mais da praia para onde as suas guarnições fugiam a nado antes que as nossas naus se aproximassem delas.

Albuquerque tinha dado ordens rigorosas aos seus capitães para que ninguém se lançasse à abordagem antes de ele pr6prio o fazer, pois que, dada a superioridade numérica do inimigo, pensava ser mais prudente desgastá-lo e desmoralizá-lo primeiro com o fogo da artilharia. Porém, quando verificou que a maioria das naus inimigas já não respondia ao fogo das nossas e que as suas guarnições começavam a debandar, deu o sinal de abordagem, pelo qual os fidalgos esperavam ansiosamente, mandando o batel da sua nau aferrar a nau do rei de Cambaia.

A tomada desta nau não foi fácil. Por um lado, a altura do seu costado tornava muito difícil a escalada dos portugueses carregados de armas; por outro, ainda havia nela muitos soldados aguerridos que durante o combate de artilharia tinham permanecido abrigados nos pavimentos inferiores e que agora surgiam no convés dispostos a repelir os nossos. Travou-se então um violento combate à arma branca, em que, mais uma vez, o maior valor, a maior experiência e as armaduras e capacetes dos portugueses acabaram por levar a melhor. Logo que os capitães dos persas foram mortos, os soldados lançaram-se à água.
Uma outra grande nau, pertencente à cidade de Fartaque, ofereceu denodada resistência ao assalto dos nossos batéis, mas acabou por ser igualmente dominada. Cerca de vinte naus foram capturadas praticamente sem oposição.
Desbaratadas as naus que se encontravam mais longe da praia, os batéis começaram a perseguir às lançadas os numerosos soldados e marinheiros inimigos que a nado tentavam chegar a terra. Foi uma verdadeira carnificina, em que foram mortos mais de um milhar de homens, perante o olhar horrorizado dos habitantes da cidade que seguiam com ansiedade todas as peripécias da batalha.

Por sobre as águas tintas de sangue dirigiram-se então os batéis portugueses para as naus que tinham ido fundear junto da praia e lançaram-lhes fogo, ao mesmo tempo que lhes cortavam as amarras. Arrastadas pela brisa, cerca de trinta naus, ardendo como archotes, foram descaindo lentamente para a costa da Pérsia, onde se acabaram de consumir.
Afonso de Albuquerque, que se mudara para um batel, andava de um lado para o outro, procurando coordenar as acções dos seus homens. Ao passar perto da praia, Cogeatar mandou atirar-lhe com um canhão de um dos baluartes. Mas o tiro falhou. Respondeu-lhe imediatamente o «berço» do batel, que acertou em cheio no palanque donde o rei de Ormuz estava assistindo ao combate. Aterrorizado, o rei fugiu para a cidade. Cogeatar, vendo que os nossos batéis punham as proas em terra, receou que os portugueses fossem acometer a cidade e deu ordem às tropas que estavam na praia para se recolherem a ela. Isso permitiu aos nossos desembarcar à vontade e tomar de assalto uma pequena povoação que havia no extremo da ribeira onde alguns soldados de Ormuz se tinham entricheirado numa mesquita. Seguidamente, começaram a queimar as naus, perto de uma centena, que estavam em reparação ou em construção na ribeira. Se essas naus fossem queimadas, seria a ruína completa da cidade de Ormuz, cuja prosperidade se devia exclusivamente ao comércio marítimo. Por isso Cogeatar apressou-se a pedir a paz, enviando um «mouro» com uma bandeira branca a Afonso de Albuquerque. Em altos gritos, increpava aquele os soldados portugueses para que cessassem de queimar as naus... que pertenciam ao rei de Portugal!

Albuquerque aceitou a rendição a troco do pagamento de um pesado tributo anual e da autorização para construir uma grande fortaleza na ponta norte da ilha, destinada a assegurar em definitivo o domínio do Golfo Pérsico e regiões circundantes pelos Portugueses.

Na batalha naval de Ormuz perderam os Ormuzinos cerca de oitenta naus, entre as que foram afundadas, queimadas no mar ou em terra, ou capturadas bem como cerca de trinta terradas afundadas ou capturadas e cerca de três mil mortos além de muitos mais feridos. Do lado português houve apenas onze feridos, entre os quais alguns graves.
Terminada a batalha os soldados portugueses puderam verificar que muitos dos inimigos mortos tinham flechas espetadas no corpo, arma que os portugueses não usavam. Supomos que terão sido flechas disparadas pelas terradas que, passando por cima das naus portuguesas, terão ido atingir as guarnições das naus de Ormuz que estavam do lado contrário. A versão que correu entre os nossos para explicar o facto foi que Deus tinha enviado os anjos, armados com arcos e flechas, para combater a seu lado!
Poucos dias depois, Albuquerque deu início à construção da fortaleza. Mas, algumas semanas mais tarde, teve de desistir e abandonar Ormuz, por três dos seus capitães terem desertado para a Índia com as suas naus. Tentou no ano seguinte (1508) recuperar a cidade, dispondo apenas de quatro navios, mas também não o conseguiu. Parecia então que a grande vitória que alcançara em 27 de Setembro de 1507 não servira para nada.

Mas não foi isso que aconteceu. A fama que nela alcançara perdurou. E, quando no Outono de 1515 ali voltou, aureolado pelas conquistas de Goa e de Malaca, Ormuz entregou-se sem a menor resistência, declarando que nunca deixara de ser vassala do rei de Portugal.

Saturnino Monteiro
em «Batalhas e Combates da Marinha Portuguesa» (Vol.I)

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Mensagem por Lusitano89 21st abril 2011, 18:35

A Carreira da Índia e a vida a bordo das Naus


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Com a chegada de Vasco da Gama à Índia, em 1498, os portugueses passaram a ter o caminho aberto para a navegação entre a Europa e o continente asiático. A ligação entre Lisboa e a costa indiana, sobretudo Goa, era um aspecto fundamental para a expansão portuguesa no Oriente, obrigando à criação de uma rota permanente de comunicação. Assim se criou a chamada “carreira da Índia”, que mais não era do que a ligação permanente, através da melhor rota conhecida, entre aqueles dois portos. A viagem entre Lisboa e Goa era um empreendimento arriscado, longo e difícil, percorrendo uma longa distância através do Atlântico, a passagem do Cabo da Boa Esperança e o rumo á costa indiana; era, no entanto, uma prova por que passavam todos aqueles que se destinavam ao Oriente, ou que de lá regressavam, soldados, fidalgos, missionários ou mercadores.

A viagem de Lisboa à Índia era uma aventura perigosa. Os pilotos portugueses conheciam melhor do que ninguém as diversas etapas da viagem, o seu tempo de duração, os seus pontos difíceis e os seus riscos. A viagem era feita, na sua maior parte, sem haver vista de terra. Por um lado, tal era a prova evidente dos profundos conhecimentos náuticos dos pilotos portugueses, da sua prática de navegação, mas levava frequentemente a situações de perigo iminente. No navio, invariavelmente uma nau, viajavam várias centenas de pessoas, dispostas a partilhar naquele navio um espaço de tempo que rondava, na melhor das hipóteses, os seis meses. Em cada viagem havia um calendário que tinha que ser escrupulosamente cumprido, quer na ida, quer na volta, de forma a tomar os ventos favoráveis e as melhores condições naturais. Um atraso, quer á partida, quer no decorrer da viagem podia obrigar o navio a fazer escala e a atrasar-se vários meses, se se perdesse a monção, ou seja, o vento adequado que sopra nesse sentido apenas durante metade do ano.

No decorrer de uma viagem, vários eram os perigos que espreitavam. Os que mais preocupavam os pilotos eram as condições naturais. Eram frequentes as tempestades, sobretudo no Atlântico, que podiam tanto afundar o navio como afastá-lo da sua rota, não permitindo regressar ao rumo certo na brevidade necessária e comprometer assim toda a viagem. A passagem do cabo da Boa Esperança era o ponto mais crítico de toda a jornada, a manobra mais temida: a turbulência atmosférica nessa região era especialmente severa, a existência de recifes um risco real. Se os ventos fortes eram um perigo, a falta de vento era igualmente temida: é o que se chamava na época “calmaria”. Sem vento, com um calor sufocante, os navios paravam, os alimentos degradavam-se mais rapidamente, surgiam as epidemias, a moral a bordo decaía rapidamente, dando lugar ao desalento, á angústia e ao pânico. As calmarias existiam geralmente á latitude do equador, no Atlântico, podendo arrastar-se durante vários dias, como aconteceu á nau Santiago, que partiu de Lisboa rumo á Índia em 1585:

Continuando o caminho com bom vento entraram na costa da Guiné, e nas calmarias daquela paragem, tão celebrada dos marinheiros da Índia, gastaram 17 dias, passando a Linha a 27 de Maio, de calma tão enfadonha e tão ardente, que as do Alentejo ficam como frios da Noruega em comparação daquela paragem

Um dos problemas que afligiam todos os que viajavam a bordo era a alimentação: os alimentos frescos estragavam-se em pouco tempo, pelo que a sua renovação era desejável mas nem sempre possível. A água potável degradava-se igualmente com grande rapidez. O seu preço a bordo dos navios aumentava constantemente, obrigando a um racionamento rigoroso. As escalas, em Cabo Verde, em Santa Helena ou em Moçambique eram, portanto, indispensáveis. Não era raro declararem-se epidemias a bordo, afectando uma boa parte das pessoas a bordo, resultado de má nutrição e condições de higiene deploráveis. O escorbuto, resultante da carência de vitamina C, era uma das doenças inevitáveis. A medicina da época, desconhecedora da causa da maior parte destas doenças, limitava-se geralmente a fazer sangrias, o que agravava ainda mais a condição dos doentes. Eis uma descrição, de 1560:

Iam a bordo 500 e tantas pessoas; não ficaram senão só 15 que não passassem por esta fúria de enfermidades e doenças gravíssimas, assim os homens do mar (…) como os mais fidalgos, soldados, mulheres e meninos. E veio a coisa a tanto, que houve muitos dias juntos 350 doentes, e dia em que se davam 70 e 80 sangrias, e sangravam por meu mandado o barbeiro da nau, o piloto e o sota-piloto, e um grumete que o fazia muito bem. E deram-se por todas 1130 e tantas sangrias

Um dos aspectos mais interessantes destas viagens refere-se á religiosidade e superstição a bordo, que crescia á medida que a jornada avançava e que os perigos se sucediam. A bordo viajavam invariavelmente clérigos, geralmente missionários de várias ordens religiosas, a caminho ou de regresso da Índia. Abandonados no meio do oceano, confrontando-se com forças poderosas que não compreendiam nem conheciam, em risco permanente de naufrágio ou de epidemia, os homens agarravam-se ás suas convicções religiosas. As viagens são assim momentos de grande fervor religioso. Sucediam-se as preces, as orações e mesmo as procissões a bordo, pedindo protecção divina contra uma tempestade que se avizinhava ou agradecendo o bom rumo seguido ou o vento favorável encontrado. Aliás, considerava-se que as adversidades mais não eram do que castigos pelos pecados cometidos por cada um, pelo que o estado de pureza espiritual era avidamente procurado, multiplicando-se as confissões e os actos religiosos.

Alguns perigos que os navios portugueses enfrentavam eram, no entanto, bem terrenos. Referimo-nos aqui aos navios de piratas ou corsários que frequentemente infestavam as águas do Atlântico. Até ao final do século XVI, o risco era ainda menor, embora presente. Basta relembrar o episódio de Fernão Mendes Pinto, que á partida para a Índia foi atacado por uma navio de piratas franceses logo junto a Sesimbra, sendo despojado dos seus bens e lançado em terra. A partir da década de 1580 o problema agravou-se: Filipe II torna-se rei de Portugal, pelo que os ingleses e holandeses, inimigos dos espanhóis, passam a atacar também os navios portugueses, sujeitos então a depredações constantes. No fim do século, ingleses e holandeses passam o Cabo da Boa Esperança e chegam ao Oriente, procurando estabelecer também posições no Índico. Assim, a guerra de pirataria e corso do atlântico alargou-se igualmente ao Oriente, sujeitando a navegação portuguesa a uma pressão terrível. A guerra naval passou, então, a juntar-se aos perigos das viagens para a Índia, agravando com outros riscos as condições de vida a bordo.

Carreira da Índia

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Mensagem por Fundador 21st maio 2011, 22:39

A Chegada às Molucas, China e ao Japão

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Em 1510 Afonso de Albuquerque conquistou Goa, na Índia e pouco depois, em 1511, Malaca, na Malásia. Simultaneamente investiu esforços diplomáticos com os mercadores do sudeste asiático, como os chineses, na esperança de que estes fizessem eco das boas relações com os portugueses. Conhecendo as ambições siamesas sobre Malaca, imediatamente enviou Duarte Fernandes em missão diplomática ao Reino do Sião (actual Tailândia), onde foi o primeiro europeu a chegar viajando num junco chinês que retornava à China, estabelecendo relações amigáveis entre os reinos de Portugal e do Sião.

Ainda em Novembro desse ano, ao tomar conhecimento da localização secreta das chamadas "ilhas das especiarias", ordenou a partida dos primeiros navios portugueses para o sudeste asiático, comandado pelo seu homens de confiança António de Abreu e por Francisco Serrão, guiados por pilotos malaios. Estes são os primeiros europeus a chegar às Ilhas Banda nas Molucas. A nau de Serrão encalhou próximo a Ceram e o sultão de Ternate, Abu Lais, entrevendo uma oportunidade de aliar-se com uma poderosa nação estrangeira, trouxe os tripulantes para Ternate em 1512. A partir de então os portugueses foram autorizados a erguer uma fortificação-feitoria na ilha, na passagem para o oceano Pacífico: o Forte de São João Baptista de Ternate.

Em 1513, partindo de Malaca (actual Malásia) Jorge Álvares atinge o Sul da China. A esta visita seguiu-se o estabelecimento de algumas feitorias portuguesas na província de Cantão, onde mais tarde se viria a estabelecer o entreposto de Macau. De acordo com os registos disponíveis, foi o primeiro europeu a alcançar e visitar o território que actualmente é Hong Kong.

Em 1543, Francisco Zeimoto, António Mota e António Peixoto são os primeiros portugueses a atingir o Japão. Terão aportado ao Japão a 23 de Setembro, tendo sido este primeiro contacto de europeus com o Japão, relatado pelo cronista Fernão Mendes Pinto. Segundo este, a ilha de Tanegashima teria sido o primeiro lugar visitado pelos portugueses, que espantaram os autóctones não só com o relato de terras e costumes que tinham visto como com a novidade das armas de fogo, visto que o conhecimento da pirobalística ainda não tinha chegado ao Japão. A chegada dos portugueses deu origem ao período de comércio Nanban (sendo Naban-jin, a denominação que atribuiam aos bárbaros do sul), durante o qual uma intensa interação com os poderes europeus ocorreu tanto a nível econômico como religioso.

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Mensagem por Lusitano89 26th maio 2011, 18:55

Batalha Naval de Diu - 3 de Fevereiro de 1509

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A notícia da morte de D. Lourenço na batalha de Chaul fulminou D. Francisco de Almeida como se um raio tivesse caído a seus pés. Durante alguns dias encerrou-se nos seus aposentos sem querer ver nem falar com ninguém. Depois, voltou à sua vida normal, como se nada tivesse acontecido. Mas, por detrás do seu semblante impassível, percebia-se que ardia como um vulcão prestes a explodir, o desejo de vingança. «Quem comeu o frangão, há-de comer o galo ou pagá-lo!», terá dito. No entanto, nesse ano já nada havia a fazer, uma vez que a «monção» estava prestes a chegar. Vinda esta, foi aproveitando o tempo para carenar, sucessivamente, todos os navios que estavam em Cochim e prepará-los com vista às operações planeadas para o fim desse ano.

Quando voltou o «bom tempo», a primeira coisa que o vice-rei fez foi mandar Pêro Barreto com uma armada de três naus, seis caravelas e duas galés bloquear Calecut, pois tinha informações de que o Samorim estava organizando uma armada para se ir juntar às de Mir-Hocem e de Meliqueaz. A verdade é que quando Pêro Barreto chegou a Calicut já os paraus do Samorim iam a caminho de Diu.
No Outono de 1508, graças a um feliz acaso, chegaram à Índia duas armadas do Reino: a desse ano e a do ano anterior, que invernara em Moçambique. Por isso, não havia falta de homens, de armas e de todos os outros apetrechos que eram necessários para equipar convenientemente os navios destinados a ir combater os Rumes.
Mas, antes de pensar na guerra era preciso tratar do negócio. E, até 20 de Novembro, D. Francisco de Almeida esteve retido em Cochim, superintendendo no carregamento das naus de torna-viagem. Nessa data seguiu para Cananor com nove naus, das quais duas eram de carga, e um bergantim. Despachadas as duas naus de carga para Lisboa, preparava-se o vice-rei para se ir juntar a Pêro Barreto quando aconteceu aquilo que ele mais temia: a 6 de Dezembro, Afonso de Albuquerque chegou a Cananor e requereu-lhe a entrega do governo da Índia!
D. Francisco de Almeida encontrava-se numa situação dramática de conflito. Sabia que não tinha qualquer motivo válido para desobedecer às ordens do Rei. Mas não se resignava a deixar a Índia sem ter vingado por suas próprias mãos a morte do filho. Por fim, o sentimento paternal prevaleceu sobre o sentimento de disciplina. Invocando razões fúteis, recusou-se terminantemente a entregar o governo antes de dar combate aos Rumes. Na sequência deste incidente, prelúdio de outros muito mais graves que haveriam de ter lugar depois da batalha, Afonso de Albuquerque seguiu para Cochim e D. Francisco de Almeida, a 12 de Dezembro, largou com destino a Calecut.

Junta a sua armada com a de Pêro Barreto e descontadas uma pequena nau e três caravelas que haviam de ficar no bloqueio de Calicut achou-se o Vice-Rei com os seguintes navios: cinco naus grandes, a Frol de la Mar, de João da Nova, em que ele próprio ia embarcado, a Belém, de Jorge de Melo Pereira, a Santo Espírito, de Nuno Vaz Pereira, a Taforea Grande, de Pêro Barreto de Magalhães, e a Rei Grande, de Francisco de Távora; quatro naus pequenas, a Taforea Pequena, de Garcia de Sousa, a Santo António, de Martim Coelho, a Rei Pequeno, de Manuel Teles Barreto, e a Andorinho, de D. António de Noronha; quatro caravelas redondas, capitaneadas, respectivamente, por António do Campo, Pêro Cão, Filipe Rodrigues e Rui Soares; as caravelas latinas de Álvaro Paçanha e Luís Preto; as galés de Paio Rodrigues de Sousa e Diogo Pires de Miranda; o bergantim de Simão Martins. Em conjunto, eram dezoito velas guarnecidas com cerca de mil e quinhentos portugueses e quatrocentos malabares de Cochim e Cananor.

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Rota para Diu

Naquele tempo era hábito dos capitães, antes de se lançarem numa operação de responsabilidade, empreenderem outra mais fácil com o triplo objectivo de adestrar os seus homens, fortalecer-lhes o moral e, se possível, amedrontar o inimigo. Ainda em Cananor, o assunto fora debatido entre D. Francisco de Almeida e os capitães dos navios. A hipótese de atacar Calicut fora posta de parte por ser demasiadamente arriscada. Em seu lugar, foi decidido atacar Baticala, cujo rei andava em guerra com Timoja, nosso vassalo. Mas, à chegada a esta cidade, soube-se que, afinal, aqueles já tinham feito as pazes. Depois de ter tocado em Onor para embarcar mantimentos fornecidos por Timoja, que aí tinha a sua base, a armada portuguesa dirigiu-se para a ilha de Angediva, a fim de refazer a aguada. Nessa ilha, D. Francisco de Almeida aproveitou a oportunidade para reunir novamente o conselho dos capitães, durante o qual foi discutido o plano a adoptar no caso de os Rumes serem encontrados no mar. De acordo com esse plano, caberia à Frol de la Mar, onde ia embarcado o vice-rei, abordar a nau de Mir-Hocem. Ficou também assente que se, entretanto, a armada dos Rumes não fosse encontrada, os portugueses atacariam Dabul.

A partir de Angediva, a viagem tornou-se muito morosa por causa de os ventos dominantes serem dos quadrantes do norte.
A 29 de Dezembro foi avistada Dabul e, no dia seguinte, a armada franqueou a barra e foi fundear junto da cidade, iniciando-se imediatamente o desembarque. A luta foi terrível, porque a cidade, ao contrário do que se supunha, estava guarnecida com mais de seis mil homens resolutos, solidamente entrincheirados em baluartes muito bem artilhados. Além disso, estavam no porto quatro grandes naus de Cambaia que também se bateram valentemente. Não obstante, a cidade e as naus foram tomadas, tendo o inimigo perdido na batalha para cima de mil e quinhentos homens. Dos portugueses, morreram dezasseis e ficaram feridos duzentos e vinte. D. Francisco de Almeida passou essa noite entrincheirado em terra e, no dia seguinte, autorizou o saque. Mas, pouco depois de ele ter começado, ao ver que os soldados se dispersavam perigosamente na vizinhança de um inimigo que ainda tinha muitas forças, mandou pôr fogo à cidade e reembarcou.

Ainda em Dabul recebeu D. Francisco uma carta de Meliqueaz propondo-lhe paz e amizade e outra dos cativos de Chaul, que aquele tinha em seu poder, dizendo-lhe que estavam sendo muito bem tratados. Tais manifestações de receio da parte do inimigo, logo a seguir à vitória alcançada em Dabul, fortaleceram consideravelmente o moral dos portugueses.
A 5 de Janeiro, a armada prosseguiu na sua viagem para norte. À passagem por Chaul foi exigido o pagamento das páreas ao capitão do Nizamaluco, senhor da cidade. Mas este não dispunha de momento do dinheiro necessário para isso, ficando combinado que as pagaria quando o Vice-Rei regressasse de Diu.~

De Chaul, a armada dirigiu-se para Maim, que fica na ilha de Salcete, próximo de Bombaim. Como a falta de mantimentos continuava a ser preocupante, as galés, de caminho, iam assaltando as povoações ribeirinhas na mira de os obter. Num desses assaltos, Paio de Sousa, capitão de uma delas, caiu numa emboscada e foi morto. A sua galé foi dada a Diogo Pires e a deste passou para um fidalgo chamado Diogo Mendes.

Dias depois esteve esta galé em risco de perder-se. Tendo abordado descuidadamente uma fusta de Diu que lhe pareceu fracamente guarnecia, Diogo Mendes viu-se de súbito confrontado com um grupo numeroso de turcos bem armados e resolutos, que se tinham escondido à sua aproximação, e que agora lhe invadiam o seu navio dispostos a tomarem-no. Afinal, os portugueses conseguiram recompor-se e todos os assaltantes foram mortos. Na fusta não foram encontrados mantimentos nem nada de valor, além de uma moça húngara de rara beleza que Diogo Mendes levou para a nau do vice-rei e que, mais tarde, viria a casar em Cochim com um fidalgo português.
Em Maim, foram finalmente conseguidos, por compra, os mantimentos de que a nossa armada tanto necessitava. Daí enviou D. Francisco de Almeida uma carta a Meliqueaz, que dizia assim:


«Eu o visorei digo a ti honrado Meliqueaz, capitão de Diu, e te faço saber que vou com meus cavaleiros a essa tua cidade, lançar a gente que se aí acolheram, depois que em Chaul pelejaram com minha gente, e mataram um homem que se chamava meu filho; e venho com esperança em Deus do Céu tomar deles vingança e de quem os ajudar; e se a eles não achar não me fugirá essa tua cidade, que me tudo pagará, e tu, pela boa ajuda que foste fazer a Chaul; o que tudo te faço saber porque estejas bem apercebido para quando eu chegar, que vou de caminho, e fico nesta ilha de Bombaim, como te dirá este que te esta carta leva».


Mas a travessia de Maim para Diu mostrou-se mais difícil do que parecia, devido aos ventos contrários. Não conseguindo avançar junto à costa, os pilotos aconselharam D. Francisco de Almeida a fazer-se ao mar. Porém, passados alguns dias, encontrando-se completamente perdidos, declararam que antes da «monção» já não era possível alcançar Diu, propondo o regresso a Cochim. Como se pode imaginar, D. Francisco ficou desesperado e mandou levar à sua presença os pilotos de algumas «naus de Meca» que tinham sido apresadas durante a viagem. Um deles declarou-se pronto a levar a armada a Diu se lhe fosse concedida a liberdade. Acedeu prontamente o Vice-Rei e, de acordo com as suas indicações e apesar do cepticismo dos pilotos portugueses, mandou rumar a sueste. Ao amanhecer do dia 2 de Fevereiro, Diu, em toda a sua opulência, estava à vista!

Vejamos agora o que acontecera, entretanto, no campo contrário. Após a batalha de Chaul, festejada pelos «mouros» como tendo sido uma grande vitória, Mir-Hocem e Meliqueaz haviam-se tornado heróis aos olhos de todos os muçulmanos da Índia. Porém, no seu íntimo, qualquer deles estava longe de partilhar da euforia dos seus correligionários. Logo a seguir à batalha Meliqueaz tinha enviado uma carta a D. Francisco de Almeida gabando a coragem de seu filho e dos companheiros e garantindo-lhe que os prisioneiros portugueses, que tinha em seu poder, seriam bem tratados, como realmente foram. No entanto, calculando acertadamente que isso não seria bastante para apaziguar a ira do Vice-Rei, tratara de fortalecer a sua armada juntando-lhe quatro naus bem artilhadas e guarnecidas, uma das quais de grandes dimensões, e mandara construir e equipar mais fustas. Por seu turno, Mir-Hocem, sentindo-se igualmente pouco seguro, não poupara esforços para recompor a sua armada dos estragos que havia sofrido em Chaul. No entanto, e apesar do auxílio financeiro que recebeu dos «mouros» de Diu, a sua situação não era brilhante. É certo que vira a sua frota aumentada com a chegada do galeão que tinha deixado para trás quando saíra do mar Vermelho; mas tinha falta de gente, já que dos mil e quinhentos homens com que largara de Suez, dois anos antes, só lhe restavam pouco mais de oitocentos. Para aumentar ainda mais as preocupações de Meliqueaz e de Mir-Hocem, a partir de Outubro começou a constar em Diu que, depois da «monção», tinham chegado a Cochim numerosas naus idas de Portugal, com muita gente de armas, o que era verdade. Daí que ambos tivessem concordado em adoptar a estratégia de conservar as suas armadas em Diu, abandonando a iniciativa aos portugueses.

Com a conquista de Dabul e a chegada da carta de D. Francisco de Almeida dissiparam-se todas as dúvidas, se é que ainda as havia. Meliqueaz e Mir-Hocem compreenderam que não tinham maneira de evitar uma batalha sem quartel com o Vice-Rei. O primeiro amaldiçoava a hora em que os Turcos se tinham lembrado de escolher Diu para base de operações; o segundo, sentindo que o seu parceiro não hesitaria em entregá-lo para salvar a cidade, só pensava em encontrar uma maneira airosa de se poder escapar para o mar Vermelho. A verdade é que D. Francisco de Almeida tinha conduzido a guerra psicológica como um verdadeiro mestre e, através dela, já tinha a batalha meio ganha antes de chegar a Diu.

Logo que constou que a armada portuguesa se encontrava próxima, Meliqueaz e Mir-Hocem reuniram-se para discutir a táctica a adoptar. O turco era de opinião de que deviam ir combater os portugueses ao largo para tirar partido da enorme superioridade numérica de que dispunham em navios de remo: seis galés e galeotas turcas, cerca de cinquenta fustas de Diu e outros tantos paraus de Calicut, todos eles muito bem artilhados e guarnecidos com gente experimentada e aguerrida. Mas Meliqueaz opôs-se categoricamente, pois bem sabia que se as coisas começassem a correr mal, o que lhe parecia ser o mais provável, Mir-Hocem não hesitaria em bater em retirada para o mar Vermelho, deixando-o sozinho a contas com o Vice-Rei. Por isso, insistiu para que combatessem fundeados, de modo a beneficiar do apoio da artilharia da fortaleza e do fortim do mar bem como de outra que tinha mandado colocar em terra, dando a entender claramente a Mir-Hocem que se saísse para o mar nem as suas fustas nem os paraus de Calicut o acompanhariam. Mas a astúcia de Meliqueaz não ficou por aqui. Com o pretexto de ser indispensável a sua presença numa guerra em que andava envolvido no continente, abandonou Diu, deixando a Mir-Hocem a espinhosa tarefa de, sozinho, fazer as honras da casa ao Vice-Rei! Porém, aquele não era homem para se deixar manobrar facilmente, como se verá adiante.

No dia 2 de Fevereiro, à tarde, quando a armada portuguesa fundeou a leste de Diu, Mir-Hocem mandou atacá-la pelos navios de remo, do que resultou um duelo de artilharia sem consequências, dado que foi travado a grande distância e que a ondulação dificultava as pontarias. Ao fim de algum tempo, os navios inimigos cessaram os seus ataques e foram fundear perto da costa, do lado de fora do baixo que separa o porto exterior do porto interior. Pouco depois, foram-se-lhes juntar as quatro naus de Diu, por ordem de Mir-Hocem. Teria este em mente sacrificar a armada de Meliqueaz para quebrar o ímpeto dos portugueses, antes de entrar em acção com os seus próprios navios, ou estaria pensando em, na manhã seguinte, vir também com estes para fora do baixo? Nunca se poderá saber! Embora ausente da cidade, Meliqueaz era mantido ao corrente de tudo quanto nela se estava a passar por meio de correios. Logo que soube que Mir-Hocem mandara a sua armada para fora do baixo, regressou a galope e ordenou que as suas naus e fustas, bem como os paraus de Calicut, voltassem para dentro. Deste modo, falharam as jogadas com que Meliqueaz e Mir-Hocem se tinham procurado enganar mutuamente. O primeiro viu-se obrigado a permanecer em Diu durante a batalha; o segundo viu-se impedido de utilizar a armada daquele como bode expiatório.

Nessa noite, D. Francisco de Almeida reuniu, pela última vez, o conselho dos capitães para assentar no plano táctico a utilizar no dia seguinte. Logo de início, os capitães, unanimemente, pediram a D. Francisco para desistir da ideia de ser o primeiro a abordar a nau de Mir-Hocem, insistindo para que permanecesse numa posição afastada dos combates de modo a poder dirigir a batalha no seu conjunto. D. Francisco de Almeida acedeu, ficando decidido que a Frol de la Mar não abordaria nenhuma das suas contrárias e que se limitaria, com o tiro da sua artilharia, a impedir que os navios de remo inimigos incomodassem as naus portuguesas encarregadas da abordagem. Será oportuno referir que o problema da posição que deveria ocupar o comandante em chefe de uma armada durante a batalha preocupou desde sempre os teóricos da guerra naval. Nos tempos mais recentes, a tese preponderante era a de que devia manter-se, fora da linha de batalha e a sotafogo dela. Pois foi, precisamente, esta a solução adoptada pelos portugueses na batalha de Diu e que tão bons frutos deu.

No conselho acima referido foi também feita aquilo a que hoje chamaríamos a distribuição dos alvos: as quatro naus grandes (além da Frol de la Mar) abordariam as quatro naus turcas; as quatro naus pequenas abordariam as quatro naus de Diu; duas caravelas redondas abordariam os dois galeões turcos; as outras duas abordariam onde lhes parecesse mais conveniente; uma das galés iria à frente das naus sondando o canal; a outra, possivelmente, terá tido ordem para se manter nas imediações deste, a fim de socorrer qualquer navio que porventura encalhasse; as duas caravelas latinas auxiliariam a Frol de la Mar na sua tarefa de barrar a passagem aos navios de remo inimigos; o bergantim manter-se-ia nas proximidades daquela para transmitir as ordens do Vice-Rei.

Apesar de tudo, o problema que naquele momento parecia mais difícil de resolver era o da passagem do porto exterior para o porto interior através do estreito canal que os liga. Felizmente, entre os cativos que a nossa armada levava encontrava-se um rapaz de dezoito anos que já tinha ido algumas vezes a Diu e que ensinou os enfiamentos da entrada aos pilotos portugueses.
Terminado o conselho e em consequência das decisões nele tornadas, a maior parte dos fidalgos e soldados da Frol de la Mar foram distribuídos pelas outras naus, sobretudo pelas que deviam ir na vanguarda. Até altas horas da noite os marinheiros e os carpinteiros estiveram reforçando as bordas dos navios com paveses e cobrindo-os com fortes redes de cairo, de malha apertada, enquanto os soldados aprontavam as armas e se confessavam e comungavam. Depois, fez-se o silêncio e cada um ficou a sós com a angústia que precede o dia das batalhas. No exterior dos navios, os vigias, de olhar atento, procuravam descortinar qualquer indício da aproximação do inimigo. Mas, nessa noite, nada mais aconteceu.
Ao amanhecer do dia 3 de Fevereiro, verificando que todos os navios inimigos continuavam metidos dentro do porto, D. Francisco de Almeida mandou entregar a cada um dos capitães dos navios a mensagem seguinte:

Senhor, os rumes já não hão-de sair pois hoje o não fizeram, e portanto com a lembrança na Paixão de Cristo, com a viração, a que farei o sinal, em que tereis boa vigia, lhe vamos dar a merenda; e sobretudo vos recomendo grande cuidado das regeiras, que deixareis por popa, para vos alardes a elas quando vos cumprir, porque isto mais releva sobre todas as coisas, para que vos aparteis de fogo, se os mouros em si o puserem para vos queimar, ou vos levarem à costa cortando suas amarras.

Pelas nove horas começou a soprar um nordeste bonançoso, que era o vento mais conveniente para a armada portuguesa. Mas D. Francisco de Almeida tinha ainda de esperar pela maré. Obrigado a fazer passar a sua armada por um canal relativamente estreito (150 m) e pouco profundo (5 m), não o faria, certamente, sem ser com a maré a encher, para ter possibilidade de safar qualquer navio que eventualmente encalhasse.
Entretanto, mandou novamente o bergantim distribuir pelos navios a relação das recompensas que seriam atribuídas, no caso de a vitória sorrir aos portugueses, como esperava. Dessa relação constavam, além dos prémios a atribuir aos capitães, soldados, marinheiros, bombardeiros, etc., as indemnizações a conceder aos feridos e às famílias dos mortos e a promessa de alforria para os escravos.

Finalmente, cerca das onze horas, estando reunidas as condições ideais de vento e maré, e tendo a sua gente fortemente motivada e ansiosa por entrar em acção, D. Francisco de Almeida mandou disparar uma bombarda, que era o sinal combinado para iniciar o ataque. Em todos os navios, as trombetas e os tambores atroaram os ares com os seus toques marciais, ao mesmo tempo que as guarnições davam vivas e faziam grande algazarra. Do lado contrário, as naus e os navios de remo responderam imediatamente da mesma forma. O grande momento chegara!

As naus portuguesas, que já tinham os ferros a pique, suspenderam e, largando traquetes e mezenas, dirigiram-se, pela ordem preestabelecida, para a entrada do canal, precedidas pela galé de Diogo Pires que ia continuamente sondando.
A primeira nau a entrar foi a Santo Espírito, de Nuno Vaz Pereira, uma nau velha, que fazia bastante água e que, por isso mesmo, fora colocada na dianteira, partindo do princípio que se poderia perder, uma vez que o primeiro navio a entrar seria aquele que correria maiores riscos. Efectivamente, logo que a Santo Espírito e a galé de Diogo Pires. entraram no canal de acesso ao porto interior começaram a ser alvejadas pela fortaleza, pelo fortim do mar e pelos navios de remo do inimigo, sofrendo qualquer delas pesadas baixas.

Tanto as naus turcas como as de Diu estavam também fortemente empavesadas e com os castelos e convés cobertos com fortes redes de cairo. Além disso, tinham os costados protegidos por arrombadas constituídas por sacos de algodão cobertos com peles de boi molhadas, por causa dos incêndios.

Momentos antes de abordar a nau de Mir-Hocem, a Santo Espírito disparou todos os seus canhões de BB contra a amura da nau turca que estava amarrada àquela por EB. O efeito desta salva, disparada a curtíssima distância com bombardas de grosso calibre, foi devastador, provocando um rombo na linha de água, através do qual esta começou a entrar em grande quantidade fazendo adornar a nau. Procurando contrabalançar o adornamento, a sua guarnição passou-se toda para o outro bordo. É certo que a nau se endireitou, mas a água que tinha embarcado correu também para esse bordo e fê-la virar, por entre as aclamações da guarnição da Santo Espírito! Tudo se passou tão rapidamente que poucos foram os turcos que conseguiram salvar-se de morrer afogados.

Entretanto, logo após o disparo da sua artilharia, a Santo Espírito, que calava mais que as naus turcas, tocou no fundo e ficou imobilizada a poucos metros de distância da nau de Mir-Hocem. Julgando este que os portugueses tinham estacado propositadamente naquela posição para meterem a sua nau no fundo com a artilharia como tinham feito à outra, alou-se pela amarra do ferro de BB e foi aferrar a nau de Nuno Vaz que, aliás, não desejava outra coisa. Logo que as duas naus se juntaram, os portugueses saltaram impetuosamente na contrária e em poucos minutos tomaram-lhe o castelo de vante e o convés. Porém, no momento em que parecia que a capitânia turca estava irremediavelmente perdida, um dos galeões, que tinha por BB, alou-se pela amarra do ferro de EB e veio abordar a Santo Espírito pelo bordo contrário àquele por que estava aferrada à nau de Mir-Hocem. Deste modo, ficou a nossa nau entalada entre dois navios turcos, vendo-se obrigada a combater simultaneamente com ambos. Em resultado disso, parte dos cavaleiros e soldados que estavam na nau de Mir-Hocem tiveram de regressar apressadamente à sua nau para a defender do ataque do galeão. Neste transe, Nuno Vaz Pereira foi gravemente ferido por uma flecha que lhe atravessou a garganta e teve de ser evacuado em braços. A partir desse momento, a guarnição da Santo Espírito viu-se forçada a adoptar uma atitude defensiva, limitando-se a repelir os sucessivos assaltos dos turcos por ambos os bordos.

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Situação provável das forças em confronto na véspera ao fim da tarde

A segunda nau a entrar devia ser a Belém, de Jorge de Melo Pereira. Mas levou muito tempo a suspender e, perante isso, Pêro Barreto, na Taforea Grande, passou-lhe à frente. E, transposto sem novidade o canal, dirigiu-se à nau turca que lhe estava destinada, a terceira, a qual aferrou por EB. Mas, como esta tinha também uma outra amarrada a si, Pêro Barreto e os seus companheiros tiveram que se haver, ao mesmo tempo, com as guarnições de duas naus, o que deu origem a que o combate se prolongasse. Enquanto isto se passava, Jorge de Melo estava furioso por ter sido ultrapassado e não se fartava de insultar o mestre! E, para tentar recuperar o atraso, logo que o ferro arrancou, mandou largar a vela grande, além do traquete e da mezena. O resultado foi que a nau ganhou velocidade e, antes que as velas pudessem ser de novo colhidas, ultrapassou todas as naus turcas e mesmo a grande nau de Diu, acabando por só conseguir abordar, por EB, o grupo de duas naus desta cidade que estavam a seguir! Deste modo ficou perdida para o combate com os turcos a melhor e mais bem guarnecida nau da nossa armada.

A quarta nau a entrar foi a Rei Grande, de Francisco de Távora. Na sua esteira ia a Frol de la Mar, de João da Nova, com o Vice-Rei. Vendo este o que se passara com a Belém e apercebendo-se que a Santo Espírito estava em dificuldades, é provável que tenha mandado ordem a Francisco de Távora, que o precedia, e a Garcia de Sousa, que o seguia, para irem abordar a nau de Mir-Hocem, o que ambos fizeram.

A chegada da Taforea Grande com gente fresca fez pender definitivamente o combate na capitânia turca a nosso favor. Embora continuassem a oferecer uma resistência desesperada, os seus ocupantes foram obrigados a abandonar o exterior e a refugiar-se nos pavimentos inferiores, onde acabaram por ser todos mortos ou feitos prisioneiros. Mir-Hocem, já ferido e vendo a nau perdida, passou-se para uma pequena embarcação que estava amarrada pela popa e, aproveitando a confusão da batalha, atravessou o canal sem que ninguém desse por ele e foi para a vila dos Rumes. Aí, montou a cavalo e fugiu a galope para Cambaia, com mais receio de Meliqueaz do que dos portugueses. Entretanto, a Taforea Pequena, de Garcia de Sousa, tinha também atracado a capitânia turca, ajudando a dominar os últimos focos de resistência que nela ainda havia.
A Frol de la Mar, logo que alcançou o porto interior, percorreu a curta distância a linha de batalha para que o Vice-Rei se pudesse inteirar da situação. À passagem pela última nau turca, ao começar a guinar para EB, disparou toda a sua artilharia de BB contra ela. Mais uma vez o efeito dos tiros de grosso calibre disparados à queima-roupa foi devastador. A nau turca sofreu um rombo na amura de EB, junto à linha de água, e começou a afundar-se. No entanto, é natural que a maior parte da sua guarnição se tenha salvo, ou por estar a combater contra Pêro Barreto na nau vizinha ou por ter tido tempo de se passar para ela antes de a sua nau ir ao fundo. Neste ponto não podemos deixar de pensar que o afundamento de duas naus turcas, cada uma delas com uma única salva de artilharia, veio dar razão ao condestável da nau de D. Lourenço de Almeida que na batalha de Chaul afirmara ser possível afundar a armada turca a tiro de canhão. Seja como for, o que parece certo é que os portugueses tinham aprendido a lição. Em Diu, todas as nossas naus que o puderam fazer, antes de abordar as contrárias, dispararam contra elas, à queima-roupa, toda a sua artilharia.

Prosseguindo o seu caminho, a Frol de la Mar foi fundear sensivelmente em frente das naus de Diu, a meio do canal, de modo a barrar a passagem aos navios de remo, que não cessavam de flagelar com pelouros e flechas as naus que iam entrando, embora com fracos resultados. A verdade é que a decisão de Meliqueaz de dar batalha no porto interior e não no porto exterior ou ao largo foi extremamente favorável para os portugueses, porquanto o principal factor de força do inimigo, ou seja, a sua superioridade esmagadora em navios de remo, ficou praticamente anulado. Num canal cuja largura mal chegava aos duzentos metros, só era possível às galés, galeotas, fustas ou paraus combater numa frente de, quando muito, doze unidades, que, mesmo assim, tinham de estar muito juntas, o que facilitava enormemente a acção dos nossos bombardeiros. Por outro lado, a grande quantidade de embarcações que tinham atrás de si embaraçava a manobra das que estavam mais directamente empenhadas em combate.

A partir do momento em que as naus portuguesas começaram a chegar ao porto interior, disparando continuamente as suas baterias de EB, os navios de remo adversários principiaram a sofrer muitas avarias e baixas e a ser empurrados inexoravelmente para dentro. Depois que a Frol de la Mar fundeou, os ataques dos navios de remo concentraram-se praticamente sobre ela, deixando todas as outras naus de ser incomodadas. Meio cegos e sufocados pelo fumo, os bombardeiros da nossa capitânia não tinham mãos a medir, disparando salva após salva sobre as galés, galeotas, fustas e paraus, dos quais mais de uma dezena foram afundados e muitos mais gravemente avariados. Depois da batalha calculou-se que, nessa tarde, as bombardas da Frol de la Mar teriam disparado para cima de mil e novecentos pelouros! Pela sua parte, as naus e navios de remo do inimigo não lhe ficaram atrás. Em alguns dos navios portugueses puderam contar-se, depois da batalha, mais de cinco mil flechas e centenas de pelouros!

Entretanto, chegara a Santo António, de Martim Coelho. Uma vez que Garcia de Sousa fora desviado para o ataque à nau de Mir-Hocem, coube-lhe o osso mais duro de roer: o ataque à grande nau de Diu. A dificuldade em abordar esta nau era que, além de ser muito alterosa, estava completamente fechada por cima com uma espécie de telhado de madeira, só podendo ser entrada pelas portinholas da artilharia. Mas isso não era fácil, não só por causa do tiro dos canhões mas também porque dos setecentos homens que a guarneciam a maior parte eram hábeis archeiros que lançavam continuamente nuvens de flechas sobre os assaltantes. Por mais que o tentassem, os portugueses não conseguiram entrar nela.

Depois da Santo António é possível que tenha entrado a Rei Pequeno, de Manuel Teles Barreto, que, logicamente, deverá ter ido abordar a terceira nau de Diu, onde, por certo, não terá encontrado grande resistência, uma vez que a maior parte da guarnição desta nau devia estar na vizinha a combater com a gente de Jorge de Melo Pereira.
A última nau a entrar terá sido, provavelmente, a Andorinho, de D.António de Noronha, que, obviamente, se terá dirigido para a última nau de Diu. Aproximando-se dela pela amura de EB, é provável que, momentos antes da abordagem, tenha também disparado uma salva de artilharia à queima-roupa, do que veio a resultar, pouco depois, o seu afundamento, não sendo possível saber-se se a abordagem chegou ou não a ter lugar, embora nos pareça mais provável que sim.
Depois das naus, entraram as caravelas redondas. A primeira foi a de António do Campo, que se dirigiu para o galeão turco que tinha abordado a nau de Nuno Vaz Pereira por EB. Aferrou-o e tomou-o sem dificuldade, dado que a maior parte da sua guarnição já tinha sido morta ou feita prisioneira na nau de Mir-Hocem.

Outro tanto não aconteceu com a caravela de Pêro Cão que entrou a seguir. Tendo abordado o segundo galeão turco que estava intacto, encontrou sérias dificuldades. Para complicar mais as coisas, a caravela, que tinha ficado mal aferrada, soltou-se e foi à deriva, somente com os grumetes e pajens que tinha a bordo, deixando Pêro Cão e os seus companheiros, que eram pouco mais de vinte, isolados no navio inimigo, a contas com perto de uma centena de turcos. Pouco depois, foi morto Pêro Cão, o que tornou a situação ainda mais crítica.

É natural que António do Campo, que estava ao lado, se tenha apercebido das dificuldades em que se encontrava a gente da outra caravela e que, largando o galeão que havia tomado, tenha ido prontamente em seu auxílio. Depois de uma luta renhida, o segundo galeão turco foi também tomado, enquanto o primeiro, abandonado, ia à deriva encalhar na praia.
A terceira caravela a entrar foi a de Filipe Rodrigues. Nesta altura já todas as naus turcas e de Diu estavam dominadas, bem como os dois galeões, à excepção da grande nau de Diu. Por isso, é natural que a tenha ido abordar, pelo bordo contrário àquele a que estava aferrada a Santo António. Por último entrou a caravela do comendador Rui Soares, seguida, provavelmente, pelas duas caravelas latinas e pela galé de Diogo Mendes. Logo que se aperceberam de que a batalha estava irremediavelmente perdida, os paraus de Calicut puseram-se em fuga, saindo para o mar pela outra entrada do canal que contorna a ilha de Diu. Por sua vez, as galés e galeotas turcas, bem como as fustas de Meliqueaz, começaram também a retrair-se.

Não tendo qualquer nau ou galeão que pudesse abordar, o comendador Rui Soares foi atrás dos navios de remo que batiam em retirada e, metendo-se no meio das duas galés turcas, aferrou ambas e tomou-as de assalto, o que lhe mereceu os maiores encómios do Vice-Rei.

Nesta altura já os nossos marinheiros e soldados se tinham metido nos batéis e andavam a matar à lançada os turcos e os «mouros» que a nado procuravam alcançar terra. Não obstante, a grande nau de Diu continuava a resistir.
Vendo isso, D. Francisco de Almeida mandou ordem a Garcia de Sousa, que era quem tinha a sua gente mais folgada, para ir dar uma ajuda a Martim Coelho e a Filipe Rodrigues. Mas, apesar de todas as tentativas feitas pelos três navios, não foi possível penetrar na nau. Então, Garcia de Sousa mandou afastar os navios e deu-lhes ordem para meterem no fundo a nau com a artilharia. Sob o matraquear contínuo dos pelouros, as arrombadas desfizeram-se, o costado abriu fendas e a nau começou a afundar-se lentamente. Só restava, com os batéis, exterminar os seus ocupantes que se lançavam à água.
A batalha terminara com uma estrondosa vitória dos Portugueses! Sem terem perdido um único navio, tinham afundado duas naus turcas e duas de Diu e capturado duas naus e dois galeões turcos, bem como duas naus de Diu, além de terem afundado diversas fustas e paraus, avariado gravemente muitos mais e capturado duas galés turcas. Dos portugueses morreram trinta e dois, entre eles os capitães de dois navios (Nuno Vaz Pereira e Pêro Cão) e ficaram feridos mais de trezentos. Dos oitocentos homens que guarneciam a armada turca apenas vinte e dois conseguiram escapar-se para terra. Todos os outros foram mortos ou feitos prisioneiros. Em conjunto, o inimigo terá tido para cima de três mil mortos e um número ainda maior de feridos.
Pelas cinco da tarde, tendo o vento rondado, provavelmente, para norte ou noroeste e começando a maré a vazar, D. Francisco de Almeida resolveu voltar com a armada para o porto exterior, atendendo a que a artilharia de terra continuava a flagelar os seus navios e que, por outro lado, receava ser atacado durante a noite pelas fustas ou com brulotes. Apesar de efectuada já durante o crepúsculo, a saída fez-se sem novidade. No porto interior foram deixadas apenas as galés e alguns batéis para impedir que os «mouros» fossem tirar coisas das naus que haviam sido tomadas. Uma vez fundeada a armada em segurança no porto exterior, as guarnições dos navios estiveram festejando ruidosamente a vitória até altas horas da noite, enquanto D. Francisco de Almeida percorria aqueles, um por um, abraçando os fidalgos e os soldados e confortando os feridos.

Ao outro dia de manhã, ainda o Sol não era nascido, aproximou-se da armada uma fusta com bandeira branca trazendo a rendição incondicional de Meliqueaz e com ela a entrega da cidade de Diu. Recebida a mensagem, D.Francisco de Almeida exigiu, como condição prévia para qualquer negociação, a entrega imediata dos prisioneiros de Chaul. Uma hora depois, os prisioneiros davam entrada na sua nau, ao som das trombetas e dos tambores, e, com lágrimas de alegria a escorrerem-lhes pelas faces, caiam nos braços dos seus companheiros. Vinham vestidos de seda e cada um deles trazia cinquenta xerafins de ouro que Meliqueaz lhes mandara dar!

A conclusão de um tratado de paz (que foi escrito numa folha de ouro) não ofereceu qualquer dificuldade. D. Francisco de Almeida declinou o oferecimento da cidade de Diu que, no seu entender, seria muito custosa de manter, limitando-se a deixar nela uma feitoria. Exigiu a entrega das quatro galeotas de Mir-Hocem, dos turcos que tinham conseguido fugir para terra e da artilharia das naus afundadas, além de uma indemnização de trezentos mil xerafins a pagar pelos comerciantes «mouros» que tinham financiado o reequipamento da armada dos Rumes, dos quais cem mil foram distribuídos pelas guarnições dos nossos navios.

Meliqueaz aceitou tudo, conseguindo, no entanto, substituir a entrega dos turcos pela sua expulsão dos seus domínios. Tendo conseguido evitar aquilo que mais temia, que era o saque e o incêndio da cidade, estava satisfeitíssimo e cumulava os portugueses de gentilezas. Raro era o dia em que não enviava à nossa armada uma fusta carregada com carneiros, galinhas, ovos, laranjas, limões, hortaliças, etc. Aos fidalgos, oferecia ricos presentes. Mas D. Francisco de Almeida nada aceitou para si, nem mesmo um colar de pérolas e uma peça de brocado que Meliqueaz lhe deu para sua filha e que ele enviou para a Raínha.
Em troca dos favores de Meliqueaz, foram-lhe devolvidas as duas naus que lhe haviam sido tomadas na batalha. Os galeões turcos é provável que tivessem sido vendidos, sendo o produto da venda distribuído pelas guarnições dos nossos navios. As duas naus terão ficado em Diu a carregar mantimentos com destino a Cochim. As quatro galeotas foram queimadas. As duas galés capturadas pelo comendador Rui Soares é natural que tenham sido levadas para Cochim como troféus.
Entre os despojos da batalha figuravam três bandeiras reais do sultão do Cairo, que foram mandadas para Portugal e ficaram expostas no convento de Cristo, em Tomar.

Em relação aos cativos turcos, D. Francisco de Almeida foi inclemente, mandando enforcar, queimar vivos ou despedaçar amarrando-os à boca das bombardas a maior parte deles.
Vingada a morte de seu filho, arrumados os assuntos de Diu e despachadas duas naus com mantimentos para Socotorá, D. Francisco de Almeida, a 12 de Fevereiro, iniciou com o resto da armada o regresso triunfal a Cochim.
A batalha de Diu, apesar de ensombrada pelo tratamento cruel dado por D. Francisco de Almeida aos prisioneiros turcos, é, indubitavelmente, a mais importante de toda a História da Marinha Portuguesa e uma das mais importantes da História Naval Universal.

Sob o ponto de vista táctico, foi uma batalha de aniquilamento que só encontra paralelo em Lepanto (1571), Aboukir (1798), Trafalgar (1805) ou Tsuchima (1905). Sob o ponto de vista estratégico, não terá sido menos importante do que qualquer destas, antes pelo contrário, porquanto: assegurou aos Portugueses, durante quase um século, o domínio absoluto do oceano Índico; abateu consideravelmente o poder e o prestígio dos Turcos, que eram então o terror da Europa; marca o início de um longo período de domínio da Ásia pelos Europeus, que só terminou com a entrada do Japão na Segunda Guerra Mundial.

Se os Portugueses não fossem um povo que pouca atenção presta à sua História Marítima é provável que sentissem, em relação à batalha naval de Diu, um sentimento semelhante ao que nutrem os Espanhóis por Lepanto, os Ingleses pelo Nilo (Aboukir) ou Trafalgar e os Japoneses por Tsuschima.


Saturnino Monteiro
em «Batalhas e Combates da Marinha Portuguesa» (Vol.I)



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Mensagem por Lusitano89 28th maio 2011, 18:17

Batalha do Estreito de Malaca - Janeiro de 1513


Corria o mês de Janeiro de 1513 quando apareceu inesperadamente diante de Malaca uma enorme armada de Javos constituída por dois juncos de grandes dimensões, cerca de cinquenta juncos mais pequenos e uma centena de lancharas e calaluzes (pequenos navios de remo semelhantes às fustas) em que iam embarcados para cima de dez mil homens. O comandante desta armada era Pateonuz, senhor de Japará, uma cidade da costa norte de Java, que desde há muito ambicionava tornar-se senhor de Malaca. Sabendo que nesta cidade, depois de ter sido conquistada pelos Portugueses, havia menos de quatrocentos homens, entre soldados, marinheiros e mercadores, logo tratara de reunir uma grande armada com que contava realizar o seu sonho.

Nessa altura estavam em Malaca dez naus, duas caravelas, duas galés, dois juncos de mercadores malaios e duas dezenas de lancharas do bendará de Malaca. Para reforçar as naus foram retirados da fortaleza vários canhões e cerca de cento e oitenta soldados, ficando aquela apenas com vinte quase todos doentes. O aprontamento dos navios demorou toda a noite.

Ao outro dia de manhã a armada portuguesa fez-se ao mar, sob o comando de Fernão Peres de Andrade, navegando ao encontro da armada de Pateonuz que, durante a noite, tinha descaído para sul. Nessa época a maioria dos capitães portugueses ainda não se habituara a combater em formatura. Avistado o inimigo, a única preocupação de cada um era ser o primeiro a chegar ao contacto. Neste caso essa honra coube a Jorge Botelho, cuja nau era o navio mais veleiro da armada. E logo se meteu pelo meio dos inimigos disparando furiosamente a artilharia e a espingardaria por ambos os bordos. Os outros seguiram-lhe o exemplo.

Os juncos malaios, copiados dos chineses, eram excelentes navios que em robustez e manobrabilidade em nada ficavam a dever aos navios europeus, antes pelo contrário. O seu ponto fraco era que praticamente não dispunham de artilharia, limitando-se ao lançamento de flechas antes da abordagem. Pelo contrário, as naus portuguesas, além dos canhões de médio calibre que disparavam através das portinholas do costado, dispunham de «berços», peças de pequeno calibre, de elevada cadência de tiro, montadas na amurada, de numerosas espingardas, de lanças de fogo e de panelas de pólvora (espécie de bombas incendiárias) que os marinheiros lançavam das vergas para dentro dos navios inimigos a fim de os incendiar.

Durou esta primeira fase da batalha o dia inteiro com os navios javos a tentarem repetidamente abordar os navios portugueses e estes a repelir as tentativas de abordagem com o disparo incessante dos seus canhões e das suas espingardas e com o lançamento de grande quantidade de artifícios de fogo sobre os que se aproximavam mais. Embora nenhum dos navios javos tenha sido afundado a maior parte ficaram muito destroçados e cheios de mortos e feridos. Vinda a noite, a armada portuguesa fundeou em frente de Malaca e a de Pateonuz mais a sul.

Considerando que os portugueses não tinham conseguido afundar nenhum dos navios javos e que numa segunda batalha a pólvora se lhes podia vir a faltar e serem tomados à abordagem, o capitão de Malaca ordenou a Fernão Peres de Andrade que devolvesse os soldados à fortaleza, que metesse os navios de remo num rio a sul da cidade e que com as naus e as caravelas seguisse para a Índia a fim de pedir socorros ao Vice-Rei. Mas Fernão Peres e os seus capitães não estiveram pelos ajustes. Ignoraram a ordem e, na manhã do dia seguinte, foram atacar a armada de Pateonuz que, alarmado com os estragos e baixas que os seus navios tinham sofrido estava em franca retirada para Java.

E teve lugar uma segunda fase da batalha que se desenrolou nos moldes da primeira com a diferença de que os navios portugueses se aproximaram mais dos contrários atacando-os com o fogo da artilharia a curtíssima distância e o lançamento de panelas de pólvora. Um após outro os navios javos iam sendo afundados a tiro de canhão ou incendiados. Começaram então as naus portuguesas a abordar os juncos mais avariados que iam ficando para trás, tomando grande número deles que depois de saqueados, eram queimados. Por fim só restava o junco de Pateonuz com outros cinco amarrados a ele e um junco grande também amarrado a outro mais pequeno. O segundo grupo foi tomado à abordagem nessa mesma tarde após um combate terrível. O primeiro grupo foi obrigado a desfazer-se durante a noite devido ao mau tempo que se levantou. Na manhã seguinte os cinco juncos mais pequenos que o compunham foram queimados ou metidos no fundo pela artilharia da nau do incansável Jorge Botelho. Só o grande junco de Pateonuz conseguiu escapar!

Esta foi uma das maiores batalhas travadas pela Marinha Portuguesa embora com consequências de ordem estratégica relativamente limitadas.

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Mensagem por Lusitano89 17th junho 2011, 12:07

Bintão - Novembro de 1526


Logo que recebeu a notícia de que fora designado para governador da Índia por motivo do falecimento de D. Henrique de Meneses, Pêro Mascarenhas, que era então capitão de Malaca, apressou-se a regressar a Cochim. Porém, não sendo ainda a época própria para fazer a viagem, apanhou um temporal tão violento que ficou com a nau desarvorada e foi obrigado a voltar a Malaca. Diz o Povo que «há males que vêm por bens». E foi o que aconteceu neste caso!

Pouco tempo antes, tinha chegado a Malaca a armada de Francisco de Sá que ia fazer uma fortaleza em Sunda e que estava aguardando a época própria para seguir para aquela região. Por isso, havia na cidade cerca de novecentos portugueses, o que era muito raro acontecer. Essa circunstância, aliada ao facto de não poder ir para a Índia antes do fim de Dezembro, fez nascer no espírito de Pêro Mascarenhas a ideia de ir destruir a cidade de Bintão e, de uma vez por todas, pôr termo a uma guerra que oprimia Malaca havia quinze anos.

Tendo em mente o que acontecera a Jorge de Albuquerque em 1521, começou a preparar minuciosamente a expedição, fazendo constar que se destinava à construção de uma fortaleza no estreito de Sunda (que fica entre Samatra e Java) e que era efectivamente a missão de que estava incumbida a armada de Francisco de Sá. E, a 23 de Outubro de 1526, largou de Malaca com uma armada que, pelas nossas contas, devia ser constituída por um galeão, uma nau, duas caravelas, duas navetas (naus pequenas), uma galé, duas galeotas, cinco fustas e dois batéis artilhados com «camelos» e protegidos com paveses e mantas. Nestes navios iriam embarcados perto de seiscentos portugueses, além de numerosos escravos e marinheiros malaios. Havia ainda mais quatro lancharas e cinco calaluzes, guarnecidos com quatrocentos malaios de Malaca, que acompanhavam a armada sob o comando de Tuão Mafamede, bendará da cidade.

Chegado a Bintão, Pêro Mascarenhas fundeou à entrada do canal que dava acesso à cidade e mandou imediatamente os catures efectuar um reconhecimento minucioso das posições inimigas. A principal defesa da ilha de Bintão era o facto de se encontrar quase completamente rodeada por grandes extensões de lodo que tornavam o acesso à cidade praticamente impossível, salvo por intermédio de um estreito e tortuoso canal. Nele tinha o rei de Bintão mandado construir numerosas estacadas que impediam a passagem de naus e de galés e obrigavam os navios de remo mais pequenos a andar às voltas. Numa ilhota existente à entrada do canal e numa ponta um pouco adiante, bem como no extremo ocidental da ilha, havia tranqueiras artilhadas, sobranceiras ao canal. A cidade propriamente dita estava rodeada por um fosso inçado de estacas envenenadas, por detrás do qual se erguia uma alta paliçada coroada por numerosas bombardas. Do outro lado do canal havia uma alta ponte fortificada. Finalmente, no centro da cidade, num pequeno outeiro, ficavam as casas do rei, metidas dentro de uma outra cerca com muita artilharia. Todas estas obras defensivas estavam guarnecidas com cerca de trinta mil homens. Varadas junto da cidade, havia ainda vinte lancharas, sobreviventes da batalha de Linga. No seu conjunto, as defesas de Bintão pareciam inexpugnáveis.

Para chegar à cidade, podiam os portugueses escolher entre duas linhas de acção. Uma delas consistia em deixar os navios grandes à entrada do canal e tentar o assalto só com os navios de remo mais pequenos, como fizera Jorge de Albuquerque em 1521; a outra consistia em arrancar as estacas e levar os navios grandes até junto da cidade para poder contar com o apoio da sua artilharia no assalto final. Dada a força do inimigo e o facto de ele se encontrar prevenido e devidamente preparado, Pêro Mascarenhas optou por esta segunda linha de acção, que, embora muito mais lenta e trabalhosa, era indubitavelmente mais segura.

Na manhã seguinte ao dia da chegada, quase no fim da enchente, o galeão e a nau, acompanhados dos dois batéis, aproximaram-se da ilhota situada à entrada do canal, onde o inimigo tinha construído uma tranqueira artilhada, e começaram a bombardeá-la com os «camelos», isto é, com os canhões de maior calibre, dos quais o galeão e a nau dispunham de seis e cada batel de um. Responderam os da tranqueira com «berços» e «falcões», peças de pequeno e médio calibre, prolongando-se o duelo de artilharia por cerca de uma hora. Mas os tiros dos «mouros» pouco efeito faziam nos nossos navios porque os batéis estavam protegidos pelas mantas e paveses e o galeão e a nau por arrombadas feitas com cabos grossos (uma espécie de grandes coxins) que levavam penduradas à borda e que eram mais do que suficientes para absorver o impacto dos pequenos pelouros lançados pelos «berços» e pelos «falcões». Pelo contrário, os pesados pelouros disparados pelos nossos «camelos» eram uma espécie de furacão de ferro que fustigava impiedosamente a tranqueira. Quebradas as paliçadas que sustentavam os parapeitos de terra, começou aquela a desfazer-se, ao mesmo tempo que as bombardas que nela se encontravam instaladas principiavam a voar pelo ar, acompanhadas pelos braços, pelas pernas e pelos corpos dos seus ocupantes. Não podendo suportar por mais tempo o fogo terrível dos navios portugueses, a guarnição da tranqueira fugiu a nado para a que se encontrava um pouco mais adiante. Imediatamente os nossos batéis abicaram à ilhota e recolheram as vinte bombardas que nela havia.

Eliminada assim a primeira tranqueira, passaram o galeão, a nau e os batéis à tranqueira seguinte dispostos a aplicar-lhe a mesma receita. Mas como a maré já estava muito baixa o galeão e a nau encalharam no lodo. Prevendo essa eventualidade, todos os navios de alto bordo levavam escoras que foram imediatamente colocadas para evitar que adornassem. No entanto, a colocação dessas escoras, debaixo do fogo da tranqueira, não se fez sem que alguns homens ficassem feridos. Ao outro dia, com a subida da maré, o galeão e a nau voltaram a flutuar e repetiu-se a cena do dia anterior. Esmagada pelo fogo da nossa artilharia, a segunda tranqueira ficou completamente destruída e teve de ser abandonada pela sua guarnição.

Começou então a parte mais árdua da empresa: desfazer as estacadas. As estacas eram feitas de uma madeira muito rija chamada pau-ferro, que não apodrecia dentro de água, e estavam encastradas em grandes pedras com o feitio de mós, profundamente enterradas no lodo. Para levantar as estacas, tinham sido montados no galeão, na nau e em uma das caravelas fortes gavietes (espécie de braços salientes com uma roldana na extremidade). Depois de abraçada uma estaca com um cabo de bitola (grossura) adequada, era este passado ao gaviete e daí ao cabrestante, onde era rondado até a estaca despegar do fundo. Com as mãos agarradas às barras dos cabrestantes e os pés fincados no convés, chusmas de soldados portugueses, escravos e marinheiros malaios, alagados em suor, faziam-nos rodar lentamente, dia após dia, na tarefa interminável de arrancar estacas. Era um trabalho extremamente fatigante e muito demorado, porque só podia ser feito com a maré cheia, dado que era necessário levar os navios à prumada das estacas. Em média, gastava-se cerca de meia hora para arrancar cada uma. E elas eram às centenas!

Iam já decorridos dez dias no penoso trabalho de desfazer as estacadas quando foram avistadas, vindas do lado do mar, cerca de trinta lancharas. Tratava-se de uma armada que o rei de Pão enviara em auxílio do seu aliado de Bintão, ao saber que estava sendo atacado pelos Portugueses, com muitos mantimentos e dois mil homens de reforço. Pêro Mascarenhas mandou imediatamente ao seu encontro as galeotas, as fustas, as lancharas e os calaluzes, que, graças ao seu pequeno calado, podiam passar por cima da zona baixa que fica a oeste da ilha de Bintão. Logo que os nossos navios tiveram o inimigo ao alcance de tiro principiaram a alvejá-lo com a artilharia. De principio, as lancharas de Pão ainda responderam animosamente. Mas, quando começaram a ser repetidamente atingidas e a sofrer estragos e baixas, desmoralizaram e, invertendo o rumo, puseram-se em fuga, perseguidas pelos navios portugueses. Numa tentativa desesperada para se salvarem, dezoito lancharas foram varar numa ilhota que havia um pouco adiante, fugindo as guarnições para terra. Indo em seu seguimento, os nossos navios tomaram-nas. As restantes, aproveitando o facto de os portugueses estarem entretidos com a captura daquelas, conseguiram escapar-se.

Regressando com as presas para junto da armada, foram os pequenos navios de remo recebidos com grandes manifestações de regozijo por parte das guarnições dos navios grandes para quem esta vitória constituiu uma espécie de tónico que as ajudou a suportar com estoicismo o ingrato trabalho de arrancar estacas que, entretanto, ia continuando. Porém, por cada dia que passava a tarefa ia-se tornando mais difícil. À medida que os nossos navios se aproximavam das tranqueiras instaladas no extremo da ilha, o tiro destas tornava-se mais incomodativo. Mas nada os fazia desistir. Como um mastim que já tem a presa filada pelo pescoço e por nada do mundo a larga, continuavam a avançar implacavelmente em direcção à cidade. Agora, de manhã até à noite, era quase continuo o ribombar dos canhões. Açoitadas pela fúria destruidora da nossa artilharia, as tranqueiras iam sendo sucessivamente destruídas, ao mesmo tempo que as estacadas eram arrancadas, uma após outra. Ao fim de mais doze dias de trabalhos de Hércules, tendo sido arrasada a última tranqueira e levantada a última estacada, a nossa armada foi fundear perto da ponte, em frente ao principal baluarte das fortificações que protegiam a cidade!

Nessa noite, os «mouros» ainda conseguiram cortar a amarra da caravela que estava mais próximo da ponte mas, antes que ela encalhasse na margem, a sua guarnição conseguiu aguentá-la com um outro ferro talingado (ligado) a uma corrente. Amedrontado com a forma como a campanha estava decorrendo, o rei de Bintão ordenou a Laqueximena que fizesse uma última surtida para tentar destruir os navios portugueses. Ao outro dia, ainda muito cedo, aproveitando a vazante, as lancharas de Bintão aproximaram-se sorrateiramente da caravela de Fernão Serrão e da galé, que eram os navios mais avançados da nossa armada, e atacaram-nos de surpresa. Tirando partido da sua superioridade numérica e da rapidez com que tudo se passou, os «mouros» conseguiram entrar em ambos os navios, pondo os portugueses que neles se encontravam em sérios apuros. Na galé, empurraram-nos até ao mastro; na caravela, obrigaram-nos a refugiar-se no castelo da popa. Logo que foi dado o alarme, os navios de remo tentaram acudir à caravela e à galé mas levaram muito tempo a fazê-lo por causa da força da corrente. Salvou a situação Pêro Mascarenhas, que, metendo-se numa pequena embarcação com vinte soldados, foi atacar as lancharas que tinham aferrado a galé, lançando-lhes para dentro algumas panelas de pólvora. Com esta ajuda a guarnição da galé recuperou o ânimo e conseguiu expulsar os inimigos que a tinham entrado. Mais algumas panelas de pólvora lançadas no momento exacto e as lancharas que tinham aferrado a caravela foram também obrigadas a afastar-se. Então, Pêro Mascarenhas, com os seus vinte companheiros, entrou nesta e em poucos minutos todos os «mouros» que a tinham invadido estavam estendidos no convés ou tinham saltado para a água!

Entretanto, tinham finalmente chegado os dois batéis com os seus temíveis «camelos». Amontoadas na sua frente estavam as vinte lancharas de Laqueximena que, por causa da corrente, tinham muita dificuldade em voltar para trás. Não podiam desejar os nossos bombardeiros melhor alvo. Foi uma autêntica carnificina! Trucidadas pelos pesados pelouros dos «camelos» as guarnições da maior parte das lancharas lançaram-se à água e fugiram a nado para terra, deixando treze nas nossas mãos. As restantes sete voltaram à ribeira de Bintão pejadas de mortos e feridos. Entre estes últimos contava-se o próprio Laqueximena.

Durante o combate conseguira fugir para os portugueses um moço malaio natural de Malaca que aconselhou Pêro Mascarenhas a desembarcar na margem norte do canal e a entrar na cidade através da ponte, por ser o lado menos bem defendido. Nessa mesma noite conseguiu também chegar junto dos nossos navios, caminhando pelo lodo e ainda com as grilhetas nos pés, um português cativo que conseguira igualmente fugir e que disse a Pêro Mascarenhas exactamente a mesma coisa que o moço de Malaca.

Baseado nestas informações pôde aquele elaborar o plano para o assalto final. Ao outro dia, de manhã, um corpo de cerca de uma centena de portugueses e de trezentos auxiliares malaios desembarcou a oeste do baluarte principal, sob a protecção da artilharia dos navios, e construiu uma tranqueira com pipas cheias de terra, onde foram instalados alguns «berços» e «falcões». Tal movimento fez crer aos «mouros» que o ataque iria ter lugar por aquele lado, levando-os a concentrar a maior parte das suas forças no baluarte fronteiro. Por volta da meia-noite, no mais absoluto silêncio, Pêro Mascarenhas meteu-se nas embarcações miúdas com trezentos portugueses, acompanhados por uma centena de escravos que lhes levavam as espingardas e as lanças, e foi desembarcar no banco de lodo que ficava a norte do canal! Depois, enterrados na vasa, por vezes até à cintura, os portugueses começaram a caminhar penosamente em direcção à costa, na mais completa escuridão, guiando-se apenas pelas sombras dos que iam adiante. Mas ninguém desfalecia, porque à frente de todos ia o próprio governador da Índia, exemplo vivo de coragem e determinação, ladeado pelo português e pelo moço malaio ex-cativos de Bintão que, melhor ou pior, lhe iam indicando o caminho. A parte mais difícil da travessia foi a faixa de mangal que se estendia junto à terra firme. Mas os portugueses lá se foram infiltrando por entre os ramos e as raízes escorregadias até que começaram a sentir terreno mais consistente debaixo dos pés.

Alcançada a terra firme, foi feita uma pausa para que os homens pudessem comer alguma coisa, recuperar as forças e armar-se convenientemente. E, logo que surgiram os primeiros alvores, a coluna retomou a marcha, sempre no mais absoluto silêncio, em direcção ao pequeno baluarte que defendia o topo norte da ponte. Não pensando que alguém pudesse chegar ali por aquele lado, a sua guarnição encontrava-se quase toda a dormir. E se alguns vigias havia, estavam certamente com a atenção fixada no que se passava do lado onde se encontrava fundeada a nossa armada. Subitamente, as panelas de pólvora começaram a estoirar dentro do baluarte, ao mesmo tempo que os portugueses rebentavam as portas e escalavam as paliçadas, surgindo de todos os lados com as lanças e as espadas em riste! Apanhados completamente de surpresa, os «mouros», após uma curta resistência, puseram-se em fuga.

Entretanto, logo que avistaram os clarões provocados pelo rebentamento das panelas de pólvora na outra margem, os navios abriram fogo com toda a sua artilharia sobre o baluarte principal, ao mesmo tempo que as tropas que estavam na nossa tranqueira tocavam as trombetas e faziam grande algazarra como se estivessem prestes a lançar-se ao assalto. Toda esta encenação continuou a desviar a atenção do inimigo para aquele lado. É certo que também ele via que alguma coisa se estava passando na outra margem. Mas pensava que se tratava de uma diversão sem importância de maior. Eis senão quando atrás de uma onda de fugitivos avança pela ponte em formação cerrada a coluna do Governador com a bandeira real à frente! Percebendo finalmente o logro em que haviam caído, a maior parte dos capitães que estavam no baluarte principal abandonaram-no e foram fazer frente aos portugueses que estavam desembocando da ponte. Mas, nesse instante, os que estavam na tranqueira arremeteram de rompante contra o baluarte e, aproveitando-se da confusão que ia nele, tomaram-no, começando a atacar pelas costas os que o haviam deixado! Em poucos minutos, as melhores tropas de Bintão, completamente desorientadas pela genial manobra de Pêro Mascarenhas, tresmalharam-se e puseram-se em fuga!

Não dando tempo ao inimigo para se recompor, o Governador reuniu todas as suas forças num só corpo e foi acometer o outeiro fortificado, que era o último reduto do rei de Bintão. Aqui a peleja foi mais áspera. Apesar do ardor com que os nossos combatiam, animados pelo exemplo de Pêro Mascarenhas que deitara fora a adarga (escudo) para ficar com os movimentos mais livres e esgrimia com uma lança, protegido apenas pela armadura, a mole imensa dos defensores ia consumindo, a pouco e pouco, as energias dos atacantes. Desta vez, foram os marinheiros que ajudaram a dominar a situação. Cheirando-lhes que o saque da cidade devia estar para breve, tinham deixado os navios e vindo para terra com as únicas armas que sabiam manejar: as panelas de pólvora! E, metendo-se pelo meio dos combatentes, começaram a lançá-las para cima dos «mouros». Os que ficaram queimados pelas chamas puseram-se em fuga e em breve o movimento de debandada propagou-se a todo o exército, tanto mais que o rei de Bintão fora o primeiro a dar o exemplo.

Ainda não eram dez horas da manhã quando a batalha terminou. O chão ficara juncado de cadáveres dos inimigos. Dos portugueses não morreu nenhum, embora muitos tivessem ficado feridos! Seguiu-se o saque da cidade, que foi muito rendoso, sobretudo porque nas casas do rei estavam acumuladas grandes riquezas. Nunca pensando que os portugueses pudessem chegar até ali, não as tinha mandado levar a tempo para um lugar mais seguro. Do despojo fizeram parte para cima de trezentas bombardas, muitas delas com as armas portuguesas. Pêro Mascarenhas mandou pôr fogo às fortificações, que arderam durante três dias. De igual modo foi queimado o que restava da armada de Laqueximena.

Com a ajuda das tropas do rei de Linga, que chegou poucos dias depois de a batalha ter terminado, com uma armada de dezoito lancharas e calaluzes para auxiliar os portugueses, foram feitas várias incursões ao outro lado do canal para tentar capturar o rei de Bintão. Mas este conseguiu escapar-se. Por fim, sentindo-se acossado, sem dinheiro e sem gente, resolveu fugir para a península Malaia, onde morreu alguns meses mais tarde.

Quando soube da derrota do rei de Bintão, apresentou-se a Pêro Mascarenhas o antigo senhor da ilha, a quem aquele tirara o reino, pedindo-lhe que o aceitasse como vassalo do rei de Portugal. Concedeu-lhe o Governador o que pretendia, com a condição de não construir fortificações nem ter armada.

Quinze dias após a conquista de Bintão e depois de ter despachado a armada de Francisco de Sá para Sunda, Pêro Mascarenhas regressou a Malaca, onde foi festivamente recebido. Pouco depois, tendo deixado por capitão da cidade Jorge Cabral, partiu para a Índia.

A conquista de Bintão é um dos feitos mais espectaculares da História Militar Portuguesa, constituindo um exemplo raríssimo daquilo a que se pode chamar a «batalha perfeita». Magistralmente planeada, tanto sob o ponto de vista estratégico como logístico, ela constituiu uma verdadeira obra-prima de execução táctica em que se fica sem saber o que mais admirar: se a coragem e a disciplina dos soldados, se a coragem e o talento do chefe. Em Bintão, Pêro Mascarenhas conseguiu aquilo que todos os generais pretendem e quase nenhum consegue: aniquilar completamente as forças inimigas e alcançar todos os objectivos estratégicos previamente fixados sem perder um único homem!

Contudo, a vitória de Bintão pouca atenção mereceu, mesmo aos contemporâneos. Malaca estava tão longe que era como se pertencesse a um outro planeta. Além disso, pouco rendimento dava à coroa portuguesa. As notícias do que se passava no Sueste Asiático levavam cerca de um ano a chegar a Cochim ou a Goa e dois a chegar a Lisboa. Daí que nas Histórias de Portugal raramente seja feita qualquer referência à estrondosa vitória alcançada em Bintão, em 1526.

Quanto a Pêro Mascarenhas, o prémio que recebeu pela conquista de Bintão foi... ser atacado à lançada, quando pretendeu desembarcar em Cochim, e ser metido a ferros, quando chegou a Goa!

A razão disso conta-se em poucas palavras. Por intrigas de Afonso Mexia, vedor da Fazenda Real e capitão de Cochim, D. João III, em 1526, mandou para a Índia novas vias de sucessão, para substituir as que Vasco da Gama levara, nas quais, levianamente, alterou a ordem daquelas, pondo Lopo Vaz de Sampaio à frente de Pêro Mascarenhas. A maior parte dos fidalgos era de opinião que havendo Governador não se justificava abrir as novas vias. Mas Afonso Mexia, apoiado por outros fidalgos, entendia que deviam ser abertas por exprimirem a vontade mais recente do Rei. E abriu mesmo a primeira via, na qual era nomeado Lopo Vaz de Sampaio para Governador da Índia na eventualidade do falecimento de D. Henrique de Meneses. A partir daí foi um nunca acabar de disputas, conflitos e rixas entre os partidários de Lopo Vaz de Sampaio e os de Pêro Mascarenhas.

Entretanto, D. João III, sabedor da morte de D. Henrique de Meneses e de que Pêro Mascarenhas havia sido nomeado Governador de acordo com as sucessões de Vasco da Gama, quis emendar a mão e mandou a toda a pressa um navio à Índia dando o seu acordo ao que fora feito. Mas, por infelicidade, esse navio naufragou na ilha de São Lourenço. Para tentar pôr cobro às desavenças entre os fidalgos da Índia, resolveram estes submeter o caso a uma comissão de arbitragem. Após um processo nem sempre límpido, a dita comissão julgou a favor de Lopo Vaz de Sampaio, pelo que Pêro Mascarenhas se viu forçado a regressar a Portugal na torna-viagem de 1528.

Afinal o Rei, que fora o causador de todo este «imbróglio», acabou por lhe dar razão, obrigando Lopo Vaz de Sampaio a entregar-lhe todos os ordenados que tinha recebido durante o tempo em que desempenhou o cargo de Governador da Índia, aliás, diga-se, com elevado mérito.
Para a História, Pêro Mascarenhas ficou como tendo sido 6º governador e Lopo Vaz de Sampaio o 7º, sem contar os dois vice-reis que os haviam precedido.

E com toda esta confusão ninguém mais se lembrou da grande vitória alcançada por Pêro Mascarenhas em Bintão, que restituiu Malaca ao seu antigo esplendor e fez com que os Portugueses voltassem a ser temidos e respeitados em todo o Sueste Asiático.

Saturnino Monteiro
em «Batalhas e Combates da Marinha Portuguesa»

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Mensagem por Lusitano89 20th junho 2011, 17:18

A Carreira da Índia e a vida a bordo das Naus


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Com a chegada de Vasco da Gama à Índia, em 1498, os portugueses passaram a ter o caminho aberto para a navegação entre a Europa e o continente asiático. A ligação entre Lisboa e a costa indiana, sobretudo Goa, era um aspecto fundamental para a expansão portuguesa no Oriente, obrigando à criação de uma rota permanente de comunicação. Assim se criou a chamada “carreira da Índia”, que mais não era do que a ligação permanente, através da melhor rota conhecida, entre aqueles dois portos. A viagem entre Lisboa e Goa era um empreendimento arriscado, longo e difícil, percorrendo uma longa distância através do Atlântico, a passagem do Cabo da Boa Esperança e o rumo á costa indiana; era, no entanto, uma prova por que passavam todos aqueles que se destinavam ao Oriente, ou que de lá regressavam, soldados, fidalgos, missionários ou mercadores.

A viagem de Lisboa à Índia era uma aventura perigosa. Os pilotos portugueses conheciam melhor do que ninguém as diversas etapas da viagem, o seu tempo de duração, os seus pontos difíceis e os seus riscos. A viagem era feita, na sua maior parte, sem haver vista de terra. Por um lado, tal era a prova evidente dos profundos conhecimentos náuticos dos pilotos portugueses, da sua prática de navegação, mas levava frequentemente a situações de perigo iminente. No navio, invariavelmente uma nau, viajavam várias centenas de pessoas, dispostas a partilhar naquele navio um espaço de tempo que rondava, na melhor das hipóteses, os seis meses. Em cada viagem havia um calendário que tinha que ser escrupulosamente cumprido, quer na ida, quer na volta, de forma a tomar os ventos favoráveis e as melhores condições naturais. Um atraso, quer á partida, quer no decorrer da viagem podia obrigar o navio a fazer escala e a atrasar-se vários meses, se se perdesse a monção, ou seja, o vento adequado que sopra nesse sentido apenas durante metade do ano.

No decorrer de uma viagem, vários eram os perigos que espreitavam. Os que mais preocupavam os pilotos eram as condições naturais. Eram frequentes as tempestades, sobretudo no Atlântico, que podiam tanto afundar o navio como afastá-lo da sua rota, não permitindo regressar ao rumo certo na brevidade necessária e comprometer assim toda a viagem. A passagem do cabo da Boa Esperança era o ponto mais crítico de toda a jornada, a manobra mais temida: a turbulência atmosférica nessa região era especialmente severa, a existência de recifes um risco real. Se os ventos fortes eram um perigo, a falta de vento era igualmente temida: é o que se chamava na época “calmaria”. Sem vento, com um calor sufocante, os navios paravam, os alimentos degradavam-se mais rapidamente, surgiam as epidemias, a moral a bordo decaía rapidamente, dando lugar ao desalento, á angústia e ao pânico. As calmarias existiam geralmente á latitude do equador, no Atlântico, podendo arrastar-se durante vários dias, como aconteceu á nau Santiago, que partiu de Lisboa rumo á Índia em 1585:

Continuando o caminho com bom vento entraram na costa da Guiné, e nas calmarias daquela paragem, tão celebrada dos marinheiros da Índia, gastaram 17 dias, passando a Linha a 27 de Maio, de calma tão enfadonha e tão ardente, que as do Alentejo ficam como frios da Noruega em comparação daquela paragem.”

Um dos problemas que afligiam todos os que viajavam a bordo era a alimentação: os alimentos frescos estragavam-se em pouco tempo, pelo que a sua renovação era desejável mas nem sempre possível. A água potável degradava-se igualmente com grande rapidez. O seu preço a bordo dos navios aumentava constantemente, obrigando a um racionamento rigoroso. As escalas, em Cabo Verde, em Santa Helena ou em Moçambique eram, portanto, indispensáveis. Não era raro declararem-se epidemias a bordo, afectando uma boa parte das pessoas a bordo, resultado de má nutrição e condições de higiene deploráveis. O escorbuto, resultante da carência de vitamina C, era uma das doenças inevitáveis. A medicina da época, desconhecedora da causa da maior parte destas doenças, limitava-se geralmente a fazer sangrias, o que agravava ainda mais a condição dos doentes. Eis uma descrição, de 1560:

Iam a bordo 500 e tantas pessoas; não ficaram senão só 15 que não passassem por esta fúria de enfermidades e doenças gravíssimas, assim os homens do mar (…) como os mais fidalgos, soldados, mulheres e meninos. E veio a coisa a tanto, que houve muitos dias juntos 350 doentes, e dia em que se davam 70 e 80 sangrias, e sangravam por meu mandado o barbeiro da nau, o piloto e o sota-piloto, e um grumete que o fazia muito bem. E deram-se por todas 1130 e tantas sangrias”.

Um dos aspectos mais interessantes destas viagens refere-se á religiosidade e superstição a bordo, que crescia á medida que a jornada avançava e que os perigos se sucediam. A bordo viajavam invariavelmente clérigos, geralmente missionários de várias ordens religiosas, a caminho ou de regresso da Índia. Abandonados no meio do oceano, confrontando-se com forças poderosas que não compreendiam nem conheciam, em risco permanente de naufrágio ou de epidemia, os homens agarravam-se ás suas convicções religiosas. As viagens são assim momentos de grande fervor religioso. Sucediam-se as preces, as orações e mesmo as procissões a bordo, pedindo protecção divina contra uma tempestade que se avizinhava ou agradecendo o bom rumo seguido ou o vento favorável encontrado. Aliás, considerava-se que as adversidades mais não eram do que castigos pelos pecados cometidos por cada um, pelo que o estado de pureza espiritual era avidamente procurado, multiplicando-se as confissões e os actos religiosos.

Alguns perigos que os navios portugueses enfrentavam eram, no entanto, bem terrenos. Referimo-nos aqui aos navios de piratas ou corsários que frequentemente infestavam as águas do Atlântico. Até ao final do século XVI, o risco era ainda menor, embora presente. Basta relembrar o episódio de Fernão Mendes Pinto, que á partida para a Índia foi atacado por uma navio de piratas franceses logo junto a Sesimbra, sendo despojado dos seus bens e lançado em terra. A partir da década de 1580 o problema agravou-se: Filipe II torna-se rei de Portugal, pelo que os ingleses e holandeses, inimigos dos espanhóis, passam a atacar também os navios portugueses, sujeitos então a depredações constantes. No fim do século, ingleses e holandeses passam o Cabo da Boa Esperança e chegam ao Oriente, procurando estabelecer também posições no Índico. Assim, a guerra de pirataria e corso do atlântico alargou-se igualmente ao Oriente, sujeitando a navegação portuguesa a uma pressão terrível. A guerra naval passou, então, a juntar-se aos perigos das viagens para a Índia, agravando com outros riscos as condições de vida a bordo.

Carreira da Índia

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Mensagem por Lusitano89 22nd junho 2011, 19:07

Beadala - Fevereiro de 1538


Logo que o catur (pequena embarcação) que vigiava Panane chegou a Cananor com a informação de que a armada malabar saíra daquela cidade e se dirigia para norte, Martim Afonso de Sousa fez-se ao mar e foi estabelecer-se em cruzeiro nas proximidades do monte Deli por lhe parecer ser esse o melhor local para interceptar o inimigo que supunha interessado em ir buscar arroz aos portos da costa do Canará como tinha acontecido nos anos anteriores. Mas o tempo passava e da armada malabar... nem sombras!
Após alguns dias de espera, Martim Afonso de Sousa resolveu dirigir-se para sul em busca do inimigo. Foi então que encontrou um tone que vinha de Cochim, que lhe deu conta de como fora ludibriado por Patemarcar, da perda das três naus que vinham de Ceilão e dos riscos que haviam corrido as que se encontravam à carga em Cochim e Coulão. Chegado à primeira destas cidades, Martim Afonso foi posto mais pormenorizadamente ao corrente das depredações efectuadas pela armada malabar e também de que já tinham saído de Cochim, em sua perseguição, um galeão e uma nau pequena.
Detendo-se em Cochim somente o tempo indispensável para reabastecer os seus navios, Martim Afonso de Sousa largou de novo para o mar a 2 de Janeiro de 1538 e dirigiu-se o mais depressa que lhe foi possível para o cabo Comorim. Aí chegado, tal como previra Patemarcar, constatou que por estar soprando a «vara do Coromandel» não tinha possibilidade de penetrar no golfo de Manar com os navios de alto bordo nem mesmo com as galeotas. Por essa razão, mandou regressar a Cochim o galeão e a nau dessa cidade e ordenou às galeotas que fossem patrulhar a costa do Malabar.
Restavam-lhe vinte e duas fustas e oito catures, incluindo alguns que se lhe tinham juntado em Cochim, com cerca de quinhentos portugueses, com os quais entrou no golfo de Manar, navegando sempre a remos, junto à costa, em busca de Patemarcar. Tratava-se, obviamente, de uma navegação extremamente lenta e penosa. Com vento fresco e vaga da proa, os navios caturravam fortemente e a surriada levantada pelas pancadas que davam na água molhava os tripulantes até aos ossos. De tantas em tantas horas, para permitir que os remadores recuperassem as forças, era necessário fundear.

Beadala - 1538

Em Tuticorim, Martim Afonso de Sousa foi informado de que a armada malabar se encontrava abrigada num pequeno rio, logo adiante de Calecare, posição excelente donde podia atacar com toda a facilidade os navios que, naquela época, regressavam da costa do Coromandel. Aliás, é muito provável que tenha sido essa a principal razão que levou Patemarcar a não se dirigir imediatamente para Colombo. Convencido de que a armada portuguesa não seria capaz de passar para leste do cabo Comorim, terá decidido conservar-se durante algum tempo no golfo de Manar fazendo presas, antes de se ir envolver na guerra de Ceilão. Amigos, amigos... negócios à parte! A verdade é que, ao sacrificar o objectivo principal da sua missão, que era o auxilio ao Maiadune, em favor de um objectivo claramente secundário, como era o de fazer presas, cometeu um grave erro estratégico que acabaria por lhe ser fatal.

Encontrando-se perfeitamente tranquilo e senhor de si, não deverá ter sido pequena a surpresa de Patemarcar quando os navios que tinha de vigia o foram informar de que a armada portuguesa já se encontrava muito perto. Num primeiro impulso, mandou embarcar a sua gente e, de velas içadas, foi ao encontro dos portugueses, parecendo disposto a travar com eles uma batalha decisiva. Mas, pouco depois, mudou de ideias. Antes de as duas armadas terem chegado ao alcance de tiro, mandou arriar as velas, inverteu o rumo e, navegando a remos, pôs-se em fuga para leste. E, como tinha os seus remadores muito mais folgados que os nossos, a breve trecho deixou de ser avistado.

As razões que levaram Patemarcar a evitar o combate com a armada portuguesa, apesar de dispor de grande superioridade numérica e de ter o vento e o mar a seu favor, poderão ter sido de vária ordem. Em primeiro lugar, é natural que tivesse um certo receio de enfrentar Martim Afonso de Sousa que havia granjeado grande fama na defesa da ilha de Repelim aquando das tentativas que recentemente o Samorim fizera para lá entrar. Em segundo lugar, é possivel que tenha pensado, embora tardiamente, que a estratégia mais correcta seria evitar o combate no mar para poder chegar a Ceilão com as suas forças intactas. Em terceiro lugar, e muito principalmente, é provável que não tenha querido sujeitar aos azares de uma batalha os valiosíssimos despojos das presas que tinha feito até essa altura e que iam embarcados nos seus navios.

Por tudo isto, não será de estranhar que, no último instante, Patemarcar tenha recusado a batalha em Calecare e se tenha posto em fuga. O que é de estranhar é que se tenha dirigido para leste, em vez de seguir imediatamente para Colombo. Uma explicação poderá ser que tal rumo implicaria navegar com vaga grossa pelo través, o que era impraticável com navios de remo.
Apesar de o inimigo se ter furtado ao combate e se ter afastado com grande facilidade, Martim Afonso de Sousa não desanimou e continuou a persegui-lo, lutando contra um vento cada vez mais fresco e contra uma vaga cada vez mais alterosa e também contra um certo desânimo, fruto do cansaço, que se ia apossando dos seus.

Passados mais alguns dias de penosa navegação, foi novamente avistada a armada malabar, varada em terra, nas proximidades de Beadala.
À aproximação dos portugueses, Patemarcar fez-se ao mar e, mais uma vez, furtou-se ao combate, fazendo força de vela rumo a sudoeste. Encontrando-se francamente a sotavento dos malabares, a nossa armada não tinha qualquer possibilidade de os interceptar. Tal como tinha acontecido em Calecare, ao fim de algumas horas os navios inimigos perdiam-se de vista, ficando todos com a impressão de que iam a caminho de Colombo ou das Maldivas. Não dispondo de mantimentos suficientes para uma viagem tão demorada, Martim Afonso de Sousa, depois de ouvido o conselho dos capitães, resolveu regressar a Cochim para se reabastecer.
A chegada da armada a esta cidade, sem ter conseguido destruir o inimigo, provocou, como é natural, uma certa decepção, mas não enfraqueceu a determinação do nosso capitão-mor. Tendo recebido uma carta do Governador em que lhe era ordenado que fosse a Ceilão dar auxílio ao rei de Cota contra o Maiadune, Martim Afonso de Sousa, reabastecidos os navios e reforçadas as guarnições com mais uma centena de fidalgos e soldados que se embarcaram voluntariamente, voltou de novo ao mar. Não querendo deixar nada ao acaso antes de seguir para Colombo, resolveu passar novamente por Tuticorim para colher informações. Decisão particularmente feliz, porque ao largo desta cidade apresou algumas embarcações de serviço da armada malabar que por ali andavam, por intermédio das quais soube que, afinal, Patemarcar voltara a Beadala! Mais uma vez a cobiça havia-lhe ofuscado o raciocínio. Tendo sido informado pelos catures que tinha mandado espiar a nossa armada, quando esta retirara para Cochim, de que os portugueses já estavam para lá do cabo Comorim, convencera-se de que tinham retirado definitivamente e resolvera voltar a Beadala e continuar às presas.
Sendo a costa aberta, os paraus estavam, normalmente, varados em terra, só se fazendo ao mar quando aparecia algum navio à vista. No meio dos palmares fora construído um grande acampamento, onde se encontrava instalada a gente de armas, reforçada com dois a três mil soldados naturais da terra. Vivendo como um nababo numa tenda de seda ricamente ornamentada, Patemarcar iria, possivelmente, entretendo o tempo na contemplação do riquíssimo tesouro que já conseguira juntar, constituído por numerosas moedas de ouro, jóias e pedras preciosas.

Porém, certo dia, foi bruscamente arrancado dos seus sonhos de riqueza pela notícia de que a armada portuguesa estava novamente à vista! Desta vez, confiado na grande quantidade de tropas de que dispunha, Patemarcar resolveu não sair para o mar e, com o seu exército formado na praia, junto dos paraus, ficou à espera, a ver o que os portugueses fariam.
Depois das informações que colhera em Tuticorim, Martim Afonso de Sousa tinha navegado cosido com a terra na intenção de cair de surpresa sobre a armada malabar antes de ela ter tempo de se fazer ao mar e fugir, que era o que mais temia. Nas proximidades de Beadala passaram para os catures os principais fidalgos e os soldados mais experimentados que deviam constituir a primeira vaga de assalto. Um pouco atrás, seguiam as fustas com o resto da gente. A ideia de Martim Afonso de Sousa era, à chegada a Beadala, desembarcar imediatamente diante dos paraus e dar combate ao inimigo em terra, já que, por os seus navios serem mais lentos, não tinha maneira de o forçar a combater no mar.

Subitamente, os catures, que iam mais junto à costa do que as fustas, encalharam num banco de areia que havia (e ainda existe) antes do local onde se encontravam varados os paraus, o que, até certo ponto, talvez tenha sido uma sorte para os portugueses, pois que nos parece bastante duvidoso que as escassas centenas de homens que Martim Afonso levava consigo tivessem sido suficientes para vencer os milhares de malabares que os esperavam na praia, devidamente formados e organizados.

18 de Fevereiro

Logo que os catures encalharam, os malabares levaram para o local algumas bombardas com que os começaram a bater, embora sem consequências de maior por serem aquelas de pequeno calibre e a distância relativamente grande. Não obstante, um dos seus pelouros ainda acertou no balão em que Martim Afonso de Sousa se meteu para ir ver o que tinha acontecido, matando-lhe um tripulante e provocando-lhe algumas avarias. Entretanto, as fustas, navegando mais no mar, passaram adiante e foram colocar-se em frente à praia onde estavam os paraus malabares, tirando-lhes a possibilidade de se poderem escapar para o mar alto sem combater.

Ao cair da noite, com a subida da maré, os catures desencalharam, sendo mandados para uma posição a leste das fustas e mais perto da terra a fim de impedir que a coberto da escuridão a armada inimiga pudesse fugir a remos navegando junto à costa. Sendo já noite fechada, Francisco de Sequeira, o Malabar, por ordem de Martim Afonso de Sousa, mandou pôr em terra alguns dos seus homens para, misturando-se com o inimigo, colherem informações.


19 de Fevereiro

Ao outro dia, logo que começou a clarear, os portugueses puderam verificar que os malabares tinham construído um entrincheiramento na praia, em frente ao local onde estavam fundeados os nossos catures, guarnecido com algumas bombardas, com as quais começaram a bombardeá-los. Responderam os catures e durante algum tempo travou-se um vivo duelo de artilharia entre eles e o entrincheiramento. Porém, como o calibre das peças que ambos estavam utilizando era pequeno e a distância relativamente grande, o efeito dos disparos era praticamente nulo. Não querendo nem uns nem outros gastar pólvora sem proveito, a intensidade do fogo foi gradualmente abrandando, até que cessou por completo. Durante o resto do dia a situação não se alterou. As tropas malabares mantiveram-se formadas na praia protegendo os paraus e Martim Afonso de Sousa, perante a força do dispositivo inimigo, não se atreveu a ordenar o assalto.
Cerca da meia noite foram recolhidos os malabares que haviam sido lançados em terra na noite anterior e que trouxeram informações preciosas. Não tendo os portugueses tentado o desembarque nesse dia, os inimigos tinham-se convencido que estavam à espera de reforços de Cochim. Por isso, a gente de guerra, ao anoitecer, tinha ido dormir para o acampamento, ficando a tomar conta dos paraus somente os marinheiros e os bombardeiros. Tanto no acampamento como nos paraus a vigilância era frouxa.

De posse destas informações, Martim Afonso de Sousa, depois de ter reunido um rápido conselho, decidiu atacar imediatamente para aproveitar a escuridão da noite e a excessiva confiança que reinava no campo inimigo. Os oito catures, apenas com cem soldados, lançariam um ataque de diversão bastante a leste, na direcção do acampamento dos malabares. Catorze fustas, também com uma centena de homens de armas, atacariam frontalmente os paraus por forma a darem a ideia que constituíam a força principal. As restantes oito fustas, em que iam embarcados quatrocentos portugueses comandados em pessoa por Martim Afonso de Sousa, iriam desembarcá-los sub-repticiamente cerca de um quarto de légua (pouco mais de um quilómetro) a oeste dos paraus. Daí os portugueses marchariam em silêncio pela praia por forma a atacarem de surpresa os defensores dos paraus no preciso momento em que fosse desencadeado o ataque por mar. O sinal combinado para o início da acção era um tiro de bombarda disparado pela fusta em que ia o capitão-mor.

20 de Fevereiro

De princípio, como geralmente sucede, tudo correu conforme estava planeado. As oito fustas conseguiram abicar à praia sem ser pressentidas e desembarcar os quatrocentos homens que transportavam, os quais se puseram imediatamente em marcha, ao longo da praia, com Martim Afonso de Sousa à sua frente. Ao mar, a uma certa distância, acompanhavam-nos as fustas que os tinham transportado, para lhes dar apoio de artilharia se fosse necessário. Nessa altura, o plano começou a descarrilar. As fustas foram avistadas de uma posição malabar instalada a oeste dos paraus, que disparou um tiro contra elas. Eram cerca das três da madrugada. As fustas que tinham ficado em frente dos paraus, quando ouviram o tiro, julgaram tratar-se do sinal combinado e lançaram-se ao assalto, fazendo um barulho ensurdecedor com as trombetas e a gritaria dos soldados, dos marinheiros e dos remadores.
Acordando sobressaltados, os soldados malabares que estavam a dormir no acampamento pegaram atabalhoadamente nas armas e acorreram em defesa dos paraus. Mas logo voltaram atrás, quando novas trombetas e novos gritos, vindos dos catures, soaram à sua rectaguarda dando a impressão de que o inimigo se estava a dirigir para o acampamento. E foi tal a confusão que se estabeleceu no campo malabar que entre os que iam para os paraus e os que voltavam atrás se chegaram a travar violentos recontros!
Quando ouviu o clangor das trombetas, Martim Afonso de Sousa compreendeu que tinha havido qualquer erro. Mas proibiu terminantemente que se acelerasse a marcha para não chegar com a sua gente esfalfada ao local do combate.

Junto aos paraus, a situação dos portugueses que ali tinham desembarcado e se viam agora confrontados com uma torrente de inimigos que desciam do acampamento ia-se tornando de minuto a minuto mais difícil. Os dois principais fidalgos que comandavam a força foram os primeiros a cair mortos. Os restantes, entrincheirados nos paraus que haviam tomado, defendiam-se desesperadamente a tiro, à lança e à espada, procurando aquentar-se até à chegada da coluna que vinha pela praia, cuja demora não entendiam.
Mas, de repente, ali mesmo ao pé, soou, mais uma vez, o toque vibrante das trombetas, acompanhado por uma medonha algazarra, e, nesse mesmo instante, uma massa de homens armados, a que a escuridão dava formas gigantescas, precipitou-se como um furacão sobre o flanco direito dos malabares! Apanhados completamente de surpresa, estes desordenaram-se e puseram-se em fuga para o acampamento, perseguidos de perto pelos portugueses.

Entretanto, nasceu o dia. Na zona do acampamento o terreno era mais aberto. Isso permitiu que os malabares se reorganizassem e, vendo quão poucos eram afinal os nossos, começassem a procurar envolvê-los, tirando partido da superioridade numérica de que dispunham.
Neste ponto será de chamar a atenção do leitor para o facto de que essa superioridade não era de oito mil para seiscentos, conforme os cronistas referem. É muito provável que mais de metade dos malabares fossem marinheiros e remadores, o que reduz para cerca de quatro mil o número de homens aptos para combate, incluindo os naturais da terra. Por outro lado, é natural que os portugueses, como de costume, estivessem acompanhados pelos seus escravos de peleja, o que aumenta, possivelmente, o número dos nossos combatentes para cerca de mil. Mesmo assim, a superioridade numérica do inimigo seria de quatro para um, o que colocava os nossos numa posição extremamente desvantajosa quando tinham de combater em campo aberto. Além disso, quando abandonavam a sombra das palmeiras, os portugueses ficavam com os capacetes e as armaduras a escaldar por acção do calor do sol.

Nestas circunstâncias, não será de estranhar que tenham sido obrigados a retirar da zona do acampamento e a vir procurar abrigo junto dos paraus, sempre acossados pelos malabares. Mas, uma vez aí chegados e depois de terem descansado um pouco, voltaram novamente à carga, e com redobrado vigor levaram pela segunda vez o inimigo de vencida até ao acampamento. Porém, quando ali chegaram já o seu ímpeto se tinha esgotado e foram novamente forçados a acolher-se aos paraus. E neste vaivém se manteve o combate durante várias horas sem que nenhum dos contendores conseguisse quebrar a vontade de continuar a lutar do adversário.

Nessa altura, Francisco de Sequeira, que conhecia bem a psicologia dos seus patrícios, chegou-se ao pé de Martim Afonso de Sousa e disse-lhe: - Se queres acabar com isto, manda pôr fogo aos paraus! Embora desejoso de conservar os navios inimigos para os integrar na sua armada, Martim Afonso compreendeu que o prolongamento do combate podia ser fatal aos portugueses e aceitou imediatamente o alvitre, dando ordem aos marinheiros para irem queimar os paraus com panelas de pólvora. Poucos minutos depois começavam a sair deles alterosas labaredas, acompanhadas por espessos rolos de fumo negro. E, conforme Francisco de Sequeira previra, muitos dos soldados malabares, pensando que já não valia a pena continuar a lutar, principiaram a debandar.

Sentindo os seus a fraquejar, Cutialemarcar foi ter com o tio, que desde o início da batalha se tinha conservado dentro da sua tenda, e exortou-o a vir cá para fora para animar os soldados com a sua presença. Mas Patemarcar era um homem completamente derrotado. A única coisa que nessa altura o preocupava era a forma de salvar o seu tesouro. E, antes que o desbarato das suas tropas se generalizasse, escapou-se com vinte e cinco homens da sua confiança, levando consigo, dentro de um cofre, as moedas de ouro e a pedraria que eram todo o seu enlevo. Mais tarde, para poder escapar-se mais à vontade, mandou enterrar o cofre numa das bermas do caminho.
Ao tempo em que o seu capitão-mor já ia fugindo vergonhosamente, a resistência dos malabares desmoronava-se por completo. Contagiados pela fuga dos companheiros, os que ainda estavam a combater iam-se juntando a eles em número cada vez maior, até que não ficou nenhum. Eram onze da manhã e o sol escaldava. A batalha tinha durado oito horas ininterruptas!
Além de muitos feridos que se escaparam, ficaram estendidos no terreno para cima de oitocentos malabares. Dos portugueses foram mortos dezoito e mais de uma centena ficaram feridos. O despojo capturado foi imenso: vinte e dois paraus em bom estado, além de vinte e cinco que tinham sido queimados; quatrocentas bombardas, muitas delas de bronze; mil e quinhentas espingardas, além de muitas outras armas! Para dar mais sabor à vitória, foram ainda libertados alguns portugueses e numerosos escravos que os malabares tinham em seu poder. Entre os cativos libertados figurava um menino de Cochim cuja mãe havia pedido encarecidamente a Martim Afonso de Sousa que lho restituísse.

Da batalha de Beadala diz o historiador cingalês Pieris: -... one of the greatest battles in the history of the Portuguese in Índia (... uma das maiores batalhas da história dos Portugueses na Índia.)
Tanto no delinear da estratégia que conduziu à batalha como na sua execução táctica, Martim Afonso de Sousa foi magistral. Mas, acima de tudo, o que mais impressiona, tanto nas fases preliminares como na fase final da batalha, é a persistência de buldogue dos portugueses, que perseguem incansavelmente a presa durante mais de um mês e meio e, depois de a terem abocanhado, nunca mais a largam, por mais pancadas que recebam, até a desfazerem.

Sob o ponto de vista estratégico, a vitória de Beadala não podia ter ocorrido em melhor altura. A destruição da armada malabar em Fevereiro de 1538, seguindo-se à captura da armada de Cambaia que tivera lugar um ano antes, deixou aos Portugueses as mãos livres para enfrentar os Turcos, que nesse ano passaram pela segunda vez à Índia.

Depois de ter enviado para Cochim duas fustas com os feridos mais graves e a boa nova da estrondosa vitória que alcançara sobre os Malabares, Martim Afonso de Sousa, levando consigo os paraus capturados, dirigiu-se a Colombo, e dali, por terra, a Cota, capital do reino do mesmo nome, que se encontrava cercada pelas tropas do Maiadune. À vista dos portugueses, este levantou imediatamente o cerco e refugiou-se nas montanhas. Pouco depois, perdida a esperança do socorro malabar, fazia novamente a paz com o rei de Cota. Cumulados de honrarias e de riquíssimos presentes, os portugueses regressaram triunfantes a Cochim.

Poderá imaginar-se a recepção apoteótica que tiveram naquela cidade quando ali chegaram levando os vinte e dois paraus de Patemarcar, entre os quais se contava o que fora a capitânia da armada malabar, um parau de grandes dimensões, que mais parecia uma galeota ricamente ornamentado com entalhes e dourados, no qual ia embarcado Martim Afonso de Sousa. Repicaram os sinos das igrejas, troaram as bombardas da fortaleza e dos navios, celebraram-se missas, enquanto nas ruas o povo dava largas ao seu contentamento, tanto mais que a maioria dos marinheiros e dos remadores da nossa armada eram malabares de Cochim e dos arredores.

Quanto a Patemarcar, logo que chegou a Calicut, apressou-se a mandar alguns dos seus homens de confiança buscar o cofre com o tesouro que tinha escondido durante a fuga. Mas um deles, provavelmente na mira de alcançar uma choruda recompensa, foi desvendar o segredo ao capitão português de Coulão. Este montou uma emboscada no lugar apropriado e apossou-se do cofre!

Disseram depois as «más-línguas» que o teria aberto só para ver o que lá estava dentro e que, por esse facto, uma parte importante das moedas de ouro e da pedraria que continha se evaporou sem deixar rasto! Era assim a Índia dos Portugueses: rasgos de heroísmo sublimes a par de mesquinhas manifestações da mais sórdida cobiça.


Saturnino Monteiro
em «Batalhas e Combates da Marinha Portuguesa» (Vol.II)

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Mensagem por Lusitano89 2nd julho 2011, 17:00

Os banqueiros europeus e a expansão ultramarina portuguesa


Os grandes responsáveis pelo crescimento económico do século XVI foram os homens de negócios, geradores de algumas empresas multinacionais servidas por uma eficiente e rica rede urbana. Estes "capitalistas", por sua vez, criaram um sistema de tipo capitalista assente numa cidade tornada monopólio, como foi o caso de Lisboa. Em Portugal os monarcas financiaram uma parte substancial das descobertas, que conduziram ao controlo económico da Índia.

A capital portuguesa era nesta altura o centro do comércio das especiarias e da pimenta em particular, pois a cidade estava apetrechada com as estruturas necessárias para dirigir e pôr a funcionar a economia colonial portuguesa. O rei reservou para si até 1570 o monopólio do comércio da Índia, e só depois desta data permitiu o arrendamento a contratadores, que já estavam envolvidos e dominavam o comércio de escravos. A cidade de Lisboa era, deste modo, a base de toda a empresa colonial, uma vez que nela estavam concentrados os maiores armazéns, entrepostos comerciais e todas as dependências onde eram tratados os assuntos relativos a problemas de ordem naútica, como a construção e manutenção dos navios, entre outros. Também o Estado estava encarregado de providenciar o pagamento dos custos de manutenção dos armazéns. O rei era o maior e mais poderoso capitalista português, que concedia licenças de importação a portugueses e estrangeiros, e se juntou por diversas vezes a notáveis figuras da nobreza, como Afonso de Albuquerque, e a negociantes do exterior provenientes da Itália, da Alemanha e da Espanha para armar os seus navios.

No Império Português foram fundadas lucrativas feitorias, e o rei, atraído pela acumulação de avultados lucros, funcionou como o patrocinador desta empresa, sobretudo D. Manuel I (1495-1521) e D. João III (1521-1557). A cidade espanhola de Sevilha seguiu o exemplo português, desta feita baseando o seu monopólio no comércio com a América. Em 1503, a Coroa espanhola fundou, à imagem da Casa da Índia portuguesa, a Casa de la Contratación, em Sevilha. Tal como a de Lisboa, esta muniu-se de instrumentos naúticos e distribuiu licenças de passagem para as Índias. Contudo, a maior diferença entre estes dois modelos era o facto de o monarca de Castela ter entregue a exploração comercial a particulares, mantendo, no entanto, para Sevilha o monopólio do tráfico com as Índias ocidentais, facto de que resultou na fixação nesta cidade de homens de negócios de várias nacionalidades. Apesar de todo o aparelho montado pela Coroa portuguesa, Lisboa funcionava, no fundo, como um gigantesco entreposto. O verdadeiro comércio do Oriente processava-se, de facto, a norte, em Antuérpia, cidade onde os portugueses estavam desde o início do século XVI, e era controlado pelos grandes financeiros e mercadores europeus. O crescimento das cidades europeias no século XVI, em muitos casos, ficou a dever-se a grupos de negociantes e a famílias como os Fugger, uma dinastia fundada por Jakob, o Rico, descendente de Jakob, o Velho, que falecera em 1469. É por acção daquele membro da família Fugger que esta empresa de Habsburgo cresceu e prosperou. O segredo do seu sucesso esteve na aposta, não só no comércio com as repúblicas italianas, mas também na sua actividade como banqueiro dos príncipes. Esta actividade permitiu-lhe ganhar importantes monopólios, como por exemplo o contrato firmado com o arquiduque Sigismundo, príncipe do Tirol, pelo qual a exploração de prata das suas minas era a garantia do empréstimo concedido a este senhor.

A sua grandiosa fortuna foi sustentada, em parte, pelo controlo do escoamento da prata e do cobre para Antuérpia, pois esta família conseguira alargar a sua influência sobre as minas de cobre da Hungria e da Eslováquia. Mas a sua fortuna aumentou consideravelmente com o seu envolvimento noutros negócios, tais como a transferência do dinheiro a enviar para a Cúria papal pelos eclesiásticos a norte dos Alpes, a participação no comércio português das especiarias, a organização de oficinas de tecelagem nos senhorios da família em Ulm, onde eram fabricados fustões que depois eram vendidos nos Países Baixos e na Itália. Todas estas actividades contribuíram para que esta família fosse, entre 1495 e 1525, a mais forte empresa comercial e também bancária da Europa do seu tempo, o que fez de Habsburgo um decisivo centro financeiro que veio a afirmar-se como uma potência política, nomeadamente pela influência decisiva que esta família de financeiros teve na eleição imperial de Carlos V em 1519. Anton, o sobrinho de Jakob, manteve a fortuna da família após a morte do tio, em 1525. No entanto, agora o centro de operações já não era Habsburgo mas sim Antuérpia, onde esta família atinge o seu ponto mais alto em 1546, coincidente com o período de maior prosperidade desta cidade. Contudo, a bancarrota da Espanha de 1557 provocou a derrocada dos Fugger. A cidade de Habsburgo teve entretanto outras duas famílias economicamente fortes: os Welser e os Baumgartner. Os primeiros tiveram alguma preponderância no escoamento de metal da Europa central para Veneza e Antuérpia, bem como no comércio de especiarias e tecidos.

Esta família estabeleceu feitorias em várias cidades da Europa, numa verdadeira empresa de colonização financeira. Os segundos, originários de Nuremberga, mudaram-se para Habsburgo em 1498 e alcançaram alguma prosperidade até 1560, quando faliram devido à crise dos preços de 1557. Antuérpia era outra das cidades mais activas da Europa desta altura. Era um local beneficiado pela sua situação estratégica e pelo relacionamento político que mantinha com os Países Baixos e com a Espanha. Ali juntavam-se negociantes de toda a Europa, nomeadamente os já citados Fugger e Welser, bem como os hanseáticos do Norte, que ali fixaram uma feitoria em 1555, os feitores do rei de Portugal e da rainha Isabel, a Católica, e comerciantes italianos representados pela firma de Lucca, os Bonvisi, e a sociedade dos Affaitati, que fixaram aqui a sua casa-mãe. Além destes, não nos devemos esquecer da enorme comunidade de mercadores portugueses e espanhóis, composta por inúmeros elementos de origem judaica, cristãos-novos que terão enorme influência, futuramente, no desenvolvimento comercial e financeiro da Holanda. A expansão de Lyon, já anteriormente beneficiada com a criação das feiras por Luís XI, foi instigada pelos italianos presentes nas instituições bancárias e que aqui instalaram as suas casas comerciais, como os Médicis e os Strozzi de Florença e os Bonvisi de Lucca, que instalam a sua casa-mãe nesta cidade. Antuérpia, Lyon e Sevilha são cidades onde se encontra um capitalismo de tipo monopolista, apesar de na última haver a Casa de la Contratación, ao contrário de Lisboa e mais ainda de Londres, onde cresceu o capitalismo nacional, que surgiu com a publicação de decretos em 1485 e 1489 (que inspirarão os célebres Actos de Navegação do século XVII) que concediam o monopólio da importação de vinhos e outras mercadorias à Inglaterra. No entanto, em toda a primeira metade do século XVI o comércio em Londres era dominado pelos estrangeiros, entre os quais se destacavam os Bonvisi e os comerciantes hanseáticos, muito influentes até à centúria de Seiscentos.

O desenvolvimento de outras cidades europeias teve a ver com as associações de mercadores medievais, que não são nem cosmopolitas nem nacionais, como o caso da Liga Hanseática, que constituía uma espécie de federação de cidades, onde se destacava Colónia, Danzig (actual Gdansk, na Polónia) e, sobretudo, Lübeck. Portugal, através da sua capital cosmopolita, foi um exemplo a seguir por outras cidades. O comércio ultramarino, altamente lucrativo, assente na comercialização de produtos coloniais como as especiarias, foi um factor de desenvolvimento da cidade e do país, que garantiu aos monarcas portugueses grandes lucros, os quais foram repartidos, vantajosamente, por outras cidades intervenientes neste comércio como Antuérpia, e por outras entidades particulares como diversos banqueiros que tiraram partido do desenvolvimento português mediante o empréstimo de capital a investir nas armadas e na manutenção do império português.

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Mensagem por Lusitano89 2nd agosto 2011, 21:30

Batalha do Rio Perlis - 6 de Dezembro de 1547


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A grande armada que os Turcos tinham preparado para voltarem à Índia em 1541 ou 1542 havia sido, destruida, não voltando a ser reconstituída por razões que ainda não foram devidamente esclarecidas.

É possível que uma dessas razões tenha sido a política de apaziguamento posta em prática por D. João III. Poderá também ter acontecido que os Turcos tenham optado pela estratégia mais económica de auxiliar os reis da Índia contra nós, a fim de nos ir enfraquecendo, enquanto aguardavam melhor oportunidade para nos destruir.

O certo é que em 1547 vamos encontrar no Achém três galeotas turcas com vinte soldados cada uma e mais vinte janízaros de origem grega idos havia pouco do mar Vermelho em duas naus. E, ou por iniciativa própria ou por conselho dos Turcos, o rei do Achém renovou a guerra contra os Portugueses ao mesmo tempo que mudava de estratégia.

Até então, tinha por várias vezes tentado apoderar-se de Malaca por meio de assalto ou de cerco. Agora, resolveu construir uma fortaleza a norte dela, basear aí uma armada e cortar-lhe as comunicações com a Índia, Bengala, o Pegú e Tenassarim. Para o efeito, organizou uma poderosa armada constituída pelas três galeotas turcas e por cinquenta e sete fustas e lancharas suas, guarnecidas com cerca de cinco mil homens, entre marinheiros e gente de armas. Desta faziam parte, além dos turcos e janízaros, trezentos ourobalões de manilha dourada, que eram os nobres mais valentes do reino do Achém. Para capitão da armada foi escolhido um valido do rei, de nome Bayaya Soora, que era rei de Pedir.

As directivas que lhe foram dadas foi que se dirigisse primeiro a Malaca e queimasse todos os navios que estavam no porto e, ao mesmo tempo, fizesse uma demonstração de força diante da cidade para humilhar os Portugueses. A seguir, deveria estabelecer uma base no local que considerasse mais apropriado para cortar as comunicações de Malaca com o Norte.

No cumprimento destas directivas, a armada de Bayaya Soora chegou a Malaca a 9 de Outubro de 1547, pelas duas da madrugada. Pensando que os portugueses estariam a dormir, os janízaros e os turcos insistiram com aquele para que autorizasse um ataque à cidade, de surpresa. Apesar de isso ser contrário ao plano da campanha, Bayaya Soora acedeu. Enquanto uma parte da armada ia lançar a sua gente silenciosamente em terra, a outra parte dirigia-se para junto da ilha das Naus, onde estavam fundeados vários navios.

Mas os portugueses não dormiam! Apesar da escuridão da noite, não lhes tinha passado despercebida a aproximação da armada achém. Com os capacetes na cabeça, as couraças no peito, as lanças e as espadas nas mãos, e os morrões das espingardas acesos, aguardavam no mais absoluto silêncio o desenrolar dos acontecimentos, prontos para darem uma boa lição aos intrusos. Deixaram os inimigos desembarcar, mas, antes que tivessem tido tempo de se organizar, dispararam as espingardas e logo carregaram sobre eles. Travou-se então, na escuridão da noite, um curto combate em que os invasores foram desbaratados, sendo obrigados a reembarcar, depois de terem tido vários mortos e muitos feridos.

A tentativa de desembarque redundara num fiasco. Mas o ataque aos navios que estavam fundeados na ilha das Naus foi mais bem sucedido. Como tinham somente alguns marinheiros a guardá-los, foram facilmente incendiados uma nau e seis outros navios, provavelmente juncos ou lorchas. Curiosamente, nessa noite estava a chover. Mas o vento era muito forte e ateava de tal modo as labaredas que a própria chuva, que devia ser fraca, não chegou para apagar o fogo.

Ao outro dia de manhã os navios inimigos embandeiraram e atroaram os ares com o toque dos tambores e sinos, ao mesmo tempo que as suas guarnições faziam grande algazarra em sinal de vitória. Apanharam então os achéns um pequeno barco de pescadores que se dirigia para a cidade, aos quais Bayaya Soora, barbaramente, mandou cortar as orelhas, os narizes e os tendões dos pés. E por estes desgraçados, horrivelmente mutilados, enviou um cartel de desafio ao capitão da fortaleza para que saísse a combater a sua armada, acrescentando que se o não fizesse passaria a considerar o rei de Portugal como o último dos vassalos do rei do Achém!

O capitão de Malaca nessa altura era Simão de Melo. Lida a carta na presença dos fidalgos e soldados que estavam com ele todos se riram dos dislates nela contidos, mas ninguém pensou em tomar a sério o desafio, uma vez que os únicos navios que havia em Malaca, depois de queimados os que estavam fundeados na ilha das Naus, eram meia dúzia de fustas velhas. Entretanto, a armada achém levantava ferro e desaparecia rumo ao Norte.

Nesse tempo estava em Malaca o padre jesuíta Francisco Xavier, regressado havia pouco das Molucas com fama de santidade. Quando teve conhecimento do cartel de desafio de Bayaya Soora verberou a atitude do capitão e demais fidalgos e soldados dizendo-lhes que não indo combater os infiéis cobriam de vergonha o nome de Portugal e a religião de Cristo! Tentaram defender-se aqueles explicando ao padre que as poucas fustas que estavam em Malaca não se encontravam em estado de navegar. Pois que as consertassem, retorquiu aquele! Argumentou o capitão que não havia nos armazéns da fortaleza nem breu nem estopa para as calafetar. Obstinado, Francisco Xavier respondeu-lhe que havia muita gente rica em Malaca que tinha breu, estopa e tudo quanto era preciso para aprontar as fustas. E quanto a serem estas muito poucas, que não lhe viessem com um argumento tão ridículo, pois bem sabiam que combatendo com Cristo por capitão o número dos inimigos não contava!

O que é facto é que a força de ânimo e a fé de Francisco Xavier despertaram os brios dos portugueses. Com a volubilidade e os entusiasmos súbitos e de pouca duração característicos da nossa raça, já todos diziam que era uma vergonha deixarem escapar os achéns sem lhes terem dado o devido castigo. E metendo mãos à obra, em oito dias de trabalho insano, em que colaborou toda a população de Malaca, aprontaram-se sete fustas e um catur em que embarcaram cento e oitenta soldados portugueses capitaneados por D. Francisco de Eça. O padre Xavier fez uma última pregação aos combatentes, elevando ao rubro o seu ardor bélico e religioso, e a armada fez-se ao mar, confiada em que, apesar da enorme superioridade numérica do inimigo, Deus lhe daria a vitória!

Mas logo os ânimos esfriaram quando, após as primeiras remadas, a fusta capitânia, que fazia água como um cesto roto, foi ali mesmo ao fundo! Felizmente, conseguiu-se salvar toda a gente e praticamente todo o material que levava. Mas o efeito moral foi tremendo. Ao optimismo exagerado de momentos atrás contrapunha-se agora o mais profundo pessimismo. Que grande tolice ter dado ouvidos ao padre que não percebia nada de navios nem de guerra! Que disparate deixar a fortaleza praticamente desguarnecida! Ir combater sessenta navios apenas com sete a cair de podres era uma manifestação de soberba que até Deus poderia castigar ... !

Perante o clamor público, Simão de Melo resolve pôr o assunto à votação. A maioria é de opinião de que se deve desistir da perseguição à armada achém. Mas os soldados da armada insistem em ir. Está ali o padre Xavier olhando-os fixamente e têm vergonha de abjurar tão abruptamente das promessas que minutos antes lhe haviam feito de morrer alegremente, combatendo por Cristo! Aquele conserva-se impávido e sereno. A única coisa que o espanta, diz, é a pouca fé dos que o rodeiam. Lá por terem perdido uma fusta já descrêem da ajuda divina? Que importância tinha serem seis ou sete fustas quando iam combater contra sessenta? Neste ponto, a História e a Lenda misturam-se, sendo difícil afirmar com segurança onde começa uma e acaba a outra. Perante o desânimo dos circunstantes, Francisco Xavier teria então anunciado que para substituir a fusta perdida Deus enviaria duas muito melhores naquele mesmo dia! Meio incrédulos, os soldados e os populares sobem às muralhas e aos outeiros e perscrutam ansiosamente o mar. Eis se não quando, um pouco antes do pôr-do-Sol, aparecem no horizonte duas velas latinas!

No meio de um alvoroço e uma comoção enormes é enviada uma embarcação ao seu encontro, que regressa já noite fechada com a boa nova de que se tratava de duas fustas com sessenta portugueses capitaneados por Diogo Soares que vinham de Patane e se dirigiam ao Pegú para fazer negócio. A profecia do padre Xavier cumprira-se!
Tendo os da embarcação dito que as fustas não tinham querido aproximar-se da zona do porto para não terem de pagar direitos pelas mercadorias que transportavam, Francisco Xavier meteu-se naquela e foi pessoalmente falar com os seus capitães. Contou-lhes a aflição em que estava a cidade e rogou-lhes, em nome de Deus e do Rei, que se juntassem à pequena armada que estava prestes a partir contra os achéns. - Sim senhor - disseram eles -, combater por Cristo e pelo Rei, claro que sim! Não estavam ali para outra coisa! Mas... pagar direitos à alfândega de Malaca, é que não! Só entrariam no porto depois de terem na mão um documento assinado pelo capitão da fortaleza e pelos oficiais da alfândega, isentando-os do pagamento dos direitos!

Infatigável, o padre Xavier veio a terra, obteve o documento pedido e altas horas da noite voltou às fustas para o entregar a Diogo Soares e aos seus companheiros. No dia seguinte de manhã vieram aquelas fundear junto da cidade, sendo recebidas com grandes manifestações de alegria.

Durante quatro dias limparam o fundo, embarcaram artilharia grossa e meteram munições, mantimentos e água, ficando prontas para combate. A armada portuguesa de Malaca contava agora com oito fustas e um catur, guarnecidos, além dos marinheiros, remadores e escravos, com duzentos e trinta aventureiros, combatentes de respeito pela prática que tinham do mar e da guerra. Não obstante, Simão de Melo, não querendo arriscar demais, deu por regimento a D. Francisco de Eça que não continuasse a perseguição aos achéns para norte de Pulo Sambilão.

Tendo-se feito ao mar a 25 de Outubro, chegou a nossa armada àquelas ilhas quatro dias mais tarde sem ter encontrado a armada do Achém nem ter conseguido obter qualquer informação acerca do seu paradeiro. Nesta situação, D. Francisco de Eça reuniu conselho. A maior parte dos capitães e soldados eram de opinião que se devia continuar para norte em busca dos inimigos. Mas D. Francisco não seguiu esse parecer e decidiu voltar para Malaca, de acordo com as ordens que tinha.

Porém, quando os navios puseram as proas ao sul, levantou-se um vento muito forte de sudoeste que lhes barrou o caminho e os obrigou a fundear. Em Dezembro, já é habitual predominarem naquela região os ventos do norte e de nordeste. Mas, nesse ano, contra todas as expectativas, o sudoeste manteve-se, soprando sempre com força. A vida a bordo das fustas era miserável. Confinados num pequeno espaço, sem terem nada para fazer, os homens maldiziam tudo e todos, num ambiente de constantes questiúnculas. Passados vinte e três dias sem que a situação se modificasse, e estando os víveres praticamente no fim, D. Francisco de Eça viu-se forçado a reunir novo conselho, no qual ficou assente seguir imediatamente com a armada para Tenassarim a fim de se reabastecer.

Entretanto, crescia a angústia em Malaca. Apesar de o padre Xavier continuar confiante na protecção divina, por cada dia que passava mais se arreigava na mente dos habitantes da cidade a ideia de que qualquer coisa havia corrido mal. E, de repente, começaram a circular boatos de «fonte segura» que a armada portuguesa tinha sido destroçada e que todos quantos a guarneciam eram mortos ou cativos dos «mouros»!

Cerca de uma semana mais tarde, para agravar a situação, entrou em cena, na força de trezentas velas, a armada do rei de Ugentana, que, sob o seu próprio comando, veio fundear no rio de Muar a sul de Malaca. Tinha aquele rei preparado uma grande armada para ir fazer guerra a Patane, cidade da outra costa da península Malaia que mantinha excelentes relações com os Portugueses. Mas, quando soube que a nossa armada tinha sido destruída pelos achéns, apressou-se a mudar de objectivo, pensando que seria uma ocasião única para se apoderar de Malaca. Por isso, logo que chegou ao rio de Muar, enviou um emissário a Simão de Melo para lhe apresentar condolências pela derrota sofrida e informá-lo que estava ali com a sua armada pronto para o ajudar, uma vez que era certa a vinda dos achéns vitoriosos sobre Malaca. Que lhe desse licença para ir fundear junto da cidade e desembarcar as suas forças!

Bem percebeu Simão de Melo a manha do inimigo, respondendo-lhe que nunca esqueceria tão generosa oferta mas que, felizmente, de momento não precisava de qualquer ajuda porque tinha muita gente na fortaleza e, além disso, acabara de receber notícias de que a nossa armada tinha alcançado uma grande vitória sobre os achéns! Entendendo pelo teor da resposta que a sua astúcia não resultara, o rei de Ugentana resolveu continuar no rio de Muar enquanto enviava alguns balões para o Norte a fim de colherem informações.

Enquanto isto se passava em Malaca, a nossa armada navegava a caminho de Tenassarim. A 5 de Dezembro entrou no rio de Perlis para fazer aguada. Concluída esta, já ao cair da noite, foi capturada uma pequena embarcação de pescadores. Por eles souberam os nossos que a armada de Achém se encontrava dentro do rio! Tinha tomado Perlis e as povoações vizinhas, matando ou cativando a maior parte da população. Agora estavam os achéns construindo uma fortaleza junto da cidade na intenção de se fixarem ali. Blasonavam que haviam de apanhar todos os navios que se dirigissem para Malaca e que haviam de matar com morte crua todos os portugueses que neles encontrassem!

De posse destas informações ficaram os nossos tão alvoroçados e indignados que, imprudentemente, começaram a fazer grande alarido e a disparar as espingardas e as bombardas, ao mesmo tempo que embandeiravam os navios, tão certos estavam de que o estranho vento que os impedira de regressar a Malaca e a entrada fortuita no rio de Perlis para fazer aguada tinham sido obra de Deus, que não deixaria de lhes dar a vitória no dia seguinte, tal como tinha profetizado o padre Xavier.

Acalmados um pouco os ânimos, D. Francisco de Eça mandou pelo rio acima três balões em reconhecimento, cada um deles levando um capitão e dois soldados escolhidos. Percorridas cerca de seis léguas, ou seja, a meia distância de Perlis, apesar da escuridão da noite, foram avistados quatro balões que vinham em sentido contrário. Tendo ouvido o estrondo da artilharia e da espingardaria, Bayaya Soora apressara-se também a enviar algumas embarcações em missão de reconhecimento. E logo ali se travou o primeiro combate entre os portugueses e os achéns, que terminou com uma vitória completa dos primeiros. Foram tomados três dos balões contrários e feitos seis prisioneiros, enquanto o quarto balão fugia rio acima à força de remos.

Como os balões capturados eram bastante melhores que os seus, os portugueses queimaram estes e passaram-se para aqueles, com o que regressaram triunfantes para junto da armada. Metidos a tratos os prisioneiros, acabaram por confirmar todas as informações dadas pelos pescadores, acrescentando que a armada achém se estava aprontando para no dia seguinte de manhã ir dar combate à portuguesa.

Ao outro dia, pouco depois do nascer do Sol, os nossos balões que estavam de vigia a montante, vieram dar aviso de que o inimigo se aproximava. Ao mesmo tempo que os navios faziam os últimos preparativos para o combate, D. Francisco de Eça percorria a armada numa pequena embarcação recordando a todos as palavras do padre Xavier e as juras que haviam feito de combater até ao último alento por Cristo e por Portugal numa batalha em que, bem sabiam, não haveria quartel para ninguém. Momentos depois surgia detrás de uma volta do rio a armada achém, fazendo uma algazarra diabólica e atroando os ares com o toque dos seus instrumentos bélicos.

É a altura de dizer que o facto de a batalha se ter travado no interior de um rio estreito e não no mar largo foi particularmente favorável para os portugueses, uma vez que impediu os achéns de tirarem partido da enorme superioridade numérica de que desfrutavam. Além disso, deve-se realçar que, pelo menos, algumas das nossas fustas estavam armadas com bombardas de calibre médio, ao passo que os navios inimigos apenas dispunham de peças de pequeno calibre. E no combate naval, para além da ajuda de Deus, o peso da bordada é um dos factores que mais conta.

A nossa armada, segundo parece, estava disposta em duas fileiras de quatro fustas cada uma. Na armada inimiga, vinha à frente uma grande lanchara, que era a capitânia, acompanhada das três galeotas turcas. Nestes quatro navios, além dos turcos e dos janízaros, vinham embarcados a maior parte dos ourobalões de manilha dourada. Seguiam-se nove fileiras, compostas cada uma delas por seis fustas ou lancharas mais pequenas. Como sempre, habituados a combater à matroca, espantaram-se os portugueses com o rigor da formatura inimiga.

Os navios achéns, navegando à vela e a remos e arrastados pela corrente do rio que era muito forte, vinham animados de grande velocidade, o que fazia prever que o embate com os nossos seria terrível. Mas, quando se aproximaram da nossa armada, os bombardeiros inimigos precipitaram-se e abriram fogo cedo demais, do que resultou a maior parte dos seus tiros terem caído curtos. Mais experientes, os bombardeiros portugueses aguardaram até que os navios inimigos chegassem a curta distância e só então puseram fogo à pólvora. Os resultados desta primeira salva foram devastadores, ficando a batalha praticamente decidida. As três galeotas turcas ficaram logo arrombadas e cheias de mortos e feridos. Mas muito mais importante do que isso foi o facto de o tiro de um «camelo» disparado pela fusta de Diogo Soares ter aberto um grande rombo na amura da capitânia inimiga no preciso momento em que esta abalroava a nossa capitânia. Alagando-se por completo em poucos minutos, a capitânia do Achem foi ao fundo, perecendo afogados mais de cem dos seus tripulantes!

Logo que viram o navio-chefe a afundar-se, as galeotas que a acompanhavam suspenderam o seu movimento em direcção à nossa armada e procuraram acercar-se dele para salvar o que restava da sua guarnição. O pior é que a sua paragem súbita, inesperada para as fustas que as seguiam, fez com que estas se emaranhassem umas nas outras. Em poucos minutos, a poderosa armada achém estava reduzida a um montão de navios incapazes de se moverem e que, em conjunto, constituíam um alvo ideal para os nossos bombardeiros!

Aproveitando-se da confusão em que estava mergulhado o inimigo, as nossas fustas dianteiras meteram-se pelo meio dele, descarregando incessantemente as espingardas e lançando para dentro das contrárias grande quantidade de panelas de pólvora. Enquanto isto acontecia, as outras quatro fustas que constituíam a segunda linha continuavam a massacrar o inimigo com o fogo bem dirigido da sua artilharia. Além da capitânia, foram rapidamente afundadas a tiro de canhão mais nove fustas ou lancharas.

Completamente desorientados pelo vendaval de ferro e fogo que os estava açoitando, os tripulantes dos navios inimigos mais expostos iam-se lançando sucessivamente à água, onde, na sua maior parte, morriam afogados devido à força da corrente. No auge da contenda, um tiro perdido derrubou gravemente Bayaya Soora que se havia passado para uma fusta depois do afundamento da sua capitânia. Na tentativa de o salvar, o capitão dessa fusta, acompanhado por mais duas, forçou o caminho através da nossa armada em direcção à foz do rio, conseguindo, graças à sua ousadia, alcançar o mar largo.

Entretanto, o combate prosseguia encarniçado, nuns pontos à lança e à espada, noutros a tiro de espingarda e de bombarda. Uma após outra, as fustas e as lancharas do Achém iam sendo tomadas pelos portugueses, morrendo afogados a maior parte dos seus tripulantes quando tentavam a nado alcançar as margens. Apesar de se terem batido valentemente durante cerca de uma hora, os achéns começaram a desfalecer quando deixaram de ver o seu capitão-mor e começaram a sentir que a derrota era inevitável. Quase sem oferecer resistência, as guarnições das últimas fustas abandonaram-nas e procuraram fugir para terra, perecendo a maior parte dos seus tripulantes nesta tentativa.

A batalha chegara ao fim com uma vitória completa dos Portugueses. Dos cinquenta e oito navios que tinham entrado em acção (dois haviam ficado em Perlis) apenas três tinham conseguido escapar-se; dez foram afundados pela nossa artilharia e quarenta e cinco foram capturados! Do despojo faziam parte trezentas bombardas, das quais sessenta e duas com as armas do rei de Portugal, oitocentas espingardas e uma infinidade de lanças, terçados, arcos, flechas, crises (punhais) e azagaias, muitos deles guarnecidos com incrustações de ouro e pedraria. Dos inimigos morreram para cima de quatro mil; dos portugueses morreram oito, além de vinte e um escravos e marinheiros. Os nossos feridos foram em número de cento e quarenta e sete, dos quais sessenta e sete portugueses.

Ao saber da derrota dos achéns, o rei de Perlis, que andava fugido nas imediações, reuniu quinhentos homens e foi atacar de improviso os que tinham ficado na cidade, a maior parte deles doentes, chacinando cerca de duzentos. Seguidamente, meteu-se nas duas fustas que haviam sido deixadas por Bayaya Soora em Perlis e foi apresentar-se a D. Francisco de Eça, a quem agradeceu emocionado a libertação do seu reino, ao mesmo tempo que em sinal de eterna gratidão se declarava vassalo fiel do Rei de Portugal!

Reza a tradição que em Malaca, no preciso momento em que começou a batalha, o padre Francisco Xavier, que estava rezando a missa de Domingo, entrou em transe, ficando alheado de tudo quanto se passava à sua volta durante cerca de uma hora. Depois, com semblante alegre e sereno, pediu aos fiéis que agradecessem a Deus a grande vitória que acabava de conceder aos Portugueses.

Terminada a batalha, D. Francisco de Eça enviou imediatamente um balão a Malaca com a boa nova. Vinte dos navios inimigos capturados que se encontravam em pior estado foram queimados; uma das galeotas que tinha sido tomada por Diogo Soares ficou para este, que, poucos dias depois, continuou a sua viagem para o Pegú; as duas restantes galeotas e mais vinte e duas fustas e lancharas foram levadas para Malaca.
Como é fácil de imaginar, a chegada da nossa armada a esta cidade acompanhada por tão significativo despojo deu lugar a esfusiantes manifestações de regozijo.

Com esta espantosa vitória, os Portugueses assombraram mais uma vez o Sueste Asiático. Cresceu igualmente a fama de santidade de que o padre Francisco Xavier já gozava. Humilhados e confusos, os reis nossos inimigos convenciam-se de que efectivamente Deus nos ajudava e que, consequentemente, era inútil continuar a lutar contra nós.
Entretanto, o rei de Ugentana, por notícias que lhe trouxeram os balões que enviara em reconhecimento, soubera da derrota dos achéns ainda antes de ela ter sido confirmada em Malaca. Receoso que os Portugueses pudessem ter alguma idela sinistra a seu respeito... desapareceu discretamente!


Saturnino Monteiro
em «Batalhas e Combates da Marinha Portuguesa»

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Mensagem por Lusitano89 18th agosto 2011, 16:43

Batalha do Golfo de Oman - 10 a 25 de Agosto de 1554


Em fins de Fevereiro de 1554, largou de Goa, sob o comando de D.Fernando de Meneses, filho do vice-rei, uma armada que tinha como missão: em primeiro lugar, capturar as «naus de Meca» que nessa época do ano costumavam regressar ao mar Vermelho idas do golfo de Bengala ou de Achém; em segundo lugar, dar combate às galés turcas estacionadas em Baçorá se elas voltassem a sair para o mar. Compunha-se a dita armada de seis galeões (São Mateus, Santa Cruz, São Sebastião, São Tiago, São Lourenço e São Tomé), seis caravelas e vinte e cinco ou vinte e seis fustas e catures. Todos os navios iam muito bem equipados e municiados. Das suas guarnições faziam parte mil e duzentos portugueses, além dos habituais auxiliares canarins e malabares.

À chegada ao golfo de Adém, D. Fernando destacou um certo número de fustas e catures para a entrada do mar Vermelho a fim de investigarem o que por lá se passava. As informações que trouxeram foi que somente se encontravam em Moca três ou quatro das galeotas de Cafar.

Durante todo o mês de Março se conservou a armada de D. Fernando de Meneses cruzando no golfo de Adém sem que fosse avistada qualquer «nau de Meca». Será de supor que estas naus, tendo tido conhecimento da intensa actividade naval dos Portugueses naquela zona, tenham desistido das suas viagens. Em princípios de Abril, de acordo com as ordens que recebera de seu pai, D.Fernando dirigiu-se para Mascate, navegando ao longo da costa da Arábia. De caminho, desembarcou em Dofar, a fim de tentar conquistar um forte que os Fartaques tinham tomado aos Árabes da região, nossos aliados. Porém, depois de vários combates, acabou por desistir por não ter possibilidade, devido à ondulação, de desembarcar a artilharia pesada necessária para o bater.

Chegado a Mascate, D. Fernando de Meneses deixou aí o grosso da armada a «invernar» (passar a «monção») e seguiu para Ormuz com os navios de remo, acompanhando várias naus de mercadores e um galeão vindo de Goa, onde ia embarcado Bernardim de Sousa, nomeado capitão daquela praça em substituição de D. Antão de Noronha. Feita a entrega do cargo, foi o dito galeão mandado «invernar» também em Mascate, depois de nele ter sido embarcada a fazenda do capitão, dos fidalgos e dos soldados que nele haviam de regressar a Goa por terem terminado as suas comissões.

Em princípios de Julho, quando começaram a soprar os ventos de oeste, D. Fernando enviou três catures para a boca do Shatt al-Arab a fim de vigiarem as galés turcas. Utilizando barcos de pesca locais, alguns dos elementos das guarnições dos catures, provavelmente indianos, entraram no rio e foram mesmo a bordo das galés vender peixe! Desta forma ficaram sabendo que aquelas se estavam preparando activamente para sair para o mar. Moradobec fora substituído no comando da armada turca por Alecheluby, corsário afamado, a quem Solimão repetira a ordem de fazer regressar ao mar Vermelho quinze das galés que estavam em Baçorá.

Nos primeiros dias de Agosto, já com ventos firmes de oeste, Alecheluby deixou o Shatt al-Arab rumo ao estreito de Ormuz. Imediatamente um dos catures que ali se encontrava de vigia seguiu para Ormuz, a fim de alertar D.Fernando de Meneses, enquanto os outros dois acompanhavam à distância as galés turcas.

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Logo que D. Fernando soube que a armada turca já se encontrava no mar, meteu-se nos navios de remo e foi para Mascate, onde deixara a «invernar» os galeões e as caravelas. Também D. Antão de Noronha, que saía de capitão de Ormuz e a quem o Vice-Rei encomendara que amparasse o filho por ser ainda muito novo, se meteu numa galeota com quarenta soldados e tomou o rumo de Mascate, para onde, como já referimos, tinha mandado o galeão em que devia regressar a Goa. Por seu turno, Bernardim de Sousa, o novo capitão de Ormuz, não querendo ficar ocioso, mandou artilhar e guarnecer com gente de armas um galeão e três ou quatro naus de mercadores que ali estavam e preparou-se para, depois de as galés terem passado, ir postar-se na boca do Shatt al-Arab a fim de impedir que se pudessem recolher a ele se, tal como acontecera no ano anterior, fossem obrigadas a retroceder. Decisão particularmente acertada que denota uma excepcional visão estratégica e um elevado espírito de iniciativa.

Chegado a Mascate, D. Fernando de Meneses embarcou no seu galeão, que era o São Mateus, acompanhado de D. Antão de Meneses e de Manuel de Vasconcelos, que lhe serviam de mentores, e fez-se ao mar com toda a armada, rumo ao norte, ao encontro do inimigo, aproveitando os ventos gerais de sueste que durante o mês de Agosto predominam no golfo de Omã. É de supor que o galeão de D. Antão de Noronha tenha acompanhado a armada.

À frente iam os catures e as fustas em missão de exploração. Seguiam-se as caravelas e, por fim, os galeões. Qualquer destas três esquadras devia ir formada em linha, isto é, com os navios ao lado uns dos outros, e com intervalos relativamente grandes entre eles. No entanto, essas linhas deviam ser bastante irregulares, uma vez que os Portugueses, de um modo geral, não se preocupavam com o rigor das formaturas. Na mente dos nossos capitães, a preocupação de ser o primeiro a abordar o inimigo prevalecia sobre quaisquer outras considerações de ordem táctica.

A 10 de Agosto, pela manhã, estando as nossas fustas e catures já muito perto do cabo Mussandão, começaram a avistar as galés turcas que estavam precisamente a dobrar aquele cabo, passando entre ele e uma ilhota que lhe fica fronteira. Vinham a navegar à vela e, logo que aproaram a sul, cingiram-se o mais possível ao vento, que naquela zona ainda soprava de oeste, seguindo em coluna ao longo da costa. Pouco depois, eram avistadas pelas nossas caravelas e galeões, que foram imediatamente ao seu encontro aproveitando o vento que na zona onde se encontravam soprava de WSW e SW.

De bordo das galés turcas o espectáculo devia ser impressionante. Na sua frente estendia-se uma muralha de cerca de quarenta velas que parecia intransponível. Mas Alecheluby não perdeu o sangue-frio e logo começou a idealizar a forma de sair da ratoeira em que se encontrava. Confiadamente, continuou em frente, permitindo que a distância aos navios portugueses continuasse a diminuir rapidamente, uma vez que as duas armadas iam praticamente a navegar a contra-bordo. Pouco depois, começava o duelo de artilharia entre as galés que iam à frente e as nossas fustas, a que um pouco depois se juntou o galeão Santa Cruz. O mar principiou a cobrir-se de pequenas nuvens de fumo negro resultantes dos disparos e em volta dos navios empenhados no combate começaram a levantar-se as «gerbes» resultantes da queda dos projécteis.

A bordo dos navios portugueses o ambiente era de franco optimismo. Capitães, fidalgos e soldados tinham como certo que em breve viriam às mãos com os turcos e não duvidavam que os esmagariam. Mas D. Antão de Noronha, que no íntimo se considerava o verdadeiro capitão-mor da armada, não queria correr riscos desnecessários. Vendo que o galeão Santa Cruz se adiantara bastante em relação ao resto da armada e que a coluna turca avançava directamente contra ele, receou que se o vento caísse lhe pudesse vir a acontecer o mesmo que tinha acontecido ao galeão de Gonçalo Pereira Marramaque no estreito de Ormuz no ano anterior. Como sabia que o Santa Cruz tinha pouca gente, passou-se para a sua galeota e foi-lhe meter dentro um reforço de trinta soldados, após o que voltou para o São Mateus, para junto de D. Fernando.

Entretanto o vento refrescara, fixando-se em sudoeste, o que fez aumentar a velocidade e a capacidade de manobra dos nossos navios de alto bordo. Mais alguns minutos e as nossas caravelas estariam em cima das galés! Foi então que Alecheluby desferiu o golpe que estivera preparando. A uma ordem sua, todas as galés, que já haviam sido devidamente prevenidas, arriaram as velas e, navegando a remos, executaram uma guinada simultânea para EB (um «turn», como hoje diríamos), aproando à ponta Lima, que era aproximadamente a direcção donde vinha o vento. Com esta manobra as galés turcas afastaram-se rapidamente dos navios portugueses, acabando pouco depois por ficar a barlavento de toda a nossa armada! Por mais que as caravelas e os galeões puxassem tudo para a orça, nenhum deles conseguiu chegar à ponta Lima antes de as galés a terem dobrado!

Em todos os nossos navios a decepção era profunda. No São Mateus, os principais capitães portugueses, colhidos de surpresa pela superior capacidade táctica dos turcos, discutiam acaloradamente acerca da forma de alcançar as galés sem chegarem a qualquer conclusão. Por fim, um piloto «velho» conseguiu fazer-se ouvir. Dizia ele que embora naquela época do ano predominassem no golfo de Oman os ventos de sueste, havia junto à costa da Pérsia ventos que davam para navegar para leste. Afirmava que já tinha feito por ali a viagem de Ormuz para Mascate e propunha que a armada atravessasse imediatamente para a outra costa, única maneira de conseguir alcançar Mascate antes de os turcos lá chegarem. À falta de melhor, a sugestão foi aceite, e, entregando-se aos caprichos de Eolo, D. Fernando de Meneses mandou fazer rumo para a costa da Pérsia. Afinal o piloto tinha razão. Encontrando ventos propícios, a armada portuguesa, navegando a curta distância de terra, progrediu rapidamente para leste. Quando pareceu aos pilotos que já deviam ter Mascate para ré do través, voltou a atravessar o golfo de Omã com vento largo e conseguiu alcançar Mascate sem dificuldade. Aí chegados, receberam os portugueses a agradável notícia de que as galés turcas ainda não haviam passado. A manobra resultara em cheio!
Antes de deixar a costa da Arábia, D. Femando tinha destacado um certo número de fustas e catures para irem acompanhando as galés e levarem para Mascate informações relativas à sua posição. À chegada a esta cidade despachou outro grupo de fustas para irem para norte, junto à costa, ao encontro daquelas.

Dois ou três dias se conservou a armada portuguesa em Mascate, aproveitando para fazer aguada e dar um pouco de descanso às guarnições. Entretanto, a armada turca arrastava-se penosamente ao longo da costa da Arábia, navegando exclusivamente a remos, o que a obrigava a fundear de tantas em tantas horas para dar repouso às chusmas. À distância, acompanhavam-na alguns catures e fustas portuguesas sempre vigilantes. Perto dos ilhéus que ficam defronte do cabo Suadi apareceram mais fustas pela proa, obviamente vindas de Mascate. Apesar de tudo, Alecheluby não estava preocupado. A persistência dos ventos gerais de sueste, embora exigisse um enorme esforço dos remadores, o que lhe era indiferente, constituía a melhor garantia de que as caravelas e os galeões portugueses que tinha deixado para trás não seriam capazes de o alcançar. O mais provável, pensava, era que tivessem recolhido a Ormuz.

Ao romper do dia 25 de Agosto as fustas que alguns dias antes tinham saído de Mascate regressaram com a informação de que haviam deixado as galés junto ao cabo Suadi e que, portanto, já deviam estar muito próximas. D. Fernando de Meneses mandou imediatamente suspender e fez-se ao mar com todos os navios vistosamente embandeirados e prontos para combate, jurando a si próprio que desta vez não havia de deixar escapar os turcos. Como habitualmente, seguia à frente uma linha de fustas, depois uma linha de caravelas e por último uma linha de galeões. Nessa altura o vento era moderado de leste, o que permitia aos nossos navios navegar praticamente à popa arrasada.

Como os portugueses iam a navegar à vela projectando-se sobre um horizonte de mar e os turcos vinham a navegar a remos projectando-se sobre a terra, era inevitável que avistassem a nossa armada muito antes de poderem ser avistados por ela. De começo, Alecheluby não se alarmou. Convencido de que a armada portuguesa estava muito para trás, pensou que as velas que começavam a avistar-se eram de navios mercantes que se dirigiam para Ormuz. Mas vendo que o seu número continuava a aumentar, acabou por compreender que, por razões que lhe escapavam, era novamente a nossa armada que tinha diante de si. Não obstante, apesar de se encontrar numa situação que parecia desesperada, não se desorientou. Partindo do princípio de que ainda não teria sido avistado pelos portugueses, aproximou-se ainda mais da costa, acabando por ficar encoberto por uma ponta de terra, onde, provavelmente, se terá deixado ficar à espera que os nossos navios passassem.

De bordo destes, as galés turcas só terão sido avistadas, já a curta distância, quando deixaram pelo través de BB a ponta de terra acima referida. Nessa altura, as galés lançaram-se à voga arrancada para barlavento, ao longo da costa, exactamente como tinham feito quinze dias antes no cabo Mussandão. Surpreendidos, os capitães dos nossos galeões e caravelas apressaram-se a guinar para BB e, orçando o mais possível, procuraram alcançar a costa que tinham pela proa antes de as galés lá chegarem.
O navio português que ia a navegar mais próximo de terra e que, consequentemente, parecia ter maiores possibilidades de interceptar as galés era a capitânia de D. Fernando de Meneses, o galeão São Mateus. Mas como levava as vergas braceadas no limite andava relativamente pouco e abatia muito. Com a respiração suspensa, a guarnição não tirava os olhos da coluna de galés que voavam sobre as águas com os chicotes dos comitres flagelando sem piedade as costas dos remadores. Estando o galeão ainda a uma certa distância da costa, a primeira galé cortou-lhe a proa passando-se para barlavento! E, logo a seguir, outra... e outra... e outra ... ! Não havia hipótese de chegar a tempo! As galés iam, mais uma vez, escapar-se! Foi então que alguém lançou para o ar a ideia de fundear para, ao menos, poder disparar a artilharia contra elas. Atabalhoadamente foi largado um ferro e carregado o pano. Lentamente, o galeão começou a fazer cabeça ao vento, enquanto os bombardeiros, tensos, aguardavam de morrões acesos. Finalmente o galeão ficou paralelo à coluna de galés e a pequena distância delas. Já nove tinham passado quando as bombardas do São Mateus começaram a disparar. Tiros curtos... tiros compridos... Em silêncio absoluto, os soldados e os marinheiros sustinham a respiração. De súbito, um pelouro de grosso calibre acertou em cheio na décima galé, metendo-lhe a borda dentro, quebrando-lhe muitos remos e matando-lhe numerosos remadores de BB. Impulsionada pelos remos de EB a galé atravessou-se instantaneamente. E foi o fim! Como as galés iam muito perto umas das outras a navegar a grande velocidade, quando a dianteira estacou, as que seguiam atrás dela não tiveram tempo de se desviar nem de estacar e roçando umas pelas outras partiram as apelações (conjunto de remos) e ficaram imobilizadas!

A bordo da nossa capitânia era o delírio! Já muito perto vinham as caravelas, qual matilha enfurecida, sequiosa de sangue. A primeira era a de D. Jerónimo de Castelo Branco. Ao passar muito perto da popa do São Mateus, um seu irmão que estava no chapitéu deste gritou-lhe entusiasmado: -Vara-me essa caravela, rapaz!- D. Jerónimo não fez a coisa por menos. Com o pano todo em cima meteu-se pelo meio das duas primeiras galés da molhada, até dar em seco. Cada caravela tinha somente vinte soldados; cada galé teria pelo menos cinquenta. Mas o maior bordo livre das caravelas era um factor decisivo no combate à abordagem, sobretudo porque permitia aos portugueses usar à vontade a sua arma preferida: as panelas de pólvora. Mal a nossa caravela se prolongou com as duas galés começou a lançar-lhes para dentro panelas de pólvora umas atrás das outras. Queimados pelas chamas e entontecidos pelas explosões, os seus remadores lançavam-se à água e os soldados desordenavam-se. Aproveitando a confusão, D. Jerónimo saltou para a galé que tinha por BB, com quinze soldados, e à lança e à espada matou os turcos todos que lá se encontravam e que não tiveram tempo de saltar para a água. Mas já vinha chegando a caravela de D. Manuel de Mascarenhas, que aferrou por BB a outra galé que D. Jerónimo já tinha aferrado por EB e logo mimoseou com nova chuva de panelas de pólvora. Com a sua guarnição quase toda queimada e completamente desmoralizada, esta galé foi facilmente tomada por D. Manuel de Mascarenhas, que imediatamente foi atacar a terceira galé. Nesta, o combate foi mais renhido, mas os turcos acabaram por ser todos mortos ou obrigados a lançar-se à água. E eis que mais duas caravelas entram de rompante na contenda: a de António Valadares e a de Fernando Monroi. Cada um deles aferra uma galé, lança-lhe para dentro numerosas panelas de pólvora e a seguir varre-a de proa à popa à lança e à espada. Após violentos combates, estas duas galés são tomadas. A última galé terá ficado para as caravelas de Nun'Álvares de Castro e de Jorge de Moura, as últimas a chegar. Depois de uma curta resistência, foi também tomada. Em menos de meia hora, seis galés turcas tinham caído nas mãos dos portugueses com quarenta e sete canhões de bronze, sendo alguns deles basiliscos, esperas, camelos e águias, ou seja, canhões de grosso calibre.

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Enquanto prosseguia o combate entre as caravelas e as galés, as nossas fustas metiam-se entre estas e a terra e matavam à lançada todos os turcos que tentavam alcançar a costa a nado. Com as nove galés que lhe restavam, pairando a barlavento, Alecheluby assistia consternado à destruição das seis que tinham ficado para trás na esperança de que alguma ainda se pudesse escapar. Mas em breve se desenganou. Agora, a única coisa que lhe restava fazer era tentar salvar as que tinha consigo. Uma vez que em fins de Agosto predominam no mar da Arábia os ventos de sudoeste, optou por se dirigir à vela para o golfo de Cambaia.

Terminada a batalha, D. Fernando de Meneses deu ordem às caravelas para irem no encalço de Alecheluby e recolheu a Mascate com os galeões, as fustas e as seis galés turcas que haviam sido capturadas. Ali se demorou vários dias, festejando a vitória, baptizando as galés e guarnecendo-as com gente que tirou dos outros navios. Por fim, dirigiu-se para Goa, onde chegou nos primeiros dias de Novembro. De estranhar que, pelo menos, não tenha mandado as galés e algumas fustas para o golfo de Cambaia para apoiar as caravelas que, no caso de falta de vento, se poderiam ver em sérias dificuldades perante as nove poderosas galés turcas.
Entretanto, esforçavam-se aquelas por alcançar as galés, o que não era fácil porque lhes levavam um avanço considerável e iam a navegar com vento de alheta, o que lhes conferia uma velocidade pouco inferior à sua.
Finalmente, já muito perto da costa indiana, as caravelas de António Valadares e de Fernando Monroi, provavelmente as que iam mais adiantadas, avistaram as galés turcas. Mas estas não estavam dispostas a combater. Com vento fresco e mar de vaga, indo a navegar bastante dispersas e, possivelmente, com falta de água, só pensavam em escapar-se. Vendo já muito perto as nossas caravelas, as duas galés que iam mais atrasadas optaram por se dirigir para a costa, onde vararam e se desfizeram, uma junto de Damão e a outra um pouco mais abaixo, perto de Danu. As restantes sete dirigiram-se para Surat, em cujo porto conseguiram entrar antes de serem alcançadas pelas caravelas de D. Jerónimo de Castelo Branco, Nun'Álvares de Castro e Manuel de Mascarenhas, que as ficaram bloqueando, fundeadas do lado de fora do «poço».

Neste meio tempo, as caravelas de António Valadares e de Fernando Monroi dirigiram-se para Baçaim, onde chegaram a 20 de Setembro. Desta cidade partiram imediatamente doze fustas para Surat a fim de reforçarem as três caravelas que estavam bloqueando as galés. Poucos dias depois, quando a notícia dos acontecimentos do golfo de Oman chegou a Chaul, partiram também dali outras doze fustas com o mesmo fim.

A 23 de Setembro fundeou na barra de Goa uma nau do Reino que trazia um novo vice-rei: D. Pedro de Mascarenhas. Pela mesma altura chegava também a Goa um catur vindo de Mascate com a notícia da vitória alcançada pela nossa armada sobre os Turcos, bem como outros, vindos de Baçaim e de Chaul, dando conta da presença das sete galés em Surat. Tratou logo o novo vice-rei de organizar uma armada destinada a acabar de vez com aquelas e a 10 de Outubro largaram de Goa, com destino a Surat, dois galeões e trinta navios de remo sob o comando de Fernão Martins Freire, sobrinho de D. Pedro de Mascarenhas.

De notar que nesta altura, além das armadas ordinárias, tinham os Portugueses empenhados na guerra contra os Turcos oito galeões, seis caravelas e oitenta e seis galés, galeotas, fustas e catures, o que dá bem ideia da formidável potência naval que Portugal era então, apesar de todas as dificuldades de ordem financeira com que se debatia o Tesouro.
Chegado a Surrate, Fernão Martins intimou o capitão da cidade a que, nos termos do tratado de paz em vigor, lhe entregasse os turcos e as galés ou então que mandasse queimar estas. Escusou-se aquele, alegando que os turcos se tinham metido pela terra dentro e que já não havia nenhum na cidade. Quanto às galés, dizia que não lhe convinha entregá-las nem queimá-las porque temia represálias dos Turcos contra as naus de Cambaia que todos os anos, com «cartazes» dos Portugueses, iam ao mar Vermelho. Em contrapartida, propunha-se mandá-las cortar, cada uma delas, em três partes. Levado o assunto ao conhecimento do Vice-Rei, este anuiu. Na presença dos capitães portugueses, cada uma das sete galés que restavam da armada de Alecheluly foram serradas em seis bocados, ficando completamente inutilizadas. Deixando dez fustas a patrulhar o golfo de Cambaia, Fernão Martins Freire regressou a Goa, onde chegou nos primeiros dias de Novembro, praticamente ao mesmo tempo que D. Fernando de Meneses.

Desta forma terminou a campanha iniciada havia dois anos quando os Turcos tentaram apoderar-se de Ormuz com o fim de assegurarem as ligações marítimas entre Suez e Baçorá. Das vinte e cinco galés que empenharam nas operações com ela relacionadas, perderam seis em combate, três por encalhe fortuito ou deliberado e sete por internamente e posterior inutilização. Restavam-lhes duas no mar Vermelho e sete no Shatt al-Arab. Destas últimas, duas acabariam por ser queimadas pelos Persas por volta de 1555 e outras duas por ser tomadas pelos nossos em Barém, em 1559.
Para a vitória final dos Portugueses foram factores preponderantes a abundância de meios navais de que então dispunham na Índia, o receio que os Turcos tinham de se baterem com eles no mar e a forma inteligente como o vice-rei D. Afonso de Noronha movimentou as nossas armadas. Ao mesmo tempo que conservava as galés turcas encurraladas em Baçorá, contra-atacou, cortando as comunicações do mar Vermelho com o exterior, «jogada» que levou à desintegração do dispositivo naval turco no Índico.

De assinalar que em resultado da destruição da armada turca, e apesar de os Turcos continuarem senhores de Adém, as comunicações entre a Índia e a Abissínia foram restabelecidas. Outro ponto interessante a ter em conta é que em 1555 Solimão fez a paz com a Pérsia. Mera coincidência ou consequência directa da destruição da sua armada do Índico pelos Portugueses? Seja como for, a batalha do golfo de Oman coincide com o fim da expansão do Império Otomano para Leste.


Saturnino Monteiro
em «Batalhas e Combates da Marinha Portuguesa» (Vol.III)

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Mensagem por Fundador 7th março 2012, 18:36

Um vídeo dedicado aos Descobrimentos portugueses.


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Mensagem por Orban89 12th agosto 2015, 14:57

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A Expansão Portuguesa Empty Ceuta, prosseguimento da Reconquista

Mensagem por Sérgio Sodré 10th junho 2019, 20:38

Lusitano89 escreveu:O Inicio de uma nova Era
....
O primeiro grande marco que assinala o início da expansão portuguesa teve lugar em Marrocos. Trata-se, como é bem sabido, da conquista de Ceuta, que ocorreu em 1415.
....
Carreira da Índia

Não início da expansão, mas prosseguimento da reconquista... A Ceuta visigoda e cristã fora conquistada pelos árabes muçulmanos do califado de Damasco em 709.
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