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Os Heróis esquecidos da nossa História

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Mensagem por Orban89 24th março 2023, 17:26

Bento de Góis
O Marco Polo Português

Os Heróis esquecidos da nossa História Gois


Foi o primeiro europeu a percorrer o caminho terrestre da Índia para a China, através da Ásia Central. A sua viagem, uma das maiores explorações da história da humanidade, demonstrou que o reino de Cataio e o da China eram afinal o mesmo, o que alterou significativamente a concepção do mundo à época, uma vez que as relações comerciais entre a Ásia e a Europa eram muito intensas durante esse período.

Bento de Góis foi baptizado em Vila Franca do Campo nos Açores a 9 de Agosto de 1562, com o nome de Luís Gonçalves. Tornou-se soldado por volta dos vinte anos de idade, tendo sido destacado, em 1583, para a Índia.

De acordo com a lenda, nesse período levava uma vida boémia até que após ter tido uma visão, numa igreja da aldeia de Colachel (província de Travancor) decidiu ingressar na Companhia de Jesus, o que fez, em Fevereiro de 1584, no Colégio dos Jesuítas em Goa. Dois anos mais tarde, abandonou temporariamente o Colégio e viajou pela Pérsia, Arábia, Baluchistão, Sri Lanka, e muitos outros reinos da Ásia. Em 1588 regressou a Goa, ao Colégio dos Jesuítas, e mudou o seu nome para Bento de Goes.

Em 1594 integrou a 3º expedição dos Jesuítas, guiada desta vez pelo padre Jerónimo Xavier (sobrinho-neto de São Francisco Xavier), à corte do Grão-Mogol Akbar, o Grande, em Lahore, passando a granjear deste uma marcada amizade. Tanto que induziu Akbar, o Grande, a estabelecer tréguas com os portugueses. Para tal, Akbar incumbiu Bento de organizar uma faustosa embaixada (1600-1601) aos portugueses de Goa.

Em Setembro de 1602 Bento partiu de Goa com um grupo restrito, em busca do lendário Grão-Cataio, reino onde se afirmava existirem comunidades cristãs nestorianas. A viagem era muito extensa (mais de 6 mil quilómetros) e de longa duração (mais de três anos), e onde grandes obstáculos se deparam ao longo do percurso, sobretudo em virtude dos muitos conflitos na região, da profusão de reinos e estados, e da existência de grandes montanhas e desertos. Para além disso, a maior parte do seu percurso foi realizado em territórios de domínio muçulmano que nutriam especial animosidade pelos cristãos.

Em inícios de 1606 Bento de Góis chegou a Sochaw (Suzhou, agora denominada Jiuquan), junto da Muralha da China,uma cidade próxima de Dunhuang na provincia de Gansu. Góis provou assim que o reino de Cataio e o reino da China eram afinal o mesmo, tal como a cidade de Khambalaik, de Marco Polo, era efectivamente a cidade de Pequim. Doente (possivelmente por ter sido atacado/assaltado e ferido) e com poucos meios de subsistência comunicou-o em carta ao padre Matteo Ricci, residente em Pequim, que lhe enviou o padre João Fernandes, um jesuíta de origem chinesa, para o conduzir até Pequim. Contudo, quando este alcançou Bento de Góis este já estava à beira da morte, o que ocorreu em 11 de Abril de 1607.

Bento de Góis, que possuía um marcado conhecimento da cultura e costumes de múltiplos reinos da Ásia, e falava diversos idiomas como o Persa e o Turco, registou a sua viagem num diário. Contudo, pelo facto de no mesmo documento também registar as dívidas que terceiros lhe deviam o seu diário foi rasgado em inúmeros pedaços pouco antes da sua morte. O padre João Fernandes e o arménio Isaac, que acompanhou o missionário na longa viagem desde Goa, reuniram fragmentos do que sobrou desse diário e outros documentos, que entregaram posteriormente ao padre Matteo Ricci. Este padre, um grande erudito, através desses escassos documentos, do relato do arménio Isaac que o acompanhou sempre ao longo da Grande Odisseia, e de algumas cartas que Bento de Góis lhe tinha enviado anteriormente, escreveu, entre 1608 e 1610, uma narrativa dessa viagem. Esta relativa escassez de registos teve influência na projecção que a sua viagem assumiu doravante.

Bento de Góis tornou-se o primeiro português a atravessar a Ásia Central, transpondo grandes cadeias montanhosas como os Pamires e o Karakoram, ou o grande deserto de Gobi, numa odisseia considerada por muitos historiadores não inferior à empreendida por Marco Polo séculos antes. Polo atravessou um território mais pacífico, menos retalhado em reinos e estados, e com menor domínio muçulmano, do que Bento de Góis encontrou à data. Aliás, Bento de Góis foi a primeira pessoa após Marco Polo a empreender esta extensa viagem pela Ásia Central, o que realizou cerca de três séculos depois de Polo. Bento de Góis tem sido em Portugal, entre os exploradores portugueses da época dos Descobrimentos, dos mais subvalorizados. Tal pode ser atestado pelo facto de, no 4º centenário da sua morte não se verificarem quaisquer comemorações em Portugal continental, apenas se verificando tais celebrações na sua terra natal, Vila Franca do Campo, apesar de se tratar do maior explorador terrestre português.

A Câmara Municipal de Vila Franca do Campo homenageou-o em 1907, atribuindo o seu nome ao maior largo da vila, onde também se encontra uma estátua sua em bronze, da autoria de Numídico Bessone, inaugurada em 1962.

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Mensagem por Orban89 24th março 2023, 17:27

Duarte Lopes


Em 1578, partia de Lisboa, com destino a Luanda, um português chamado Duarte Lopes, acompanhando um seu tio que seguia para África com diversas mercadorias. Os portugueses ensaiavam então uma primeira fixação definitiva nesta região, com a fundação de Luanda três anos antes, por Paulo Dias de Novais. Os contactos com o reino do Congo eram, porém, muito anteriores. Na verdade, contavam já com quase um século, desde que Diogo Cão chegara à foz do Zaire e fora bem recebido pelas tribos locais. Duarte Lopes teve ocasião de conhecer com alguma profundidade a região, efectuando diversas viagens no interior do continente que o tornaram no primeiro grande explorador europeu de África. Vamos hoje acompanhar alguns passos da sua vida, assim como a obra que nos deixou, chamada de "Relação do Reino do Congo e das terras circumvizinhas".

Conhece-se muito pouco da vida de Duarte Lopes. Sabe-se que terá nascido em Benavente em meados do século XVI, de família cristã-nova, e ignora-se a data da sua morte. Os dados da sua biografia referem-se sobretudo à sua estadia no reino Congo. Aqui viveu durante alguns anos, até 1584. Durante este tempo, Duarte Lopes viajou por diversas regiões de África, em parte graças aos favores do rei do Congo, que conseguiu captar, em parte devido à sua curiosidade e espírito aventureiro. No decorrer de tais viagens recolheu um vasto conjunto de informações, que mais tarde viriam a ser publicadas, e que constituem a primeira descrição fidedigna do interior de África. Por esta altura, os portugueses detinham um conhecimento de África que só muito mais tarde veio a ser suplantado. Todos conhecemos as viagens pioneiras de Livingstone e de Stanley, e também dos portugueses Serpa Pinto,  Hermenegildo Capelo e Roberto Ivens, no século XIX. Estes homens exploraram o interior de África, mas não foram os primeiros, ao contrário do que muitas vezes se julga. Já alguns portugueses, entre os quais Duarte Lopes, haviam dados os primeiros passos. A este propósito escreveu um historiador belga, no século XIX:

Comparando uma carta de África, feita no ano de 1850, antes das viagens de Barth, Livingstone e Speke, com uma carta dos fins do século XVI, depois das grandes explorações de Diogo Cão, Francisco Gouveia e Duarte Lopes, vê-se que o interior desse continente era muito menos conhecido há 30 anos do que há 300 anos”.

Em 1585, após as suas viagens, Duarte Lopes regressa à Europa. A sua posição no interior do reino do Congo era tal que é nomeado embaixador deste reino junto do agora rei de Portugal Filipe I, e também junto do Papa. O Congo era nesta altura um reino cristão, mas havia uma situação de tensão e conflito com os portugueses estabelecidos em Angola. Duarte Lopes não consegue os seus objectivos junto do rei de Portugal, e segue para Roma, onde o Papa Sisto V o recebe favoravelmente. A política do rei do Congo nesta época, de que Duarte Lopes era porta-voz, era a de obter margem de manobra e apoio que contrabalançasse o peso crescente dos portugueses de Luanda, que ameaçavam o seu poder local e o seu prestígio.

É em Roma que Duarte Lopes entra em contactado com o humanista Filippo Pigafetta, certamente interessado em obter informações acerca do continente africano, que o português parecia conhecer tão bem. Dos contactos entre as duas personagens viria o italiano a escrever uma obra, chamada de “Relação do reino do Congo e das terras circumvizinhas”, que sairia em 1591. Na verdade, não sabemos se o italiano escreveu directamente dos relatos de Duarte Lopes, nem se este acompanhou de perto a redacção do texto. Desta forma, é impossível distinguir o que proveio das informações do português do que foram os acrescentos e correcções do humanista italiano.

Mas tal não diminui o interesse da “Relação”. Nela o autor mistura descrições do Congo e das suas diversas regiões com a história do reino desde a chegada dos portugueses, onde estão patentes as diferenças com a mentalidade europeia, mas igualmente o sentimento de curiosidade e interesse pela civilização africana. Eis como Lopes e Pigafetta descrevem os habitantes da terra:

Os homens e mulheres são negros, alguns menos, tirando mais a baço, e têm os cabelos crespos e negros, alguns também vermelhos, a estatura dos homens é de mediana grandeza, e tirando-lhes a cor negra, são parecidos com os Portugueses: as pupilas dos olhos de diversas cores, negras e da cor do mar, e os lábios são grossos, como os Núbios e outros negros, e assim os seus rostos são cheios e subtis e váriados como nestas regiões, não como os negros da Núbia e da Guiné, que são disformes.”

Esta obra conheceu uma rápida expansão por toda a Europa, tendo sido traduzida pouco depois para outras línguas, o que revela o interesse que este tema despertava na época. Pigafetta fez acompanhar o texto com uma série de desenhos e ilustrações supostamente baseadas no relato de Duarte Lopes. Mas estas mostram que quem as desenhou nunca esteve em África: os habitantes parecem europeus, as cidades congolesas assemelham-se à Roma Clássica e mesmo os animais não têm correspondência com a realidade: a zebra, por exemplo, é claramente um cavalo pintado às riscas.

Noutros aspectos, provavelmente os que provêm mais directamente de Duarte Lopes, a obra revela rigor e cuidado. A descrição da capital do reino, S. Salvador do Congo (no Norte da actual Angola) e das suas diversas províncias, assim como a história do reino desde a chegada dos portugueses, é muito interessante e provavelmente fidedigna. É particularmente curiosa a forma como descreve as alterações que a conversão do rei ao Cristianismo e o contacto com os portugueses provocaram ao nível do quotidiano e do vestuário local:

Antigamente este rei e os seus cortesãos vestiam-se de panos de palma, com os quais se cobriam da cintura para baixo, apertando-os com cintos feitos da mesma matéria e de belos lavores; no ombro traziam um rabo de zebra preso a um cabo, por ser de uso antigo naquelas regiões; na cabeça tinham carapuças de cor amarela e encarnada; andavam descalços a maior parte deles. Mas depois daquele reino ser cristianizado, os grandes da corte começaram a vestir-se à moda dos portugueses, trazendo mantos, capas, tabardos de escarlata e de telas de seda; na cabeça, chapéus e barretes, nos pés, alparcas de veludo, de couro, e borzeguins à moda portuguesa. Logo que o rei se converteu ao Cristianismo, reformou também a sua corte de certo modo imitando a de Portugal, e principalmente quanto ao modo de estar à mesa. Possui baixela de ouro e de prata, com um salva para comer e beber.”

Duarte Lopes regressou novamente a Madrid, onde voltou a contactar Filipe II e a informá-lo das vantagens de intervir no Congo e de promover o relacionamento com aquele rei. Lopes pretendia provavelmente incrementar a acção evangelizadora naquela região de África, invocando para tal o interesse da Coroa Portuguesa nas possíveis riquezas, como ouro e prata, que estariam hipoteticamente por descobrir no interior do reino. Nada mais conhecemos da sua vida, nem sequer se alguma vez regressou a África. Apenas conhecemos a “Relação do Congo”, que permaneceria durante muito tempo como a mais importante descrição de um reino africano.

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Mensagem por Orban89 24th março 2023, 17:30

O outro Matias de Albuquerque


Para estudarmos a História dos portugueses no Oriente no período dos Descobrimentos necessitamos de compreender um pouco a forma como funcionava a “carreira militar”, digamos assim, dos homens que partiam para a Índia. A vida de Matias de Albuquerque constitui um bom exemplo do nobre guerreiro típico, que passou toda a sua vida no Oriente ao serviço de El-Rei de Portugal. A partida numa armada para a Índia era uma uma boa oportunidade para prestar serviços, conseguir mercês do rei, ou mais simplesmente fazer fortuna. No caso de um elemento da alta nobreza, como o presente caso, era uma forma de conseguir tudo isto. Foi de facto, o que conseguiu Matias de Albuquerque, que conseguiu aliás atingir o topo da hierarquia do Estado, mas que não deixou de ser atingido pelas contingências da sua própria carreira.

Matias de Albuquerque nasceu em Lisboa em 1547, de família da alta nobreza (o famoso Afonso de Albuquerque era seu tio-avô). Cerca de 1559 entra ao serviço do rei D. Sebastião, tendo sido educado como convinha a um fidalgo. Aos 19 anos parte como soldado para a Índia. Recebeu o seu baptismo de fogo numa expedição marítima no Malabar, na costa ocidental indiana, comandada por Álvaro Pais de Souto Maior, tendo aí prestado os seus primeiros serviços. Logo aqui se revelou um excelente soldado, bom organizador e comandante militar. Esta era uma característica essencial na vida militar de então, sobretudo no Oriente, onde o papel do vigor pessoal dos capitães tinha muitas vezes um efeito decisivo no desfecho de uma batalha. Nos anos seguintes Matias de Albuquerque prestou serviços em diversas regiões do Estado da Índia, nomeadamente em Damão, Goa, Chalé e Cochim. Em 1572, com apenas 25 anos de idade, Matias de Albuquerque recebe os primeiros louvores por parte do rei, que lhe reconheceu os serviços, sendo-lhe concedida a capitania da fortaleza de Ormuz, no Golfo Pérsico. Esta era uma das mais ricas e rendosas fortalezas do Oriente, pelo que a sua atribuição a Matias de Albuquerque revela quer a sua origem nobre, quer a qualidade dos serviços prestados. Porém, apenas exercerá este cargo mais tarde.

Em 1574, ao que parece devido a doença, Matias de Albuquerque regressou a Portugal, sendo recebido por D. Sebastião em Almeirim. Aqui prosseguiu a vida militar, tendo prestado serviço em Almada e no Algarve.

Em 1575 o nosso homem regressa á Índia, desta vez com um cargo de maior responsabilidade: capitão de uma armada que parte directamente de Lisboa a socorrer a fortaleza portuguesa de Malaca. Esta era uma das praças mais importantes do Estado da Índia e a chave da presença portuguesa no Extremo Oriente, nomeadamente do rico comércio com a China e o Japão, e encontrava-se seriamente ameaçada pelas forças do sultanato de Achém, tradicional inimigo dos portugueses. A situação era difícil, e o próprio facto de ter sido enviada uma armada directamente de Lisboa é um bom indicador da sua gravidade. Porém, Matias de Albuquerque foi bem sucedido na sua empresa, conseguindo afastar a ameaça que pairava sobre Malaca e garantir novamente a segurança na região para a navegação portuguesa. O êxito desta missão abriu-lhe novas portas: chegado a Goa, que era o centro da administração de todo o Estado da Índia (que ía de Moçambique ao Japão) foi nomeado comandante da armada de patrulhamento da costa do Malabar (1580-1584), após o que, por fim, entrou na capitania de Ormuz, para a qual tinha sido anteriormente nomeado. Aqui procedeu aos trabalhos de reparação da fortaleza, que se encontrava em mau estado, tendo inclusivamente mandado construir grandes cisternas. Foi este período uma época de pausa na sua vida de guerreiro, continuada com a decisão de voltar novamente a Portugal, o que faz em 1588.

Após voltar novamente a Portugal, onde casou com D. Filipa de Vilhena e defendeu Lisboa dos ataques do famoso corsário inglês Francis Drake (em 1589), Matias de Albuquerque foi, finalmente, designado para o mais alto cargo na Índia: o de vice-rei. Partiu então de Lisboa em 1590 para ocupar o cargo, que exerceu entre 1591 e 1597, seis anos portanto, o dobro do tempo habitual que era geralmente exercido por um vice-rei. Aqui, Matias de Albuquerque aplicou todas as suas capacidades de organização e comando para resolver os grandes problemas com que os portugueses se confrontavam, cada vez com maior gravidade. Estes resultavam quer do agravamento geral da situação do Estado da Índia, quer da má gestão e erros cometidos por vice-reis e governadores anteriores. Os principais problemas diziam respeito á má situação financeira, á corrupção generalizada e situação preocupante quer do estado das armadas e das fortalezas, quer da própria carência de soldados.

A sua principal e primeira preocupação foi a de mandar fortificar imediatamente as fortalezas, assim como enviar socorros militares ás que corriam maiores riscos. Também reorganizou o aparelho fiscal e da justiça e governou com a prudência e o rigor que se tornavam cada vez mais necessários. É evidente que não foi isento de defeitos e de suscitar inimizades, sobretudo por parte dos jesuítas e da Inquisição. Estas inimizades resultavam sobretudo da sua acção contra a corrupção e o clientelismo, o que desagradava evidentemente a parte da gente que rodeava o vice-rei, quer funcionários quer fidalgos.

Em 1597 regressa a Portugal, mas a sua partida foi marcada por um episódio grave: estando prestes a partir, uma das naus pegou fogo, perdendo assim uma parte considerável dos bens e da sua riqueza, que esperava enviar com destino a Portugal. Regressado ao reino, recolheu-se á sua quinta de Santo Amaro, mas as inimizades que havia criado provocaram-lhe graves problemas. Acabou por ser preso, mercê da campanha que lhe moveram os seus inimigos, mas conseguiu livrar-se de todas as acusações.

Assim, Matias de Albuquerque constitui um modelo exemplar do nobre guerreiro do século XVI, como homem de armas e notável chefe, autor de importantes decisões e empresas numa época de crise crescente para o Estado da Índia, e é simultaneamente o exemplo acabado da carreira militar bem sucedida, desde soldado até vice-rei.

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Mensagem por Orban89 24th março 2023, 17:30

Fernando de Oliveira


A época dos Descobrimentos foi fértil em vidas aventurosas, de que são conhecidos tantos exemplos. Ficou célebre, entre outras, a de Fernão Mendes Pinto, descrita pelo próprio na sua Peregrinação. Mas outras personagens, igualmente interessantes e não menos curiosas, viveram no século XVI uma vida recheada de peripécias. Entre elas destaca-se uma, pouco conhecida ou mesmo geralmente ignorada. Trata-se do Padre Fernando de Oliveira, de cuja vida verdadeiramente excepcional e obra ímpar vamos hoje falar.

Fernando de Oliveira nasceu em 1507, em Aveiro, não se possuindo informações seguras sobre a sua ascendência. Estudou durante a sua juventude em Évora, no Convento de S. Domingos, Ordem na qual ingressa. Cedo se distinguiram os seus dotes académicos, sobretudo na disciplina de Gramática. Porém, Fernando Oliveira aliava a mais fina inteligência a um carácter irrequieto e desassossegado, que lhe causaria diversos problemas ao longo da sua vida. O primeiro surgiu cedo quando, aos 25 anos, o nosso homem, por motivos desconhecidos, deserta da Ordem religiosa e e foge para Castela. Mas alguns anos mais tarde está de regresso. Publica então uma Gramática de Língua Portuguesa, a primeira que se conhece. Até 1545 exerce a profissão de professor, chegando a dirigir a educação dos filhos de João de Barros, o célebre cronista. Fernando de Oliveira ganha a amizade de gente poderosa, que mais tarde lhe seria necessária em tempos de dificuldades. Sabe-se que por esta altura viajou a Itália, desconhecendo-se os motivos de tal estadia. De qualquer modo, o seu carácter irrequieto não se adaptava a uma vida sedentária, pelo que não ficou muito tempo em Lisboa. Nesse ano de 1545 alista-se como piloto, e com nome falso, numa armada francesa, ao serviço de Francisco I. Esta parte rumo a Inglaterra, com o objectivo de defrontar as armadas inglesas. Fernando Oliveira participa nos combates que se seguem, alcançando uma grande notoriedade junto do almirante francês. Acabou por ser feito prisioneiro pelos ingleses, e levado para Inglaterra. Os seus dotes diplomáticos, a sua habilidade, inteligência e cultura levaram a que alcançasse grande prestígio na corte inglesa, mesmo junto do rei Henrique VIII. Vive durante alguns anos em Inglaterra, regressando depois a Lisboa, onde entrega a D. João III uma carta do rei inglês.

As aventuras de Fernando Oliveira, a sua estadia em Inglaterra, a simpatia que sentia pela religião protestante, o contacto com o rei inglês que se havia revoltado contra o Papa, acabaram por lhe criar problemas. Pouco depois do seu regresso a Portugal é denunciado à Inquisição como hereje, preso e interrogado. Só em 1551, e devido á amizade de gente influente, é posto em liberdade. Este período difícil não o fez esmorecer no seu gosto pela aventura. Embarca imediatamente numa armada com destino a Marrocos. Esta é atacada por uma frota de piratas argelinos, e derrotada. Tal deveu-se em grande parte á má preparação dos marinheiros portugueses que navegavam na armada, que rapidamente se desorientaram, como ficou escrito numa das suas obras:

Os marinheiros eram lavradores de Entre Douro e Minho, e soldados vagabundos de Lisboa (…); desta feição equipadas as nossas caravelas, com a vista dos Turcos desatinou a gente delas de tal maneira que ferviam de uma para outra sem ordem, como formigueiro esgravatado. Uns faziam vela sem haver vento, (…) outros cortavam as amarras sem olhar para onde viravam as proas, outros deixavam os navios como homens que não cuidavam o que faziam. (…) A graça toda foi (…) quererem depois de perdidos dar a culpa uns a outros, tendo-a todos (…)”.

Foram os portugueses levados como prisioneiros para Argel, e mais uma vez conseguiu o nosso homem destacar-se, sendo encarregue das negociações com vista á obtenção do resgate. Regressado uma vez mais a Lisboa, segue para Coimbra, onde exerce o ofício de revisor na Imprensa da Universidade. Entre 1554 e 1555, Fernando Oliveira rege na mesma Universidade a cadeira de Humanidades. Mas os seus problemas não tinham ainda terminado. Fernando Oliveira era o que se pode chamar de um homem “sem papas na língua”, rebelde e irrequieto; a sua sinceridade e frontalidade grangeavam-lhe grandes amizades, mas criavam igualmente grandes inimigos. De qualquer modo, em 1555 é novamente preso pela Inquisição, que lhe criou problemas até ao fim da sua vida. Não sabemos a data da sua morte, e pouco conhecemos dos últimos anos da sua vida. Apenas sabemos que, mais tarde, quando contava cerca de 58 anos de idade, D. Sebastião lhe concedeu uma pensão vitalícia de 20 000 reis.

O padre Fernando Oliveira deixou-nos algumas obras escritas, sendo as mais importantes as que tratam de náutica e construção naval, onde revela ser um profundo conhecedor. A mais famosa chama-se “A arte da guerra do mar”. É um tratado de guerra naval, verdadeiramente notável e avançado para a época, onde se pode notar a lucidez e inteligência do autor ao tratar de problemas ainda actuais no nosso tempo. Eis como define ser a guerra justa:

Mal feito é fazer guerra sem justiça, e os cristãos a não podemos fazer a nenhuns homens que seja, de qualquer condição nem estado. (…) doutro modo seria falso nosso nome, e poder-nos-iam culpar de hipócritas, como aqueles de que Cristo diz; dizem e não fazem. Os quais ele mesmo chama hipócritas, que quer dizer falsos e mentirosos. Mentiroso é aquele que apregoa vinho e vende vinagre, aquele que se nomeia pacífico e faz guerra sem justiça.”

No resto da obra, o padre Fernando Oliveira traça o quadro completo da vida naval, desde a qualidade das madeiras para a construção dos navios, a escolha, treino e comportamento dos marinheiros e soldados, as tácticas navais, os equipamentos, materiais e mantimentos adequados, as condições de navegação, os ventos e marés. Tal decorria do conhecimento prático que tinha dos navios e navegação, do contacto com as gentes e lides do mar. Veja-se, por exemplo, e para terminar, o que diz acerca dos mantimentos adequados para os navios:

O biscoito, que é a principal vitualha, de trigo é o melhor, porque o centeio e cevada são mais húmidos e frios, e o pão deles toma mais bolor e corrompe-se mais cedo; o melhor é muito seco, e sendo muito cozido segundo se requere para biscoito por tempo esboroa-se e desfaz-se em pó.”

Pouco antes de falecer, defendeu António I de Portugal, Prior do Crato, contra Felipe II, com duas obras historiográficas a sustentarem a legitimidade do candidato português e contestarem a solução da Monarquia Dual, aprovada nas Cortes de Tomar (1581).


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Mensagem por Orban89 24th março 2023, 17:32

Nuno Álvares Botelho
O último grande capitão da Índia Portuguesa


A História da presença portuguesa no Oriente está recheada de histórias de grandes feitos militares, sobretudo na sua época áurea, o século XVI. Entre os grandes capitães figuram os nomes de Francisco de Almeida, Afonso de Albuquerque, D. João de Castro, Duarte Pacheco Pereira e outros, que são geralmente citados como exemplos de coragem, bravura e capacidade de liderança no campo de batalha. Na verdade, apontam-se geralmente estes nomes, entre outros, para ilustrar uma época de prosperidade, a Idade de Ouro do Império Português no Oriente, em oposição ao século XVII, geralmente visto como uma era de decadência económica e derrocada militar. Na verdade, porém, podemos constatar que nesta época de dificuldades incomparavelmente maiores, quando os ingleses e holandeses faziam guerra sem tréguas aos portugueses enfraquecidos, outras figuras destacaram-se igualmente em diversos domínios, seja no campo das reformas administrativas, da política ou da guerra. Neste último caso convém destacar devidamente a figura de um grande capitão, por vezes esquecido, que provou ser, em condições nítidamente adversas, um excelente estratega e um comandante militar de primeiro plano: Nuno Álvares Botelho, considerado por alguns como o último grande capitão português da Índia.

Nuno Álvares Botelho começou a sua vida militar muito novo. Originário da alta nobreza da corte, teve ocasião de, durante mais de 15 anos, aprender as lides da guerra no mar nas armadas de vigia das costas de Gibraltar e Marrocos, entre 1598 e 1616. Aqui teve oportunidade de dominar perfeitamente os conhecimentos e as técnicas da luta naval, de que se tornou um exímio mas prudente capitão. O seu conhecimento não se esgotou, porém, nas costas africanas. Seria na Índia que se destacaria como o melhor comandante português, procedendo a arrojadas empresas que o tornariam numa personagem lendária, ainda em vida. Nuno Álvares Botelho foi por duas vezes á Índia entre 1617 e 1620, como comandante da armada da carreira Lisboa-Goa. A terceira foi definitiva, e ocorreu em 1624, com uma forte armada destinada a aliviar a aflitiva situação militar que os portugueses enfrentavam por todo o Índico.

A situação dos portugueses no Oriente havia-se degradado progressivamente desde os finais do século XVI. Nesta data haviam chegado ás águas do Índico os primeiros navios holandeses e ingleses, inimigos dos espanhóis, logo, dos portugueses que tinham agora um rei comum. Ingleses e Holandes haviam-se instalado no Oriente e tornavam-se a cada dia mais poderosos, ameaçando directamente as posições portuguesas. Durante as primeiras décadas, os portugueses, á custa de enormes despesas e de um grande esforço humano e financeiro, haviam conseguido resistir aos assaltos inimigos, mas a situação tendia a agravar-se. Em 1622 o primeiro grande golpe é desferido sobre Ormuz, cidade-chave de controle do Golfo Pérsico e que Afonso de Albuquerque havia tomado em 1515. Naquela data, o Xá da Pérsia, aliado aos ingleses, tomara a cidade de assalto, perante a impotência das forças portuguesas. A armada que Nuno Álvares Botelho comanda em 1624 destina-se precisamente a disputar o domínio do Estreito de Ormuz. Em Fevereiro de 1625 a armada portuguesa trava combate com uma frota anglo-holandesa muito superior em número e poder naval. Embora não fosse conclusiva, a batalha permitiu aos portugueses recuperar o prestígio na região e, provavelmente, salvar Mascate das investidas inglesas.

Durante os anos seguintes, ou seja até 1628, todo o esforço das autoridades portuguesas na Índia estava virado para a recuperação de Ormuz e a retomada do controle da região. Nuno Álvares Botelho empreendeu incessantes acções com este fim, onde se destacou a sua capacidade de comando e de conhecimento das tácticas de guerra naval. Não conseguiu, porém, por falta permanente de meios, atingir os seus objectivos. Pelo contrário, constata que o poderio naval dos inimigos, quer holandeses quer ingleses, crescia sem parar, ameaçando outras posições portuguesas, pelo que se tornava necessário enviar socorros a todo o lado ao mesmo tempo.

Devido ao agravamento da situação militar por todo o Índico, Nuno Álvares Botelho recolhe-se a Goa, onde faz uma pausa para retomar depois a sua actividade. O sinal de alarme surge imediatamente, desta vez do outro lado do Índico: Malaca estava cercada pelo sultão do Achém, velho inimigo dos portugueses, que já anteriormente havia assaltado a cidade sem êxito, mas que agora havia conseguido reunir uma formidável armada de 236 velas. Chegado o pedido de socorro a Goa, Nuno Álvares Botelho oferece-se para ir. Entretanto, havia integrado um triunvirato de Governadores da Índia, pelo falecimento do governador anterior. Resolvida a questão da sucessão, prepara-se então a armada de socorro a Malaca, que parte finalmente em Setembro de 1629 comandada pelo capitão Álvares Botelho. Era relativamente pequena, composta apenas de 28 navios pequenos, de remo, mas que a habilidade do comandante conseguiria ultrapassar.

Enquanto a armada fazia o caminho para Malaca, Achém atacava a fortaleza, mas não conseguindo vencer a determinação dos portugueses da cidade assim como as robustas fortificações de que estava provida. Chegada entretanto a armada de socorro, procedeu-se então ao confronto, em que a habilidade do capitão em combate com a desorientação do general malaio Lançamane se saldou por uma desastrosa derrota para a armada inimiga, com a destruição total da sua frota, já que dos 236 navios e dos dezanove mil homens que foram à conquista de Malaca nem um só regressou ao seu país. Nuno Álvares Botelho foi então recebido em triunfo na cidade pelo capitão português da praça Gaspar de Melo de Sampaio, procedendo-se á avaliação do valioso saque, sobretudo em peças de artilharia cujo número ultrapassava as 130.

Nuno Álvares Botelho tinha tanto de bom capitão como de modéstia. Era dotado, de facto, de uma personalidade excepcional. Enquanto outros se vangloriavam de pequenos e irrelevantes serviços, este capitão escrevia ao vice-rei de Goa com grande modéstia pessoal, nos termos seguintes:

Descerquei Malaca, conservei a armada em que sirvo e destruí a dos inimigos, de que sempre se devem infinitas graças a Deus; os capitães e soldados cumpriram tão pontualmente com as suas obrigações como eu desejo que façam sempre todas as minhas coisas.”

A situação dos portugueses na região de Malaca não era melhor do que a existente no Estreito de Ormuz. Na verdade, os portugueses haviam sido aqui quase completamente ultrapassados pelos holandeses, que dominavam o comércio das especiarias das Molucas e de outras ilhas da Insulíndia Oriental. Restava aos portugueses o comércio da China, que conseguiria subsistir aos assaltos inimigos. Os holandeses haviam fundado a sua capital no Oriente em Batávia, bem perto de Malaca, pelo que a cidade sufocava lentamente com o aumento do poderio holandês.

Nuno Álvares Botelho tentou, logo após a sua vitória, aliviar a difícil situação em que a cidade se encontrava, fazendo frente ás armadas holandesas que proliferavam na região. Porém, quis o destino que o general português não prolongasse por muito mais tempo as suas façanhas militares. Na verdade, pouco depois da sua retumbante vitória em Malaca, Nuno Álvares Botelho morreu em pleno combate, não sem antes conseguir aprisionar diversas embarcações holandesas que carregavam pimenta na costa norte de Samatra. Foi a 5 de Maio de 1631, quando, em pleno combate com uma nau holandesa, é atingida a pequena fusta em que seguia, morrendo afogado. Foi levado para Malaca onde foram celebradas as exéquias solenes, sendo enterrado na capela-mor. Assim morreu o último grande capitão português na Índia, cujos feitos militares causaram grande impressão na época, nomeadamente entre os cronistas que não deixaram de registar a sua biografia.

Carreira da Índia
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Mensagem por Orban89 24th março 2023, 17:33

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Mensagem por Orban89 25th março 2023, 15:02

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Mensagem por Orban89 20th maio 2023, 16:12

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Mensagem por Orban89 21st novembro 2023, 19:03

DUARTE PACHECO PEREIRA - O herói esquecido | Ele descobriu o BRASIL ???


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